É muito simples. Se eu chamar cinco tipos à Trump Tower [sede da empresa, em Nova Iorque] e lhes disser que quero 2 mil milhões de dólares, tenho os cheques na minha secretária em dez minutos”. Donald Trump

Começou por dizer que, legalmente, e “em teoria”, não haveria qualquer problema se acumulasse a função de Presidente dos Estados Unidos da América com a de business man. Na entrevista que deu no final de novembro ao The New York Times, Donald Trump foi muito claro nesse sentido: não há qualquer conflito de interesses, uma vez que a Constituição, apesar de proibir que as entidades políticas recebam contribuições estrangeiras, não impede o Presidente e o vice-Presidente de combinar as suas posições com atividades económicas. Legalmente nada impede que o Presidente possa gerir os seus negócios, mas a verdade é que nunca antes os EUA tiveram um Presidente multimilionário que faz questão de ser ele próprio a assinar os cheques nas suas empresas.

A questão é que Donald Trump não é um business man qualquer. Com interesses em mais de 500 empresas, espalhadas por 18 países, o próximo Presidente norte-americano é presidente da Trump Organization, que tem um património avaliado em 3,7 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes. O leque inclui hotéis, campos de golfe, empresas imobiliárias e participações em sociedades diversas, incluindo o Facebook. Um património imenso cuja gestão deverá passar, antes do dia 20 de janeiro (em que toma posse na Casa Branca) para as mãos dos seus filhos mais velhos: Eric e Don que atualmente já têm funções executivas como vice-presidentes, a par de três outras pessoas, que não pertencem à família mas que também estão na linha da frente em cargos executivos da Trump Organization.

O alegado conflito de interesses tem sido um dos temas mais abordados nesta fase de transição, mas quando se pensava que a passagem de testemunho estaria para breve, devendo ser tudo esclarecido esta quinta-feira, dia 15 de dezembro, Trump anuncia que não será bem assim. A 30 de novembro, Donald Trump anunciou via Twitter que iria sair “totalmente” do mundo dos negócios para evitar qualquer perceção de que pudesse haver um conflito de interesses entre a gestão dos interesses do país paralelamente à gestão das empresas e dos seus próprios interesses. No tweet deixou claro que não se tratava de uma necessidade legal mas sim de um gesto “visualmente importante” que teria de tomar porque “a Presidência é uma tarefa muito mais importante”.

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Para isso anunciou que no próximo dia 15 de dezembro iria dar uma conferência de imprensa, juntamente com os filhos, para explicar como tudo se iria processar. Mas esta terça-feira, a dias de se realizar a dita conferência, surge uma mudança de planos. Também via Twitter, Trump adia o momento por termo indefinido, prometendo contudo que irá passar a empresa para as mãos dos dois filhos mais velhos e que “não serão feitos novos negócios durante o tempo em que estiver na Presidência dos EUA”. Seja esse tempo um ou dois mandatos. Ou seja, os que já existem continuarão a ser geridos pela família, mas não se irão firmar novos negócios.

É tudo muito incerto e novo: um Presidente de um dos países mais infuentes do mundo, com um importante papel diplomático, que tem negócios e interesses particulares um pouco por todo o mundo. Depois de ser eleito, o seu advogado, Michael Cohen, já tinha dado uma entrevista à CNN com pistas sobre o assunto: a gestão dos ativos da Trump Organization irá passar inteiramente para os filhos mais velhos através do sistema de blind trust, um mecanismo que é uma espécie de fundo cego, usado para evitar os conflitos de interesses quando um empresário é eleito para um cargo político. Em teoria, Trump não pode, a partir do momento em que este mecanismo é ativado, interferir na gestão ou receber informações relativas ao estado das empresas. Mas o facto de o fundo cego ser atribuído a familiares tão próximos torna esta separação, e esta “cegueira”, muito ténue. Além de que está nas mãos de Trump terminar a utilização da blind trust a qualquer momento… O conflito de interesses mantém-se, dizem muitos.

Aparentemente este foi sempre o plano, ainda que seja um plano frágil. Segundo chegou a dizer Michael Cohen na mesma entrevista, Trump só não concorreu à Casa Branca em 2012 porque os filhos ainda não tinham idade suficiente para ficar ao comando dos seus negócios. “Eles são muito inteligentes, muito qualificados. Foi por isso que Donald Trump não concorreu há quatro anos, porque eles eram mais novos e não tinham ainda, presumo, a experiência e a maturidade que ele desejaria para lhes deixar uma empresa de 10 mil milhões de dólares. Mas agora ele está muito confortável com a ideia de os filhos estarem ao comando, e com as pessoas que os rodeiam”, disse.

Durante toda a campanha Donald Trump sempre fugiu ao assunto, escudando-se no argumento de que esse era um não-assunto, um não-problema. Na última entrevista ao New York Times disse mesmo que a marca Trump, e especificamente o recém-construído Trump Hotel, o seu novo palácio em Washington no antigo edifício dos correios, que foi inaugurado com pompa e circunstância em plena campanha presidencial, “tem muito mais valor agora do que tinha antes”.

A verdade é que a marca Trump se tornou bastante mais “sexy” agora que passou a ser a marca de Donald Trump, o Presidente dos EUA, e não apenas a marca de Donald Trump, o empresário.

Mas que império é este que Donald Trump tem?

Não é raro ouvir o próprio Donald Trump dizer que tem um património líquido de cerca de 10 mil milhões de dólares, mas a verdade é que as suas últimas declarações de rendimentos (Personal Financial Disclosure) indicam uma avaliação é mais contida: algures entre 3,5 e 3,7 mil milhões de dólares. Recentemente a Forbes fez uma revisão em baixa da riqueza do magnata norte-americano, depois de no início do ano ter feito uma estimativa que apontava para 4,5 mil milhões. O motivo, explicou, foi atribuído em grande medida à crise do imobiliário (em 28 ativos, 18 terão tido uma redução face à estimativa anterior, segundo a Forbes).

É antiga a polémica em torno da riqueza de Trump. Um ex-jornalista do The New York Times, Tim O’Brien, escreveu um livro há cerca de dez anos em que concluiu que a riqueza de Trump não ia além de 250 milhões, numa altura em que Trump dizia que valia 6 mil milhões e a Forbes 2,6 mil milhões. Trump criticou as fontes do autor dizendo que “podem ir falar com estes tipos, que têm mulheres gordas de 200 kilos e têm ciúmes de mim, porque quem me conhece bem sabem que sou um excelente empreendedor”. Contas à parte, Trump deixa uma coisa clara: “Estou orgulhoso da minha riqueza. Fiz um trabalho espantoso“, afirmou Donald Trump quando anunciou a candidatura às eleições presidenciais de 2016.

No seu rendimento e património declarado inclui-se:

  • Pelo menos 1,4 mil milhões de dólares em propriedades imobiliárias que incluem a sede, a Trump Tower, no centro de Manhattan, resorts de golf na Florida, Nova Iorque, New Jersey e na Escócia, ou ainda um avião;
  • Mais de 300 milhões de dólares de receita líquida só com os campos de golf e resorts associados;
  • Mais de 100 milhões em rendas e vendas de propriedades;
  • Pelo menos 25 milhões provenientes do investimento no Obsidian da BlackRock, que foi considerado o maior investimento de Trump em fundos de cobertura dedicados a rendimento fixo, não ações;

Mas a lista é bem mais extensa do que isto. São 48 páginas de bens, empresas e propriedades imobiliárias listados integralmente, segundo se pode ver na declaração de rendimentos e património relativa a 2014 que entregou em 2015 ao departamento de ética do governo norte-americano, como se pode ver aqui, num documento disponibilizado pelo El Mundo.

Não há forma de saber exatamente qual o valor de todos os ativos e passivos de Donald Trump mas, segundo a Economist, 7% da riqueza estimada está concentrada fora dos EUA, enquando 66% se reúne na cidade de Nova Iorque. Cerca de 22% advém de produtos da marca Trump que foram criados a partir de 2004, quando Trump entrou no mundo das celebridades e dos reality shows. Cerca de 64% deriva de propriedade imobiliária e 17% dos resorts e clubes de golf.

Património imobiliário

NEW YORK, NEW YORK - SEPTEMBER 29: A general view of Trump Tower on Fifth Avenue, September 29, 2016 in New York City. The building is owned by Republican presidential candidate Donald Trump. (Photo by Drew Angerer/Getty Images)

Pode haver várias Trump Tower, mas esta, em Nova Iorque, é “a” Trump Tower, sede dos negócios de Donald Trump e residência oficial da família.

O grande enfoque dos negócios de Donald Trump reside no património imobiliário, onde Trump tem propriedades espalhadas por diversos estados norte-americanos: Virginia, Illinois, Florida, New Jersey, Nevada, California, Connecticut, Hawai, Nova Iorque. Ou ainda no estrangeiro, onde o alcance vai desde o Canadá ao Dubai, passando pelo Panamá, Coreia do Sul, Filipinas, Índia, Uruguai e Turquia.

Pode haver várias Trump Towers, há até uma no Rio de Janeiro, na Índia, no Uruguai ou nas Filipinas, e pode até haver mais do que uma só em Nova Iorque, mas “a” Trump Tower é a que fica na quinta avenida, que se estende por 58 andares, num edifício inaugurado em 1983, e que tem o último piso reservado para a residência oficial da família Trump.

Trata-se de uma luxuosa penthouse que já apareceu em inúmeras revistas de arquitetura e design. Foi decorada pelo lendário designer Angelo Donghia, no início dos anos 80, responsável por trabalhos nas casas de Ralph Lauren, Mary Tyler Moore, Liza Minelli ou Diana Ross. O tom predominante é o dourado e o estilo o rococó, que marcou o séc. XVIII francês. Aliás, a maior parte dos pormenores são mesmo em ouro de 24 quilates e há candelabros e molduras com… diamantes.

O escritório de Melania, por exemplo, está repleto de joias e peças de arte e decorado com rosas amarelas. Os brinquedos de Barron (o 5º filho de Trump, o que tem em comum com Melania, a sua terceira mulher) são sempre miniaturas de carros de luxo, sendo que há também um leão de peluche em ponto grande. Aqui estão algumas fotos do interior luxuoso do apartamento.

Foi na Trump Tower, que serve de sede ao império Trump, que foi filmado o reality show The Apprentice (O aprendiz) produzido pelo empresário Donald Trump, que punha várias celebridades a aceitar desafios de negócios para arrecadar dinheiro para instituições de solidariedade social. Além de ser sede de empresas e lojas, incluindo uma loja de presentes que vende produtos diversos da marca Trump, o arranha-céus inclui condominínios residenciais entre o 38º e o 58º andar, incluindo nove duplexes e penthouses de luxo com casas de banho em mármore, banheiras de hidromassagem, pisos em madeira e pedra, além de vistas panorâmicas da cidade de Nova Iorque, e do Central Park.

Mas se o último andar é de Donald e Melania Trump, os andares abaixo têm donos não menos famosos: é o caso de Bruce Willis, Andrew Lloyd Webber ou… Cristiano Ronaldo. Trata-se de um luxuoso loft de 233 metros quadrados, que custou ao jogador português 18,5 milhões de dólares.

Hotéis: 10 + 2

The Trump International Hotel, Washington is pictured before its grand opening October 26, 2016 in Washington, DC. / AFP / ZACH GIBSON (Photo credit should read ZACH GIBSON/AFP/Getty Images)

O Trump International Hotel, em Washington, foi construído num antigo edifício dos correios e inaugurado com pompa e circunstância em outubro deste ano, em plena campanha eleitoral.

Só hotéis, são uma dezena com o carimbo Trump, com mais dois prestes a abrir. Segundo se lê na página oficial da Trump Organization, a empresa de Donald Trump detém dez hotéis (em plena atividade), em Chicago, Las Vegas, Miami, Nova Iorque, Hawai (onde o Trump International Hotel & Tower Waikiki Beach Walk foi um dos primeiros hotéis altamente luxuosos a ser construído naquele estado), bem como em Toronto, Irlanda e Panamá.

O último hotel que Trump inaugurou nos EUA foi precisamente junto à Casa Branca, e a inauguração aconteceu em outubro deste ano, em plena campanha eleitoral. Trata-se do Trump International Hotel, em Washington DC, que encerra em si mesmo um potencial conflito de interesses na medida em que o empresário teve de chegar a acordo com o Governo dos Estados Unidos, o antigo proprietário do edifício, para abrir o hotel, o que faz com que, quando assumir o cargo de Presidente vai supervisionar os termos do contrato que o Governo que tutela tem… consigo próprio.

Trata-se de um edifício totalmente renovado num antigo posto de correios, cuja construção foi anunciada em 2014 e a inauguração aconteceu já em plena reta final da campanha eleitoral que viria a eleger Donald Trump Presidente. Situado na Avenida Pensilvânia, fica precisamente ao fundo da rua onde Donald Trump irá viver enquanto inquilino da Casa Branca. Uma noite ali custa cerca de 400 dólares, que passam para 10 mil se se tratar da suite presidencial.

O hotel dispõe de 263 quartos, uma suite presidencial e um spa da autoria de Ivanka Trump, a filha de Donald Trump. O edifício, datado de 1899, levou uma restauração avaliada em 200 milhões de euros e segundo o slogan apresentado pela organização Trump, “Washington nunca mais será o mesmo”. O edifício é conhecido pela sua torre do relógio, que o torna no terceiro edifício mais alto de Washington. Os hóspedes poderão usar este espaço para ver grande parte da capital dos Estados Unidos.

Questionado sobre o potencial conflito de interesses associado ao seu mais recente hotel, na última entrevista ao New York Times, Trump limitou-se a dizer que não há qualquer conflito uma vez que não vai “ter nada a ver com o hotel”. Admitiu, contudo, que “a ocupação do hotel” será agora maior do que antes, porque é Presidente e a marca Trump tornou-se “mais valiosa do que antes”. O que é factualmente verdade.

A ser inaugurados em breve estão pelo menos dois projetos, no Rio de Janeiro, Brasil, e em Vancouver, no Canadá, sendo que também há projetos de unidades hoteleiras desenhados para Baku, no Azerbeijão.

Campos de Golf: 17

Campos de golf são pelo menos 17 no portfólio da Trump Organization, e o leque inclui alguns dos maiores campos de golf de Miami, do Dubai, de Palm Beach ou da Escócia. O caso da Escócia é, de longe, o mais conhecido, o mais antigo, que já acolheu grandes eventos e torneios internacionais, mas é também o mais polémico.

Recentemente, com a eleição de Donald Trump ainda a quente, o presidente-eleito recebeu na Trump Tower em Nova Iorque um dos seus amigos britânicos, o líder interino do UKIP (partido de extrema-direita britânica) Nigel Farage, e aproveitou a ocasião para interceder em seu favor na disputa legal que tem há anos com empresas de energia eólica que planeiam inserir pelo menos 11 turbinas em Aberdeen, na Escócia, bem junto ao ser resort de golf. O plano energético foi mesmo aprovado pelo governo escocês.

Os tribunais têm dado razão ao governo escocês, mas Trump não quis desperdiçar a conversa que teve com Farage em Nova Iorque para fazer lobby contra a construção das turbinas junto ao seu campo de golf. “Ele não gosta de parques eólicos de todo, e diz que não quer destruir a magnífica paisagem escocesa com as turbinas”, referiu depois Andy Wigmore, um dos membros da equipa de Farage que o acompanharam na reunião.

A marca Trump, do perfume à agência de modelos

NEW YORK, NY - APRIL 18: Business mogul/TV personality Donald Trump and Miss Universe 2010 Ximena Navarrete (R) attend the Success by Trump fragrance launch at Macy's Herald Square on April 18, 2012 in New York City. (Photo by Slaven Vlasic/Getty Images)

Donald Trump no lançamento do perfume Success by Trump, em abril de 2012, na cadeia de lojas Macy, em Nova Iorque

A marca Trump, de resto, inclui muito mais do que propriedades e bens fixos. Desde o perfume “Success by Trump” (na foto), à agência de modelos fundada pelo magnata, passando por ringues de patinagem no gelo e culminando nas Produções Trump para a televisão norte-americana, produtora fundada em 2004, a marca Trump tem um autêntico sistema de merchandising à sua volta.

Entre os programas produzidos pela Trump Productions incluem-se reality shows e programas de celebridades como o ‘The Apprentice,’ ‘Pageant Place,’ ‘The Celebrity Apprentice’ e ‘The Ultimate Merger’.

Naquela altura, no início dos anos 2000, em que Donald Trump se tornou uma estrela do mundo dos reality shows e das celebridades serviu de impulso para uma nova fase ascendente na sua carreira, depois de nos anos 1990 ter passado por aquilo a que a Economist chama de “era da humilhação”: o negócio dos casinos começou a falir e as dívidas chegaram em força. Foi com o sucesso dos programas de televisão que produziu, nomeadamente o The Apprentice, que esteve no ar desde 2004 até 2015 e conquistou no seu pico 28 milhões de espectadores, que Trump voltou à ribalta. O novo impulso levou-o a criar uma onda de pequenos negócios, estando envolvido em quase 500 empresas, incluindo bebidas energéticas em Israel. A marca Trump está um pouco por todo o mundo.

Os conflitos de interesses e a cláusula de emolumentos: Trump, Presidente vs. Trump, empresário

Além do recém-inaugurado hotel na capital norte-americana, onde o prorietário (Trump empresário) tem um contrato assinado com o Governo (agora tutelado por Trump Presidente), e onde vários são os diplomatas de todo o mundo que estão a reservar noites no hotel na esperança de contactarem com o presidente eleito dos EUA, há outros casos gritantes ao nível de potenciais conflitos de interesses. É o caso do Banco Industrial e Agrícola da China, do qual o Govenro chinês é o maior accionista, que tem um escritório precisamente na Trump Tower, em Nova Iorque, ou o caso do Trump Office em Buenos Aires, que aguarda aprovação do Governo argentino. A verdade é que tudo o que envolva aceitar dinheiro (ou outros bens) de governos do estrangeiro ou de empresas estatais tem agora em si mesmo um confito de interesses — mesmo que Donald Trump passe tudo para as mãos dos filhos.

Mas há mais. É o caso, por exemplo, das ligações da Trump Organization ao Deutsche Bank. É que o banco alemão é o principal credor das empresas de Donald Trump e, desde 1998, já recebeu, de acordo com o Wall Street Journal, cerca de 2,3 mil milhões em empréstimos. O problema é que o Deustsche Bank está atualmente a negociar o valor da multa que lhe será aplicada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos pela responsabilidade que o Estado alemão teve na crise imobiliária.

Outro dos credores internacionais de Trump é o Banco da China, que tem a particularidade de ter recebido 900 milhões de euros do governo chinês para emprestar a um consórcio que incluía uma empresa de Trump. Na verdade, foi uma sociedade do magnata Donald Trump que absorveu 30% do valor emprestado pelo governo chinês. O mesmo acontece em geografias menos conhecidas dos americanos como no Azerbeijão, onde Donald Trump é sócio num projeto imobiliário de Anar Mammadov, filho do ministro dos Transportes.

Donald Trump tem ainda participações na sociedade detentora de um projeto para a construção de um oleoduto no Dakota do Norte, que prometeu desbloquear como Presidente. O magnata é ainda detentor de participações no Facebook e no Bank of America, instituição que poderia beneficiar de um novo regime de regulação bancária proposto por Trump. Certo é que a influência de Donald Trump, Presidente, no mercado de ações e investimento do qual ele é um dos principais beneficiários, é incalculável.

A verdade é que nenhuma lei obriga o Presidente dos EUA a vender os seus bens ou a passá-los a terceiros através de um “fundo cego” (blind trust), embora, segundo conta a Economist, nove dos 12 presidentes dos EUA desde a Segunda Guerra Mundial o tenham feito. Mas Trump, Presidente, ao aceitar dinheiro de governos estrangeiros pode não estar a infringir a lei mas pode estar a violar a chamada Claúsula de Emolumentos da Constituição norte-americana.

Trata-se do Artigo I, Secção 9, cláusula 8, que diz que nenhum norte-americano pode “sem o consentimento do Congresso, aceitar nenhum presente, emolumento, título, ou bem de qualquer espécie de um rei, príncipe ou Estado estrangeiro”. É uma cláusula antiga, uma regra que se adequava à monarquia e aristocracia, mas que visava proteger os EUA do problema da corrupção.

As dívidas: mais de 650 milhões de dólares

Mas nem só de luxo vive o império de Trump. Também há dívidas. O Presidente eleito dos Estados Unidos tem feito da sua história pessoal a sua grande bandeira: o homem de negócios que conseguiu construir um império de milhares de milhões de dólares sem dever nada a ninguém. No entanto, uma investigação recente do New York Times foi atrás das contas das empresas de Donald Trump e descobriu que, só em património imobiliário, a sua dívida é superior a 650 milhões de dólares (cerca de 574 milhões de euros à taxa de câmbio atual).

De resto, além das cores douradas que são visíveis em todos os hotéis e resorts de Donald Trump, o império do agora Presidente eleito dos EUA está envolto numa núvem difusa. Trump recusou-se a revelar a sua última declaração de rendimentos publicamente, argumentando que estava a ser auditado pelo fisco norte-americano e não permitiu que uma empresa independente avaliasse os seus ativos. No início da campanha presidencial, contudo, o candidato preencheu uma declaração financeira de 104 páginas, onde referiu que a dívida associada aos seus negócios era de cerca de 315 milhões de dólares (275 milhões de euros) a um pequeno grupo de credores.

Dívidas e conflitos de interesse à parte, desde a vitória de Trump nas eleições de novembro não há dúvida de que a marca vai beneficiar. Segundo dados recolhidos pela Economist junto de uma agência de viagens, os preços médios por noite num hotel da marca Trump, assim como nos restantes hotéis de 4 e 5 estrelas, caíram ao longo do ano de 2016 cerca de 1%. Mas em novembro, mês da eleição, subiram 12%. Ainda assim, esta não deverá ser uma tendência constante no longo prazo. Segundo a Economist, mesmo se o prestígio da marca Trump subir no longo prazo, serão precisos muitos anos para que isso se traduza num maior fluxo de caixa.