Advogada de acusação chora e pede desculpas, advogado de defesa denuncia “machismo”

  • A sessão começou com a incerteza de que seria realizada no final do dia a votação da destituição definitiva da Presidente afastada. A resposta veio logo no início da sessão, quando o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, que comanda a sessão no Senado, advertiu que, devido ao grande número de parlamentares inscritos para falar na parte final do debate, a votação teria de ser realizada na quarta-feira.
  • Segundo relatou o jornal Folha de S. Paulo, a equipa do Presidente interino Michel Temer teria tentado convencer os senadores aliados a desistirem de falar ao Senado, de modo a forçar que a votação acontecesse ainda na terça-feira. O objetivo seria garantir que Temer pudesse viajar a China para a reunião do G20, na quarta-feira. Este poderia ser o primeiro evento internacional de Michel Temer como Presidente efetivo do Brasil.
  • A advogada Janaína Paschoal foi a primeira representante da acusação a falar no Senado. Paschoal disse que “foi Deus que fez que, ao mesmo tempo, várias pessoas percebessem o que estava acontecendo no país” e admitiu que “sofreu” pelo impeachment ser contra “a primeira mulher presidente do Brasil”. Após citar argumentos técnicos para justificar o processo, acusou a Presidente de “maquilhar” as contas do governo, durante a campanha eleitoral de 2014.
  • Janaína Paschoal conclui o seu discurso a chorar e a pedir desculpas a Dilma Rousseff, fazendo referência aos netos da Presidente afastada.

Peço desculpas à Presidente da República porque eu sei que a situação que ela está vivendo não é fácil. Eu peço que ela entenda que eu fiz isso pensando também nos netos dela. Eu agradeço”, afirmou.

  • O jurista e também autor do processo de impeachment, Miguel Reale Junior, falou em seguida e acusou o Partido dos Trabalhadores e o ex-Presidente do Brasil, Lula da Silva, de “legitimar a esperteza malandra”. “Esse é um momento de mudança de mentalidade. O lulopetismo legitimou a esperteza malandra. E nós queremos provar que o país, além de ser do samba, é também o país da seriedade”, afirmou.
  • Reale Junior fez ainda outra analogia que chamou a atenção dos senadores, ao comparar o impeachment a um “cadáver”.

Há crime de responsabilidade. Há cadáver e há mau cheiro desse cadáver. O crime de responsabilidade está em utilizar os bancos oficiais para financiar o Tesouro. E por quê? Porque se estava realizando um política irresponsável das nossas finanças”.

  • José Eduardo Cardozo, advogado de defesa de Dilma Rousseff, começou o seu discurso a resgatar a biografia da Presidente afastada e a fazer referência ao discurso de Janaína Paschoal, quando falou sobre o neto da petista. “Dilma foi brutalmente torturada. E é possível que naquele momento, alguns de seus acusadores, tenham dito: nós estamos fazendo isso pelo bem do Brasil, dos seus netos. Estamos te arrasando, mas estamos pensando no seu bem.”
  • O advogado de Dilma atribuiu ao deputado e ex-presidente da Câmara dos Deputados a culpa pelo impeachment e citou o “machismo” e “misoginia” no processo:

Mulheres quando são corretas e íntegras são duras. Quando essas mulheres se equiparam aos homens, são autoritárias. (…) Disseram que ela tomava remédios para desqualificá-la como mulher. Nunca provaram que ela fez qualquer coisa que não fosse estritamente dentro da ética”, defendeu Cardozo.

  • Por fim, Cardozo pediu que os senadores aceitem a proposta de Dilma Rousseff para uma consulta popular com o objetivo de realizar novas eleições “agora”. “É nas eleições que se julga o conjunto da obra, não aqui. Poderão os senhores dormir tranquilos daqui para frente se votarem sim pelo impeachment?”, questionou.

O “golpe” aconteceu para os dois lados e o depoimento de um ex-Presidente do Brasil alvo de impeachment

  • Após a fala dos advogados de acusação e defesa, os 68 senadores inscritos começaram a fazer os discursos no debate do impeachment de Dilma Rousseff. Esta foi a última oportunidade que os parlamentares tiveram para defender os seus votos publicamente no Senado.
  • O discurso dos senadores se relacionavam mutuamente, ao utilizar as mesmas palavras e argumentos tanto para acusar como para defender Dilma Rousseff. Foi o caso do senador António Anastasia (PSDB), relator do processo de impeachment na Comissão Especial do Senado, que reiterou a sua opinião favorável ao processo de destituição de Dilma Rousseff. “Nós percebemos que o abuso que houve durante anos culminou com tudo o que está acontecendo em 2015. ‘Pedaladas’ anteriores só não foram questionadas porque ninguém sabia”, assegurou. Em oposição, Roberto Requião (PMDB) ironizou António Anastasia ao dizer que o parlamentar também cometeu as “pedaladas fiscais” quando esteve à frente do governo do estado de Minas Gerais, “onde não existia Eduardo Cunha”.
  • Outra palavra repetida à exaustão foi “golpe”:

A defesa da Presidente tem afirmado que está havendo um golpe. Mas há vozes importantes tanto de um lado como do outro sobre o assunto, o que prova que o que estamos julgando aqui não é apenas um pretexto para tirar Dilma do poder.” (António Carlos Valadares, PSB).

“Esse é um golpe de classe, um golpe das elites, um golpe principalmente contra o povo mais pobre do país. (…) Me nego a ser coautora desse crime. Prefiro escrever minha história com a tinta da verdade e com a caligrafia da justiça. Não, não, mil vezes não ao golpe, e sim à democracia.” (Fátima Bezerra, PT).

  • Um dos discursos mais aguardados foi o do senador e ex-Presidente do Brasil Fernando Collor (PTC), alvo do processo de impeachment em 1992. Collor fez uma manifestação ambígua em que afirmou que a destituição de um Presidente “é o remédio constitucional de urgência no presidencialismo quando o governo, além de cometer crime de responsabilidade, perde as rédeas do comando político e da direção económica do país”. No entanto, não revelou o seu sentido de voto.

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Dentro do Senado, o discurso do “candidato derrotado” e as referências à Bíblia. Fora do Senado, aliados de Dilma movem-se e manifestam-se timididamente

  • O conjunto de partidos minoritários do Congresso, contrários ao processo de impeachment, vão entrar com uma ação contra o procurador do Tribunal de Contas da União (TCU), Júlio Marcelo de Oliveira, e contra o auditor da TCU, Antônio Carlos Costa D’ávila, responsáveis por elaborar a investigação das “pedaladas fiscais”, um dos argumentos que sustentam o pedido de impeachment. De acordo com os parlamentares denunciantes, não houve a devida “independência funcional” no exercício das atividades de Oliveira e D’ávila.
  • A vice-procuradora-geral da República no Brasil, Ela Wiecko, foi exonerada do cargo a pedido, após ser vista a participar num protesto contra o Presidente interino do Brasil, Michel Temer, que aconteceu em junho, em Portugal. Num vídeo publicado pela revista Veja, Wiecko aparece de óculos de sol, em segundo plano, a segurar uma faixa onde se lê “Fora Temer” e “Contra o golpe”.
  • O senador Aécio Neves (PSDB) relembrou o tom crítico e os “maneirismos” utilizados durante a campanha eleitoral de 2014, quando foi derrotado por Dilma Rousseff, para fazer o seu discurso no Senado. O parlamentar disse que, durante a campanha presidencial, alertou a petista sobre o perigo das “pedaladas fiscais” e relembrou uma peça publicitária em que o partido acusava a oposição de “tirar o prato de comida dos brasileiros”. Durante o seu discurso ao Senado, esta segunda-feira, Dilma Rousseff referiu-se a Aécio como o “candidato derrotado”.

  • Já o senador Magno Malta (PR) fez o discurso mais exaltado do dia, ao citar Deus e passagens bíblicas para justificar o processo de impeachment. O parlamentar, que é pastor evangélico, disse que “a Presidente afastada não será cassada por mim ou por nenhum desses senadores, mas por Salomão” e que “de acordo com a Bíblia, tudo que é feito no escuro virá a luz” em referência à corrupção. Terminou a sua manifestação a cantar:

  • Em São Paulo, aconteceram algumas manifestações contrárias ao impeachment de Dilma Rousseff. Na Avenida Paulista, cerca de 200 pessoas participaram do ato e uma parte deste grupo dirigiu-se à sede do jornal Folha de S. Paulo, que é considerado uma publicação anti-Dilma Rousseff. Segundo o site G1, o protesto terminou com o confronto entre manifestantes e a polícia.

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