Os republicanos na Câmara dos Representantes dos Estados Unidos pensaram incapacitar o gabinete independente de ética que investiga os abusos dos legisladores norte-americanos desde 2008, criado depois de sentenciados a penas de prisão três membros do Congresso. A decisão foi tomada à revelia da liderança republicana na Câmara dos Representantes mas, em menos de 24 horas, voltaram atrás e o gabinete manter-se-á, avança o New York Times.

Donald Trump ainda não tomou posse mas, a cada dia que passa, a sua promessa de “drenar o pântano”, a forma como qualificou a política em Washington, parece mais longe de se cumprir. Numa administração em que os eventuais conflitos de interesses do Presidente são uma questão espinhosa e cuja resolução demora a aparecer, e que é composta por milionários e bilionários com interesses nas áreas em que vão governar, a maioria republicana nas duas câmaras do Congresso dá sinais de se começar a proteger, não contra os conflitos de interesses, mas contra quem os investiga.

Em 2008, na sequência de vários casos de corrupção, o Congresso criou o Office of Congressional Ethics, um gabinete que é supervisionado por seis membros que não pertencem ao Congresso e que, apesar de não terem poder de intimação, tem a sua própria equipa de investigadores, com que podem fazer entrevistas confidenciais e recolher documentos com base em queixas feitas pelo público e na sequência de notícias. Terminada a investigação, os seis membros decidem se enviam o parecer para a Comissão de Ética da Câmara dos Representantes, que leva a cabo a sua própria investigação.

Mesmo que não decida que não há motivo para avançar com um processo contra representantes pelas infrações investigadas, a Comissão de Ética era obrigada a divulgar as conclusões do Office of Congressional Ethics. Assim era até esta segunda-feira, altura em que os republicanos, que passaram a ter o domínio completo no Congresso – Senado e Câmara dos Representantes -, para além de um Presidente republicano com a eleição de Donald Trump, decidiram cortar significativamente o poder para este tipo de investigações na Câmara dos Representantes.

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O voto cria um novo órgão, o Office of Congressional Complaint Review, que deixa desde logo de poder aceitar queixas anónimas, passa a ser supervisionado diretamente pela Comissão de Ética, composta por representantes que respondem perante os seus próprios partidos, e terá regras para melhor salvaguardar os direitos dos suspeitos e das testemunhas, de acordo com os republicanos.

A aprovação desta medida foi anunciada na segunda-feira por Robert Goodlatte, representante republicano, sem debate ou aviso, diz o New York Times, na véspera de um novo Congresso tomar posse.

Na mó de cima, e com uma agenda ambiciosa para os próximos anos de controlo absoluto do poder legislativo nos EUA, a verdade é que esta medida não caiu bem na liderança republicana. Paul Ryan, líder da Câmara dos Representantes, e Kevin McCarthy, o líder da maioria republicana, terão manifestado a sua oposição à medida, de acordo com membros das suas equipas.

Os democratas também não perderam a oportunidade de atacar a decisão. Nancy Pelosi, que lidera a minoria democrata na Câmara dos Representantes, para mostrar o seu desagrado e até espanto pela decisão: “os republicanos dizem que querem ‘drenar o pântano’, mas na noite antes de o novo Congresso tomar posse, os republicanos na Câmara eliminaram a única supervisão ética independente sobre as suas ações”.

Os republicanos no Congresso já demonstraram que estão prontos para se defenderem, até das medidas de Donald Trump. O Presidente eleito prometeu criar uma série de limitações à integração de lobistas nas equipas e na passagem a esta carreira pela parte dos políticos e membros das suas equipas, como um período de nojo de cinco anos, mas essa medida foi rejeitada de imediato pela maioria republicana no Senado, liderada por Mitch McConnel.

A votação final aconteceu esta terça-feira. As medidas têm validade de dois anos.