No próximo dia 20 de Janeiro celebram-se os quinze anos da estreia de “Acorrentados” na SIC. É natural que o programa tenha deixado poucas ou nenhumas marcas, foi uma tentativa da estação de Carnaxide de entrar no campeonato dos reality shows e de combater o “Big Brother”, que tinha chegado à TVI há cerca de quatro meses, e que foi um sucesso: quem viveu naqueles meses lembra-se das tentativas frustradas de Zé Maria convencer a Susana que era o tipo certo e de outros momentos memoráveis que hoje dão excelentes vídeos no YouTube.

“Acorrentados” era outra coisa, um reality show mais directo na formação de casais. Cinco pessoas estavam acorrentadas e tinham de ir juntas para todo o lado. Quatro eram do mesmo sexo e a do oposto tinha de ir eliminando aqueles que não lhe interessavam até sobrar um que seria o ideal ou o mal menor. O prémio consistia numa viagem à República Dominicana para os dois. Coisa boa para novos casais. O programa era apresentado pelo Artur Albarran. Prova de que até a SIC queria que tudo falhasse.

Ao longo destes quinze anos, “Acorrentados” não foi o único reality show em Portugal que se esforçou para juntar pessoas. Foi o primeiro neste século, e na era dos reality e talent shows, que tentou e não deixou grande marca, por não ser assim tão directo e por facilmente cair no ridículo. O formato “Big Brother” pegou em grande em Portugal e, por isso, soluções concretas de emparelhamento parecem uma realidade distante. O que se gosta é de meter uma quantidade generosa de pessoas dentro de uma casa, seja em forma de “Casa dos Segredos” ou “Love On Top”, esperar intriga, ciúme, discussões e pelo meio rejubilar com a expectativa de que “aqueles dois andem a pinar”. Se forem famosos até é melhor.

Talvez os dating shows não tenham lugar em Portugal. Por importação directa parece que se deixou de tentar. A SIC Radical vai tendo alguns na sua programação (“Dating Naked” ou “Adam And Eve”) mas são um pouco parvos e distantes de uma realidade mais urbana. Há uns tempos, “First Dates” no britânico Channel 4 mostrou como os dating shows podem funcionar a nível de entretenimento sem serem ridículos. Aliás, o conceito dos programas que abaixo descreverei é mais ridículo do que as situações que neles ocorrem. Faz parte. Mas o resultado é bem-humorado e sem preconceitos.

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Ao longo do ano passado estrearam também no Channel 4 “Naked Attraction” e a segunda temporada de “Married At First Sight”, alternativas a “First Dates” com a mesma perspectiva: juntar pessoas. Ambos são ideias que talvez levem um pouco longe o conceito de juntar pessoas para a vida, mas se estão dispostas a isso, porque não fazer? E a coisa resulta em bons programas de entretenimento, sem juízo das preferências sexuais dos participantes e, mais importante, sem apontar o dedo ou ridicularizar os participantes, nem em voz-off. Não há piadinhas, portanto. E isso cria uma democratização que os torna mais saudáveis e ricos, prontos a desmontarem a estranheza de um primeiro encontro nestas situações. Poderia funcionar em Portugal? Bem-feito, sim. Mas enquanto isso não acontece, saudável seria se chegassem nas versões originais à televisão portuguesa. Há todo um potencial destes programas se tornarem numa espécie de novo MasterChef: algo que muita gente vê religiosamente mesmo acontecendo numa realidade distante.

Pagas tu ou pago eu?

“First Dates” arrancou no verão de 2013 e já vai na sétima temporada no Reino Unido. Há versões australianas, irlandesas, canadianas e em breve vai chegar aos Estados Unidos pela mão da NBC e Ellen DeGeneres. A Warner Bros. TV Portugal iniciou há uns meses um processo de casting para o trazer para Portugal, mas pouco mais se sabe sobre isso. O conceito é simples, é um primeiro encontro. A produção emparelha duas pessoas tendo por base os interesses no parceiro que procuram, marcam um jantar e essa é a primeira, e muitas vezes a única, oportunidade que têm para se conhecer.

A presença de um mediador (Fred Sirieix) na versão britânica serve apenas para dar alguma dinâmica e nunca para interferir no juízo das duas pessoas. Elas são deixadas a conviver durante uns minutos ou horas (depende de como a coisa corre) e no final do programa faz-se um rescaldo por todos os casais de como as coisas correram após terem saído do restaurante. Alguns participantes chegam a voltar e a tentar mais uma vez. Alguns participantes têm idade para serem avós. Há lugar para todos. O toque de génio? A refeição é paga pelos participantes e isso cria logo ali uma dinâmica interessante entre o pretenso casalinho. Facto curioso, a música do programa é assinada pelo português Miguel D’Oliveira. Digam lá se não vêem isto a ser um sucesso na SIC Mulher.

https://www.youtube.com/watch?v=MHVYhxiaNUY

Tudo nu

A SIC Radical tem alguns programas dentro do género em que os participantes estão sempre nus. Nenhum é tão funcional e apelativo como “Naked Attraction”. Estreou no verão passado e, sim, é uma variante até de alguns programas que já passam na SIC Radical mas é mais concentrado e imediato. Apresentado por Anna Richardson, “Naked Attraction” mete uma pessoa em estúdio que terá de escolher o seu parceiro entre seis concorrentes, cada um tem pelo menos um aspecto que o participante principal considerou como importante para ele. Os seis estão nus e vão sendo eliminados em diferentes fases com base na avaliação do participante: primeiro vê da cintura para baixo, depois até ao pescoço, depois o corpo todo e, em seguida, ouve-os falar, a dizer algo sobre si. Na última fase sobram dois que terão a regalia de ver o participante principal nu e fazer um julgamento. Cabe depois ao principal escolher um deles para um date.

A ideia é reverter as convenções de um primeiro encontro. Começa-se, por assim dizer, por conhecer alguém como vai ser visto na intimidade: nu. Pode-se acusar de superficialidade por a maioria da avaliação ser feita com base na aparência de alguém, mas a verdade é que as coisas mudam significativamente depois dos pares se conhecerem melhor. Na primeira temporada de “Naked Attraction” foram raros os casos que foram além do primeiro encontro e até de qualquer tipo de amizade. Quebrar as convenções não significa que as coisas resultem bem.

https://www.youtube.com/watch?v=KueQqUwgJWg

Fazer tudo (mesmo) ao contrário

Por cá ainda estamos presos aos Casamentos de Santo António mas poder-se-ia começar a quebrar a tradição com a estreia de um programa como “Married At First Sight” no dia 13 de Junho na TVI. Muita gente iria ficar irritada, mas outros ficariam entretidos a ver como estes casamentos se desenrolavam. O programa não é original do Channel 4, teve origem na Holanda e já se espalhou por diversos países. Consiste em fazer as coisas mesmo ao contrário: casar primeiro, conhecer depois.

Nas duas temporadas já emitidas no Channel 4 fica a ideia de que a coisa pode resultar. A produção emparelha duas pessoas que, segundo “estudos”, darão bons parceiros. Conhecem-se no dia do casamento, partem depois em lua-de-mel e regressam para viverem uma temporada juntos. Após isso tudo, têm de decidir se aquela pessoa é mesmo ideal e se estão dispostos a mudarem muitos aspectos da sua vida para viverem juntos e continuarem o casamento. No fundo, o casamento é uma espécie de fachada, uma forma abrupta de introduzir duas pessoas e convidá-las a conhecerem algo que querem mas que até agora não conseguiram. É o mais arrojado dos três e é surpreendente como resulta sem parecer ofensivo ou algo perto de uma blasfémia. Quase tudo vale na televisão.