“Quando o ego nos cega”, afirmou Eileen Burbidg, investidora da Passion Capital. A discussão ia agitada no palco central da Web Summit. Era sobre falhanços que se falava, mas foi Donald Trump quem fez Dave McClure, da aceleradora norte-americana 50o Startups, levantar-se e pediu à plateia que fizesse o mesmo. “Stand the f*ck up“, gritou (qualquer coisa como “levantem-se, F*/#&*”). E Eileen Burbidg continuou: “É essencial ter orgulho no que fazemos”.

Fundadores com ego a mais (ou ego a menos) podem matar uma startup. Ou duas ou três. Na Web Summit, há quem concorde que as questões de ego são um perigo e há quem ache que ter fundado uma startup até fez com que se tornasse mais humilde. Importante é que não se esqueçam “de pôr a mão na massa”, apesar das entrevistas e da euforia.

“Quando trabalhava para outras pessoas, achava que era muito bom no que fazia, que sabia mais do que os meus chefes. E quando comecei a minha própria empresa, percebi que não.” A frase é do norte-americano Josh Ledgard, um dos fundadores da Kickofflabs, uma plataforma que trabalha na área das promoções e dos concursos online lançada há cinco anos. Tem 38 anos e está a expor o projeto num dos stands do pavilhão da FIL.

Josh Ledgard web summit

Josh Ledgard tem 38 anos e é fundador da Kickofflabs

Ao Observador, Josh conta que não tem duvidas: o ego dos fundadores pode destruir uma equipa, mas cabe a cada fundador decidir como lidera o seu projeto. “Acho que pode ser perigoso. Ouvimos muitos fundadores que dizem que são capazes de mudar o mundo. Eu não acho isso de mim. Se acontecer ótimo, mas não é nisso que penso”, afirmou. Antes de lançar a Kickofflabs, o norte-americano trabalhou na Microsoft durante sete anos e noutra empresa tecnológica durante outros quatro.

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Fabio Mazullo é brasileiro, tem 39 anos, e está na Web Summit a apresentar a Arcolabs, uma empresa de entretenimento digital, que desenvolve videojogos e apps de animação para consolas e computadores, que lançou há 11 meses com mais quatro sócios. Doutorado em ciências de computação e com 20 anos de experiência na área, não é um novato nestas andanças – a Arcolabs é, na verdade, uma das cinco empresas que já lançou. Até à data, ainda nenhuma fechou portas.

“Um fundador com um ego excêntrico e um comportamento temperamental vai afetar a empresa e pode, até, quebrá-la. Mas acho que o que afeta mais a empresa é o fundador que não contribui intelectualmente para o trabalho em equipa”, explicou Mazullo. Para o empreendedor brasileiro, a experiência que tem na Arcolabs está a correr bem, porque a equipa é muito interdisciplinar.

Arcolabs

Augusto Regalla e Fabio Mazullo, dois dos fundadores da Arcolabs

“Os sócios têm experiências complementares, há um que é investidor e montou um braço da empresa, há outro que é arquiteto 3D. E é uma empresa bastante democrática, mas isso não acontece em todas”, conta, acrescentando que “não sente que haja problemas na sua equipa, mas que, nalgumas startups, o CEO acaba por “ser o chefão”. “É quando a empresa cresce que podem começar os problemas. Os sócios começam a querer ser mais ativos e podem prejudicar o plano empresarial”, conta.

“Tratar os fundadores como super estrelas não é o caminho certo”

O português Anthony Douglas lançou a Hole19 quando tinha 30 anos, em 2014. Antes de lançar a app que quer ligar golfistas de todo o mundo, Anthony trabalhava noutra empresa. Esta foi a primeira startup que lançou. Mas ao Observador, não hesita: “tratar os fundadores como super estrelas não é o caminho certo. Parece tudo muito engraçado, mas isto é um caminho duro e frustrante. Há sempre desafios por resolver e quase nunca é tão bom como parece. É bom criar heróis locais para inspirar as pessoas, mas é preciso ter os pés bem assentes na terra”, diz.

Anthony Douglas, Hole19

Anthony Douglas lançou a Hole19 em 2014, quando tinha 30 anos

O fundador da Hole19 explica que quando as empresas aparecem na imprensa, por exemplo, pode ser bom para o negócio, mas quando os fundadores se focam muito nesse”show”, isso pode abalar a equipa. Ao mesmo tempo que dão entrevistas, os empreendedores não devem esquecer que têm de estar no escritório, reunir com a equipa. “Meter as mãos na massa”, diz.

Sobre o verdadeiro motivo pelo qual as startups falham, diz que nem sempre tem a ver com egos, mas com a cultura da empresa, que é algo à qual nem sempre se dá prioridade. “O CEO tem de perceber onde é que está o limite, de ter o bom senso de saber quando deve focar-se”, diz.

O belga Aisse Laroussi, da Edelbex, não acha que os egos exacerbados de alguns empreendedores sejam o fator que determine o falhanço das empresas. “Há muitas mais coisas que contribuem para que as startups não tenham sucesso, como os problemas com a equipa, não ter dinheiro suficiente ou não haver um ajuste ao mercado”, revela.

A Edelbex, que atua no setor da tecnologia financeira, não é a primeira startup do jovem de 32 anos. Já teve outras duas. Ao Observador, frisou que os fundadores que já passaram por situações mais difíceis na sua vida vão saber reconhecer melhor “os limites de alguns perigos”e prevenir situações em que o ego interfira no caminho do sucesso.