Osso a osso, fragmento a fragmento, os paleontólogos tentam decifrar que animais são aqueles que estão a escavar. Esqueletos incompletos tornam a tarefa difícil, mas, às vezes, nem os esqueletos mais completos são isentos de controvérsia. “Jane”, o esqueleto de um dinossauro da família dos tiranossauros é um desses exemplos: uns defendem que é uma espécie nova, outros que é apenas um juvenil de uma espécie conhecida, como conta a BBC.

“Jane”, de esqueleto completo e praticamente intacto, foi encontrado no noroeste de Montana (Estados Unidos) e descansa agora no Museu de História Natural de Burpee (Illinois). Para alguns é um dinossauro Nanotyrannus, um tipo de “T. rex pigmeu”, para outros é um Tyrannosaurus rex jovem. Para tirar as dúvidas, nada melhor do que procurar a resposta nos ossos.

Claro que se não se conhecesse bem o desenvolvimento humano podia confundir-se o fóssil de uma criança como uma nova espécie. Mas com as espécies atuais, mais ou menos bem estudadas, o risco é pequeno. No entanto, é este desconhecimento do desenvolvimento e do crescimento dos dinossauros que confunde os paleontólogos. Um Tyrannosaurus rex, que pode ter cerca de 13 metros de comprimento, nasce de um ovo do tamanho de uma toranja, logo é de prever que grandes alterações ocorram no esqueleto. Podemos também pensar na dentição, que pode mudar com as alterações na dieta – alguns juvenis de lagartos são herbívoros, enquanto os adultos são carnívoros.

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Se pudéssemos extrair material genético resolviam-se as dúvidas, mas o material fossilizado, salvo raras exceções, não o tem. Mas os ossos podem ser estudados de outras formas. Tal como nas árvores, os ossos têm anéis de crescimento, que serão tanto mais largos, quanto mais cresceu o animal naquele ano. Os animais adultos terão anéis de crescimento muito mais estreitos.

O drama dos paleontólogos é destruir um osso que muito provavelmente poderá ser um exemplar único. Mas tal como para contar os anos das árvores, já não é preciso cortar o osso todo para ver os anéis. Basta tirar uma porção com uns poucos milímetros para identificar os anéis e encher o buraco com uma massa que replique o material original. Assim, torna-se injustificável que uma técnica que está disponível desde meados do século XX só tenha começado a tornar-se mais frequente na última década.

Então e “Jane”? Para começar – e para acabar já com as dúvidas -, apesar do nome feminino, não se conhece a que género pertence este animal. Este dinossauro, que morreu há cerca de 67 milhões de anos, deixou um esqueleto quase completo que permitiu perceber que teria cerca de seis metros de comprimento e dois de altura. Os dentes afiados e os membros posteriores longos e fortes permitiram classificá-lo como um predador. Na verdade, devido às semelhanças, foi imediatamente considerado um parente do Tyrannosaurus rex, mas um parente pigmeu, ao qual se deu o nome de Nanotyrannus.

Em 2003, Gregory Erickson, investigador da Universidade Estadual da Florida (Tallahassee), conseguiu ver os anéis do perónio de “Jane” – um osso do membro posterior, que se localiza junto à tíbia. O investigador estimou que este dinossauro tivesse mais ou menos 12 anos. Se fosse um T. rex, “Jane” seria um juvenil, porque nesta espécie a maturidade só se atinge aos 20 anos. Para ajudar à classificação como juvenil, Gregory Erickson verificou também que os anéis eram largos (fase de grande crescimento) e o osso bastante poroso, típico de um animal que ainda se está a desenvolver.

Dois anos depois, o mesmo investigador analisou os anéis de um Tyrannosaurus rex adulto e comparou-os com os de “Jane” – este Nanotyrannus poderia muito bem ser, afinal, um T. rex. Mas Gregory Erickson, ao contrário de outros investigadores, recusa tirar, para já, essa conclusão. Para muitos paleontólogos, “Jane” é a grande oportunidade de estudar um juvenil de Tyrannosaurus rex e perceber o seu desenvolvimento – estes gigantes podiam aumentar dois quilogramas em peso por dia.