A sul do Japão existe uma ilha onde os habitantes vivem mais tempo do que as pessoas que habitam qualquer outro lugar do mundo. Chama-se Okinawa e, especialmente a norte da ilha, o número de centenários por cada 100 mil habitantes é superior à média mundial. “Supercentenários” que alcançam o maior índice de longevidade do mundo e ultrapassam os 110 anos de idade. Qual é o segredo da população de Okinawa? Como é que os centenários japoneses vivem mais tempo e felizes até ao fim dos seus dias? Duas perguntas que Héctor Garcia e Francesc Miralles decidiram responder no livro Ikigai — Viva bem até aos cem (Albatroz).

Não deixava de nos maravilhar o facto de este refúgio da vida quase eterna se encontrar justamente em Okinawa, onde se perderam 200 mil vidas inocentes no final da Segunda Guerra Mundial”, escrevem os autores.

Ikigai

O livro foi publicado pela editora Albatroz e custa 14,40€.

Depois de um ano de investigações teóricas, a dupla viajou até à aldeia dos centenários e reuniu as leis da sabedoria dos anciãos japoneses. Cultivar amizades, fazer uma dieta leve, descansar adequadamente e exercitar-se de forma equilibrada fazem parte da equação mas não só. Tome nota:

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Mantenha-se ativo, mesmo depois da reforma

Existe um conceito japonês — chamado Ikigai — que se pode traduzir como a razão pela qual todas as manhãs se levanta, que confere satisfação, felicidade e significado à vida. “Uma das coisas que nos surpreende quando vivemos algum tempo no Japão é ver como as pessoas se mantêm ativas, mesmo depois de se reformarem. Na verdade, muitos japoneses nunca se reformam, continuando a trabalhar no que gostam, sempre e quando a saúde o permite“, lê-se no livro. Ter um propósito vital é fundamental para manter a felicidade de estar ocupado.

“Quem abandona as coisas que ama e sabe fazer, perde o sentido da vida. Assim sendo, mesmo depois de terminar a sua vida laboral ‘oficial’ é importante continuar a fazer coisas que tenham valor”, aconselham os autores. Razão pela qual a maior parte dos centenários japoneses têm uma ocupação principal e uma secundária — quase um hobby — para dar significado à sua existência.

Faça-o com calma

Se devagar se vai ao longe, os centenários japoneses são a prova disso. Os segredos para uma vida longa e feliz são a dieta, o exercício, ter um propósito na vida e gerir eficazmente o tempo de forma a reduzir o stress — responsável pelo envelhecimento prematuro das células saudáveis e alterações do sistema digestivo até à pele. “Um stress prolongado no tempo é degenerativo, já que um estado de alerta permanente afeta os neurónios associados à memória e produz uma inibição da secreção de algumas hormonas, cuja carência pode causar depressão“, explicam os autores no livro.

Um dos remédios japoneses passa por tomar banhos mais prolongados, massajar a cabeça com a ponta dos dedos, praticar mindfulness e manter a secretária, casa e tudo à sua volta limpo e organizado. “Caso se sinta agastado, a primeira coisa que deve fazer é pôr em ordem o ambiente que o rodeia.” Dormir bem também pode ajudar a retardar o envelhecimento graças à produção de melatonina.

Não coma até ficar cheio

Também na alimentação, para termos uma vida longa, menos é mais. “A sabedoria ancestral aconselha-nos a não comer até ficarmos cheios. Os nativos de Okinawa param de comer quando sentem que o estômago está a 80%, em vez de se saciarem por completo, obrigando o corpo a desgastar-se e a acelerar a oxidação celular para poder fazer uma digestão prolongada”, explicam Héctor García e Francesc Miralles.

Quanto à alimentação, a dieta dos “supercentenários” é rica em tofu, batata-doce, peixe e muitos legumes. Já Jamie Oliver, que também visitou a ilha de Okinawa antes de lançar um livro de receitas saudáveis, tinha garantido que estes eram os alimentos que precisava de ter na cozinha para viver mais tempo. Mas a forma como os centenários servem a comida também é importante. “Ao dividi-la por pratos pequenos, os japoneses acabam por comer menos. Esta é também a razão pela qual os ocidentais que vivem no Japão tendem a perder peso e a manter um corpo esbelto”, lê-se no livro.

Rodeie-se de bons amigos

“São o melhor remédio para esquecermos as preocupações com uma boa conversa, para contar e ouvir histórias que nos façam sorrir, para pedir conselhos, para nos divertirmos, para compartilhar e sonhar”, lê-se em Ikigai — Viva bem até aos cem. Uma tradição de Okinawa consiste na formação de laços fortes entre as comunidades locais. Todas elas pertencem a alguma associação de vizinhos onde se sentem queridos, como se pertencessem a uma família.

Assim o serviço à comunidade acaba por se transformar na razão por que todas as manhãs se levanta da cama. Este sentimento de pertença e de ajuda mútua proporciona uma sensação de segurança e contribui para o aumento da esperança média de vida.

Esteja em contacto com a natureza

“Embora a maioria dos seres humanos viva nas cidades, todos fomos feitos para nos fundirmos com a natureza. Precisamos de voltar a ela regularmente, para recarregarmos as baterias da alma”, lê-se na obra. Razão pela qual os centenários japoneses têm quase sempre uma horta e campos inteiros de plantação de chá, shikuwasa e mesmo mangas.

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100% dos centenários entrevistados na ilha de Okinawa, no Japão, têm uma horta ou plantações. (foto: iStock)

Sorria

Um estudo realizado pela Universidade de Yeshiva determinou que as pessoas que vivem mais anos têm em comum duas atitudes: o positivismo e uma elevada expressividade emocional. Incluindo os centenários japoneses de Okinawa.

“Pudemos perceber a extraordinária amabilidade dos habitantes que passavam os dias a rir e a brincar no meio das encostas verdejantes rodeadas de água cristalina”, conta García e Miralles. “Uma atitude amistosa ajuda a fazer amigos e relaxa-nos. É bom aperceber-se das coisas que estão mal, mas não se esqueça do privilégio que é estar aqui e agora, neste mundo cheio de possibilidades.”

Fique em forma

O crescente sedentarismo do ser humano está a potenciar o aparecimento de diversas doenças — como a hipertensão ou a obesidade — que afeta a longevidade. “Estar demasiado tempo sentado, no trabalho ou em casa, não só reduz a tonicidade muscular e a capacidade respiratória, como provoca o aumento do apetite e diminui a vontade de realizar atividades motivadoras”, explicam os autores.

Comece a ir a pé para o trabalho ou a caminhar por prazer pelo menos 20 minutos por dia, use escadas em vez de elevadores, substitua os lanches por fruta e evite passar demasiado tempo sentado.

Agradeça

Em Ogimi — nome da povoação de Okinawa — os anciãos vivem ativos e satisfeitos até ao fim dos seus dias. Porquê? “Temos de ter consciência de que tudo o que temos e todas as pessoas que amamos em algum momento desaparecerão. E isso é algo que devemos ter sempre em mente, sem sermos pessimistas. Ter consciência da inconstância das coisas não deve entristece-nos, mas ajudar-nos a amar o presente e as pessoas que nos rodeiam“, explica.

Dedique um momento do dia para agradecer e a sua felicidade aumentará. O objetivo não é eliminar todas as emoções e os prazeres da vida mas eliminar apenas as emoções negativas.

Viva o momento

Pratique a consciência plena, também conhecido como mindfulness. O segredo passa por concentrarmo-nos no agora e reduzirmos os pensamentos descontrolados. “Temos de aprender a desligar o piloto automático que nos arrasta para um ciclo contínuo. Todos conhecemos pessoas que olham para o telemóvel ou para um dossiê qualquer entre duas garfadas de almoço. Se lhes perguntar se a tortilha tinha cebola não saberão responder”, afirma Roberto Alcíbar, citado por Héctor Garcia e Francesc Miralles. Ao ativar a atenção plena, vai diminuir o stress e, consequentemente, prolongar o tempo de vida.

Pratique a resiliência

Esta não passa da capacidade de lidar com as adversidades e recuperar o sentido da vida — o ikigai. A resiliência (ou capacidade de ser persistente) é “uma atitude que podemos desenvolver para nos mantermos focados no que é verdadeiramente importante na vida e não no que é urgente, sem nos deixarmos levar por emoções negativas”.

Uma pessoa resiliente sabe concentrar-se nos seus objetivos, naquilo que é importante, sem desanimar. A sua força provém da flexibilidade, da capacidade de se adaptar às mudanças e às fatalidades do destino.”