Doze personalidades distinguidas com o Nobel da Paz escreveram uma carta a Aung San Suu Kyi, líder histórica contra a ditadura militar na Birmânia e principal figura do governo do país (apesar de não poder ser candidata à presidência), onde acusam a também vencedora do Nobel, de inoperância em relação à violência contra os Rohingya, uma minoria muçulmana que tem sido perseguida e atacada pelo exército birmanês.

A carta aberta, enviada ao Conselho de Segurança da ONU e assinada por nomes como Desmond Tutu, Malala Yousafzai ou José Ramos-Horta, fala em “tragédia” e “limpeza étnica”. A minoria muçulmana Rohingya, segregada pela maioria budista, está localizada maioritariamente na província de Rakhine, que faz fronteira com o Bangladesh, onde mais de 50,000 pessoas terão procurado refúgio. O próprio Bangladesh está a enfrentar críticas da comunidade internacional por ter reforçado o policiamento na fronteira em vez de aceitar todos refugiados, que, segundo se lê na carta, são originalmente imigrantes daquele país.

O calvário da minoria dos Rohingya não começou este ano — foi a eleição de Aung San Suu Kyi, e a surpreendente indiferença do seu governo, que trouxe esta situação para as primeiras páginas dos jornais. “Em 1982 os Rohingya viram os seus direitos de cidadania revogados, ficaram efetivamente sem Estado e enfrentam desde então restrições severas em áreas como o acesso à educação, ao movimento dentro do país e à liberdade religiosa”, pode ler-se na carta.

“Apesar de pedidos redobrados para que Aung San Suu Kyi tomasse atenção à situação, estamos frustrados por ela não ter tomado qualquer iniciativa para assegurar os direitos à cidadania plena dos Rohingyas. Suu Kyi é a líder do país e é dela a responsabilidade de liderar, e liderar com coragem, em direção à compaixão e ao humanismo”, acrescentam ainda os signatários.

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A crise, que desde 2012 se tem vindo a agudizar, entrou na sua fase mais crítica em outubro deste ano quando nove militares birmaneses que patrulhavam a fronteira foram encontrados mortos. O exército culpou um grupo de homens Rohingya mas o seu envolvimento nunca ficou provado. A retaliação que se segui foi de tal forma violenta que levou um representante das Nações Unidas para os refugiados, John McKissick, a acusar a Birmânia de “limpeza étnica” e a Amnistia Internacional a classificar as açoes do exército como “crimes contra a humanidade”.

“As acções deploráveis dos militares podem ser parte de um ataque generalizado e sistemático contra a população civil e podem constituir crimes contra a humanidade”, disse o director da organização para o Sudeste Asiático, Rafendi Djamin.

Os relatórios das organizações de defesa dos Direitos Humanos presentes no país e em outros países do Sudeste Asiático relatam situações de extrema violência. Violações em massa, incêndios gigantes que consomem aldeias inteiras enquanto a população ainda lá vive e espancamentos são algumas das atrocidades relatadas pelos que conseguem fugir.