Entrou cabisbaixo, a mordiscar o lábio para resistir ao choro, e sentou-se no divã do consultório. Suspirou, pousou as mãos entrelaçadas sobre as pernas trémulas, e à pergunta do psicólogo “Então, o que o traz cá?” respondeu, num portunhol com travo do Magrebe:

— Es el treinador, Nuno. Ele no gusta de mim!

Não sabemos se Brahimi foi realmente a um psicólogo ou não. Nem sabemos se Nuno Espírito Santo, de tão pouco que o utilizava no começo da época, morria de amores pelo argelino, ou vice-versa. Não interessa. Uma coisa é certa: quem o viu e quem o vê. Esteve com um pé dentro e outro fora do Dragão no verão. Ficaria. Mas ficaria com os dois pés fora: raramente Nuno utilizava Brahimi a titular — como titular foi sempre desde que ao FC Porto chegou. Quando utilizava, e o suplente Brahimi era chamado a jogo, apupavam-no os adeptos das bancadas. E apupavam com razão, dirão: tudo quanto fazia, dribles, passes, remates, fazia desenxabidamente. Esta noite, não. Quando foi substituído por Herrera aos 73′, não. Foi aplaudido de pé.

É que o primeiro golo do FC Porto-Marítimo foi dele. Mesmo em cima do intervalo, aos 45′. Ou entrava por ali ou não entrava de todo: foi pelo “buraco da agulha”. Primeiro, Jota recebeu a bola dentro da área e de costas para a baliza. Rodou. E rematou. Mas o remate de Jota esbarraria no central Maurício Antônio. E das pernas de Maurício seguiu para os pés de Brahimi, também dentro da área, mas descaído para a esquerda. O argelino tinha a marcação de Patrick, mas acelerou, livrou-se dela e, dentro da pequena área, rematou entre Gottardi e o poste esquerdo.

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Não é de hoje que Brahimi marca; fá-lo há três partidas seguidas — a última vez que o conseguiu foi há três anos. Sim, o divã fez-lhe bem.

E se não foi o divã que o fez, alguma coisa terá sido certamente. É que o que há de melhor para contar da primeira parte veio dos pés de Brahimi. E da segunda também. Aos 67′, cinco toques e um golo. Tudo simples. Eficácia total. A meio-campo, praticamente no centro deste e sem pressão, Óliver desmarcou Brahimi à entrada da área. O argelino tinha Erdem Şen a respirar-lhe no cachaço, outro “madeirense” (Fransérgio) logo ao lado, estava de costa para a baliza, mas rodopiou, deixou os adversários para trás, desmarcaria depois (sem olhar!) André Silva na direita da área, um passe preciso entre Deyvison e Raul Silva. A receção de André foi orientada para a frente, rematando de seguida na direção do poste esquerdo — mas lá para dentro, para o golo. Até parece coisa simples, mas não é.

O FC Porto antecipou a 15.ª jornada (na segunda-feira jogará a 14.ª, na receção ao Chaves) e Nuno, sabendo que a vitória lhe garantiria ficar a somente um ponto do líder Benfica, deitou trancas à porta. Que é como quem diz, reforçou o meio-campo. João Teixeira entrou para o lugar de Corona e Rúben Neves para o de Óliver. Isto aos 84′. Um minuto depois, golo do Marítimo.

À esquerda do ataque, Raul Silva fez um lançamento lateral para Fransérgio, o médio do Marítimo tocou a bola mais para a frente, para a entrada da área, Djoussé recebeu-a, tinha sobre si a marcação de Felipe, tombariam os dois, mas Djoussé foi mais veloz a levantar-se e seguiu com a bola. Ao caminho saiu-lhe o outro central do FC Porto, Marcano, mas tão depressa saiu, como tão depressa Djoussé se livraria dele com um drible. Depois, puxou do pé direito atrás e colocou a bola no canto superior esquerdo da baliza portista, o canto onde se diz que dorme a coruja. Se dorme, acordou assarapantada.

Não veio mal nenhum ao mundo, ou ao resultado, com o golo tardio de Djoussé. O FC Porto venceria mesmo. E Brahimi sorriu no final, ergueu o punho direito e esticou o polegar. Está OK, diz ele. Está mesmo.