De vez em quando lá surge um. Muuuuuito de vez em quando.

A falar “estrangeiro” é vê-los a chegar, hordas deles, por milhões ou só tuta e meia. E quando são realmente bons — mais “Falcao” do que “Osvaldo”; está a perceber o que quero dizer-lhe, não está? –, a irem tão ou mais depressa do que vieram, deixando uns cobres a tilintar no Dragão. A falar português, mas açucarado, do que só se fala no Brasil, também os há que chegaram. E houve um melhor que todos os demais: apelido Jardel, primeiro nome Super, segundo nome Mário.

Agora, portugueses de gema, não há. Ou porque lhes escasseiam as oportunidades para se mostrarem, ou porque o que escasseia neles é o talento. A André Silva não escasseia nada: e às oportunidades ele responde com talento. E golos. Como com golos responderam, noutro tempo, no velhinho estádio das Antas e não no do Dragão, Gomes e Domingos.

Hoje, diante do Arouca, André voltou a molhar a sopa. Duas vezes. E por falar em dois: é a segunda vez que o faz de enfiada no Dragão. Contas feitas, marcou o sétimo golo no campeonato, nono em toda a temporada. E o que é que isto quer dizer? Quer dizer que um português tão jovem não marcava tanto com azul-e-branca vestida desde 1995/96. Esse português foi Domingos. E quer dizer que um português, jovem ou menos jovem, não marcava tanto pelo FC Porto em tão poucas jornadas (esta foi a oitava) desde a temporada de 1976/77. O português de então era Fernando Gomes. Se André for tão goleador quanto eles, está o FC Porto descansado. Mas André pode ser melhor. Quando aquela cara de menino se for, quando o que vier for traquejo, pode ser o que quiser e onde quiser.

Mas vamos lá ao jogo. A primeira ocasião de golo da partida viu-se cedo, logo aos cinco minutos. É de Corona — e Corona acertou no poste esquerdo da baliza do Arouca. Alex Telles cruzou longo à esquerda, a bola sobrevoou a área e só parou no flanco contrário. E foi lá que Corona recebeu a bola, despachou Vitor Costa com uma finta (que “nó”!) na esquina da área, entrou lá dentro, passou Jubal, sempre em velocidade, sempre com a bola coladinha na bota direita, trocou-a depois para a esquerda e rematou cruzado. O destino é aquele que se sabe: o poste. E a bola, caprichosa, saiu dali (tal não foi a potência do remate…) e não houve recarga ou corte para ninguém.

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ATANAZAR
v.t.
1. Ação de apertar ou premer com tenazes;
2. (Figurado) Torturar ou angustiar;
3. (Figurado) Enfadar ou incomodar;
4. (Figurado) Incentivar à vingança;
5. (Figurado) Incentivar a agir de forma maligna.

Foi isto que Corona fez ao Arouca: atanazou. No sentido figurado, que não se lhe viu qualquer tenaz em riste. Jogou a primeira parte toda, saiu a meio da segunda, mas fez sete dribles de enviesar a vista a qualquer defesa — e ninguém cá no burgo fez tantos quanto ele nesta temporada, nem Gelson, nem Salvio, ninguém.

Adiante. E adiante com mais uma ocasião de golo: Herrera, no centro do meio-campo, ainda distante da área, faz um passe de canhota (daqueles com melaço) para as costas da defesa do Arouca, Óliver recebeu a bola num pé e rematou (10′) no outro, o direito. Bracali saiu rápido dos postes e desviou para canto.

Agora quero falar-lhe de Jubal. Jubal Júnior. Convenhamos: o nome do rapaz (central do Arouca) é de bradar aos céus. Tal como o corte que fez, meeeeesmo em cima da linha de baliza, também o é. Tudo começou em Layún, à direita da defesa, que resolveu desmarcar Herrera lá na frente, onde flanco acaba. Dito e feito. Herrera recebeu a desmarcação, olhou para a área, cruzou para o primeiro poste, André Silva desviou aí de calcanhar, mas a bola não foi para baliza. Não foi, mas também não acabou aí o perigo. O toque circense de André fez a bola seguir para trás, ainda na pequena área, Jota vinha embalado da esquerda e rematou na passado. E aí Jubal foi prático e atento. Tivessem os pais dele sido práticos e atentos no cartório. O minuto? Diga trinta-e-três.

Estava difícil. Mas o golo lá chegou, tarde mas ainda na primeira parte: 43′. É de André Silva o primeiro golo da noite. A “assistência” foi de Gegé. Sim, é lateral do Arouca. Mas já lá vamos. Tudo começou em Layún, à direita — mas ainda longe da área –, que cruzou longo, a bola sobrevoou toda a defesa do Arouca e caiu no flanco contrário. Caiu, mas não no destino, que era Jota. A fazer a marcação a Jota estava Gegé. E Gegé resolveu cortar a bola para onde estava virado: a pequena área. Jubal Júnior foi apanhado em contra-pé pelo corte do colega, não evitou que este chegasse a André Silva, o bom do André agradeceu a oferta, recebeu a bola, ajeitou-a e rematou se seguida: 1-0.

A julgar pela amostra da primeira parte, Casillas bem poderia instalar a Netflix na sua área durante a segunda e passar um serão sossegado a ver “Narcos” ou “Stranger Things”; é que ataques (ou vontade de os fazer) do Arouca nem vê-los. E os arouquenses terminariam mesmo a partida sem qualquer remate à baliza do portero espanhol.

A vencer e com o Arouca pouco disposto a mudar isso, o FC Porto teve um recomeço de jogo maçador. Portanto, vamos lá avançar com isto até ao minuto 79. É o suspeito do costume a bisar: André Silva. Brahimi tentou desmarcar André à entrada da área. Não conseguiu. O camisola dez não se livrou de Jubal Júnior e a bola não ficou consigo nem seguiu para a baliza. Mas seguiu para dentro da área e para a esquerda. Estava lá Jota, recebeu-a, levantou a cabeça e cruzou para o centro da pequena área. Aí, sozinho e livre de Jubal Júnior, André Silva cabeceou à vontade.

Quem achou que chegava de futebol por esta noite e quis dar à sola do Dragão antes do final — afinal estava uma chuva miudinha a cair-lhes no “lombo” desde o começo –, não viu o que veio no tempo extra. Aos 91′, Brahimi recebeu um passe longo, longuíssimo e vindo da defesa do FC Porto, correu na direção da baliza, ultrapassou Gegé — que o tentou derrubar no ombro-a-ombro e acabou ele (Gegé) tombado sobre o relvado –, fintou Jubal Júnior dentro da área, e como se uma finta não chegasse, fintou-o mais outra, e outra e outra, até que rematou para o 3-0. Mais Jubais houvesse para fintar, mais Brahimi fintaria — agora encontrar um par de rins para o central do Arouca é que vai uma chatice.

O FC Porto venceu, aproveita o deslize do Sporting para o ultrapassar, sendo líder à condição e par a par com o Benfica — que só amanhã vai ao Restelo jogar.