Dois anos depois de ter fechado, o Museu de Arte Popular (MAP), em Belém, vai voltar a abrir as portas para receber a exposição Da Fotografia ao Azulejo: povo, monumentos e paisagens de Portugal na primeira metade do século XX, comissariada pelo antropólogo espanhol José Luis Mingote Calderón.

A abertura oficial está marcada para o final da tarde desta quarta-feira, mas durante a manhã os jornalistas tiveram a possibilidade de ver em primeira mão o conteúdo da mostra inicialmente apresentada no Museu Nacional Soares dos Reis, no Porto.

A visita guiada — conduzida por Paulo Costa, diretor do Museu Nacional de Antropologia (e por inerência, do MAP), no Restelo, e por Paula Silva, diretora-geral da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) — foi feita ao som de martelos e berbequins. Os últimos preparativos estavam ainda a decorrer. Havia muitos cartazes para pendurar e mesas para arrumar.

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Durante a manhã, ainda se ultimavam os preparativos para a exposição

Paisagens de um Portugal esquecido

Da Fotografia ao Azulejo foi inicialmente organizada e apresentada no ano passado no Museu Nacional Soares dos Reis, no Porto, seguindo depois viagem por Espanha — primeiro no Museu Etnográfico da província de León e, mais recentemente, no Museu Nacional de Antropologia de Madrid, onde José Luis Mingote Calderón, comissário da exposição, trabalha.

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A mostra, composta maioritariamente por peças que Calderón, um verdadeiro apaixonado pela cultura popular portuguesa, foi recolhendo ao longo dos anos e que fazem parte da sua coleção pessoal, propõe uma nova visão da arte azulejaria, expressão artística marcante da paisagem do país, bem como as imagens fotográficas que lhe deram origem.

No início do século XX, a fotografia tornou-se na principal fonte de inspiração para a criação de painéis de azulejos, como mostram os diferentes registos fotográficos expostos no MAP, lado a lado com peças do Museu de Etnologia que ajudam a contextualizar a coleção. “No século XX, é a foto quem manda”, disse José Luis Calderón, presente na visita. “Tal como no século XVIII era a gravura.”

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“Existe uma tradição antiga de criar azulejos a partir de gravuras e que, depois do surgimento da fotografia, foi muito ampliada. Com o surgimento da fotografia no início do século XX, deu-se um grande desenvolvimento das artes gráficas. A fotografia forneceu a verdade do país e lançou o movimento da modernidade”, afirmou.

A exposição encontra-se dispersa por três salas do MAP. A primeira, a Sala do Minho, apresenta uma introdução e contextualização da produção de azulejos em Portugal no início do século XX, destacando algumas fotografias e painéis. Ao centro, foi colocado um traje minhoto, pertencente à coleção do Museu de Etnologia, fazendo um elo de ligação com a antiga exposição permanente do MAP. Do Museu de Etnologia, que recebeu as 11.600 peças que faziam parte do MAP, foram também transportadas duas mesas e respetivas cadeiras de maneira.

O segundo espaço, que correspondia à Sala de Trás-os-Montes da antiga exposição permanente, trata-se de uma “exploração das fontes gráficas dos azulejos” e inclui “postais, revistas e livros”, fontes gráficas editadas a partir do século XX, como explicou Paulo Costa aos jornalistas. Um vídeo projetado numa das paredes da ampla sala mostra como diferentes imagens podiam servir de inspiração a um único artista, compondo uma imagem única que nem sempre respeitava o rigor etnográfico das fotografias originais.

Um bom exemplo disso é um painel de azulejos que mostra duas figuras de capa, reproduzidas a partir de duas fotografias diferentes. O problema é que uma é de Barroso e a outra de Miranda do Douro. Uma fotografia tirada em 1900, por exemplo, também podia servir de modelo a uma obra dos anos 30. “As imagens viajavam por todo o lado”, disse José Luis Calderón. “Repetem-se muitas, muitas vezes. É uma curiosidade ideológica, gráfica e interessante.”

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Para Calderón, a produção de painéis de azulejos durante o século XX resume-se numa única palavra: modernidade. “O que acontece no século XX em termos gráficos é semelhante ao que aconteceu com a Internet. Pesquisava-se em revistas de uma maneira que não se fazia antes. A fotografia fornece a realidade do país.” Além disso, estes são também um reflexo da ideologia nacionalista do Estado Novo.

A terceira e última sala, onde antigamente estavam expostas as carroças, inclui vários artefactos usados nas vindimas e um carro do Douro, também da coleção do Museu Nacional de Etnologia. Ao fundo, encontra-se exposto um painel de azulejos, realizado pela fábrica da Fonte Nova em Aveiro, que pertencia à Estação de Ovar e que atualmente se encontra na Câmara Municipal da cidade.

Por montar faltava um posto multimédia com a base de dados de José Luis Calderón, mas que estará pronto a tempo da abertura às 18h30. Esta irá incluir perto de mil imagens, fotografadas pelo espanhol desde 2008 em mais de 80 lugares distintos.

Um museu para continuar?

Da Fotografia ao Azulejo: povo, monumentos e paisagens de Portugal na primeira metade do século XX ficará patente no MAP até outubro de 2017 e as entradas custarão 2,5 euros. Até lá, a ideia é realizar outras iniciativas e “eventualmente exposições na parte que está fechada” e que se encontra ainda em obras, como explicou Paula Silva. O facto de o edifício ter sido concebido para ser provisório, obrigada a que, de tempos a tempos, precise de ser alvo de uma intervenção de conservação e restauro. Foi isso que aconteceu com as três salas que recebem agora a mostra e que “estavam com problemas de infiltrações de água”.

“A ideia é ir aos poucos aumentado o espaço de visita que está reduzido a metade”, explicou a diretora da DGPC. “Há um programa pensado, mas ainda não está completamente fechado.” Um dos objetivos é tentar trazer o espólio do MAP de volta a Belém, algo que os responsáveis esperam poder acontecer já no decorrer do próximo ano. A única dificuldade passa por tentar perceber como é que as peças podem ser apresentadas de forma atual.

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O Museu de Arte Popular fica localizado junto ao Padrão dos Descobrimentos, em Belém

Paulo Costa salientou a importância de “valorizar o edifício, a sua história e valor arquitetónico”. Um primeiro passo já foi dado com a criação de um espaço dedicado exclusivamente ao MAP na sala oposta à exposição, junto à loja. Este irá incluir uma maqueta da obra e documentação vária para que os visitantes fiquem a conhecer um pouco mais sobre a história do edifício. Para que saibam “onde estão e o que é isto”, como salientou Paula Silva.

“Esta exposição é a garantia de uma vontade de querer manter o espaço aberto”, frisou a diretora da DGPC. “Era importante este edifício estar aberto ao público, até pela localização fora de série.” Resta saber se será mesmo desta que o MAP irá abrir definitivamente.

A exposição Da Fotografia ao Azulejo será oficialmente inaugurada esta quarta-feira, às 18h30. A cerimónia contará com a presença do ministro da Cultura, Luís Filipe de Castro Mendes.