O fugitivo de Aguiar da Beira, antes de se entregar às autoridades e ser presente a Tribunal, falou com a RTP mas também com o Diário de Coimbra. O diretor adjunto do jornal conimbricense, João Luís Campos, conta tudo.

O Diário de Coimbra recebeu uma chamada na terça-feira, pelas 13h15, que dava conta de uma possível reportagem sobre Pedro Dias mas sem desvendar quaisquer pormenores. Foi-lhes pedida descrição e o máximo sigilo, nem a redação podia saber de nada. E nada de telemóveis.

No mesmo dia, a advogada do “Piloto”, Mónica Quintela, recebeu a RTP e o jornal de Coimbra no seu escritório pelas 17 horas. Só a caminho do encontro é que os jornalistas foram informados de que o fugitivo ia entregar-se às autoridades na sua presença, como garantia da sua segurança. Pelas 19 horas, os jornalistas foram encaminhados pela advogada até à casa onde Pedro Dias esperava, para contar a sua versão dos factos e entregar-se, por fim, às autoridades.

Já perante as autoridades, na terça-feira à noite, pelas 22 horas, Pedro Dias disse que “desde o primeiro dia que tentei entregar-me, não me permitiram. Estou cá a cumprir as minhas obrigações de cidadão. Quero esclarecer tudo o que se passou”. Da conversa que teve, anteriormente, com os jornalistas avançou alguns pormenores da sua fuga.

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Uma tentativa de sobrevivência dia após dia, ao frio, à chuva, a comida, a água, os tiros. Sempre, sempre, uma tentativa de sobrevivência.

É assim que Pedro Dias descreve a sua fuga, de um forma que, segundo João Luís Campos, transparecia tranquilidade por não ter de se esconder mais. O fugitivo não quis falar acerca dos crimes de que é suspeito, mas negou a autoria dos homicídios. Um jornalista perguntou-lhe se estava preparado para cumprir uma pena de 25 anos de cadeia. Resposta:

De maneira nenhuma. Não pode de maneira nenhuma acontecer uma coisa dessas. Acredito que as coisas vão ser esclarecidas. Tenho provas, tenho a convicção de que conseguirei mostrar de que realmente há aqui muitos equívocos.

Sobre o que se passou na noite dos crimes em Aguiar da Beira, Pedro Dias pediu aos jornalistas para perguntarem ao agente da GNR, que “terá certamente mais a dizer sobre o que me fizeram do que eu terei a dizer sobre isso”, deixa no ar.

Tiros ao ar

Pedro Dias acusou ainda a polícia de o ter “perseguido como um animal” e de o querer morto. Daí não se ter entregue mais cedo. Chegou a receber uma chamada de um sargento que o ameaçou.

Ameaçou-me logo de morte. Disse logo que eu corria risco de vida, logo no primeiro telefonema que me fez.

Houve um momento em conta ter estado escondido dentro de um depósito de água, ao qual alguns agentes se encostaram. Ouviu-os dizer que tinham de o matar “porque já estava a dar muito trabalho”. Também viu uma ambulância chegar para socorrer um GNR ferido com uma arma durante as buscas.

Davam tiros para qualquer moita, para qualquer sítio onde não tivessem visibilidade. E tanto é que, às duas por três, um deles chegou a ser ferido.

Roubou meio frango e pensou ter ouvido a voz da filha

Como sobreviveu durante 28 dias? Com 60 euros no bolso e muita imaginação, contou. Comeu castanhas, kiwis e nozes. E meio frango roubado da arca de um amigo. Foi às compras a alguns supermercados. Lavava-se nos rios, o que o ajudou a manter-se são.

Nos primeiros dias de fuga, ainda ponderou fugir para o estrangeiro mas não conseguia deixar a família. “O amor que tenho pelos filhos, pelos meus pais, pelo resto da minha família, não seria suportável estar afastado deles sem saber notícias”.

Assim tentou manter-se perto eles, em Arouca. Pedro Dias tinha conseguido, recentemente, a guarda da filha de 10 anos. Rondou a sua escola numa tentativa de matar saudades.

Tentei ouvir a voz da minha filha na escola, no meio de todas as outras. Imaginei que ouvi e fez-me bem.