Depois de um debate quinzenal marcado pela troca acesa de argumentos em torno da redução da Taxa Social Única (TSU) para os patrões, esperava-se esta quarta-feira uma discussão novamente tensa no Parlamento, com a audição de cinco horas de José António Vieira da Silva, ministro do Trabalho e da Segurança Social. Bloquistas e comunistas repetiram a sua oposição à medida e os sociais-democratas não voltaram à carga. Acabaria por ser o CDS, que já disse que se ia abster na apreciação parlamentar da TSU, a agitar a discussão.

Depois de Assunção Cristas ter acusado António Costa de mentir em pleno Parlamento por dizer que o acordo concertação social já estava assinado à hora do debate quinzenal, Filipe Anacoreta Correia, do CDS, carregaria no tom, acusando o Governo socialista de ter andando “à pressa recolher as assinaturas dos parceiros sociais”. Uma modo de atuar, afirmou o democrata-cristão, que em nada “dignifica” a concertação social e que é prova provada da estratégia de “instrumentalização” da concertação social que o Governo socialista tem em curso.

As acusações de Anacoreta Correia provocaram a cólera de Vieira da Silva. O ministro do Trabalho e da Segurança Social afirmou que qualquer pessoa de boa-fé perceberia que o acordo já estava fechado a 22 de dezembro e que a questão das assinaturas era apenas uma formalidade. O ministro devolveu depois as acusações, lembrando que o anterior Governo “foi anunciar à televisão a redução da TSU das empresas e um aumento da TSU para trabalhadores”, sem qualquer diálogo com os parceiros sociais — medida que seria travada, depois da manifestação a 15 de setembro de 2012.

Senhor deputado, haja vergonha!”, atirou Vieira da Silva. “Não é [um argumento] digno do debate democrático”.

Seria este o momento mais tenso da audição do ministro do Trabalho e da Segurança Social. Ainda assim, e confrontado com os argumentos utilizados por Bloco de Esquerda e PCP, que acreditam que a redução da TSU beneficia sobretudo as grandes empresas, Vieira da Silva foi repetindo que a redução da TSU não beneficia o “grande capital”. Antes pelo contrário: segundo os dados de 2016, a medida abrangeu 80% das pequenas e médias empresas e teve um custo de 11,5 milhões de euros.

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“O custo para a Segurança Social da medida concretizada este ano da redução da TSU foi de 11,5 milhões de euros, foi esse o custo para a Segurança Social de dispensa de contribuições, particularmente nas PME, considerando que 80% desses apoios foram para empresas com menos de 30 trabalhadores, e mais de metade para empresas que, em média, têm três trabalhadores”, explicou o ministro.

No ano passado, o Governo atualizou o salário mínimo nacional para os 530 euros e manteve a redução da TSU em 0,75 pontos percentuais às empresas, uma medida que tinha já sido introduzida pelo executivo de Pedro Passos Coelho e que o atual executivo decidiu manter.

No entanto, e quando já se avizinha um chumbo anunciando à redução da TSU para as empresas, Vieira da Silva admitiu que não existe um plano B. Em resposta à deputada comunista Rita Rato, o socialista assumiu que “não [era] fácil encontrar uma medida que auxilie tão diretamente as empresas [como a redução da TSU]”.

O ministro do Trabalho e da Segurança Social acabaria a tentar defender a bonomia desta medida. “Este debate que tem agitado a nossa vida nos últimos dias é um debate importante e que devia centrar-se principalmente na discussão desta questão. É ou não é positivo que um universo de pequenos operadores económicos tenham um apoio que os ajude a pagar um salário claramente mais elevado na ordem dos 30 euros no ano de 2017?”, perguntou Vieira da Silva.

Os argumentos do Governo socialista, porém, não convencem nem esquerda nem direita. E já está marcado o terceiro (e decisivo) round: a Assembleia da República vai debater a 3 de fevereiro as apreciações parlamentares de Bloco de Esquerda e PCP, que pedem a revogação prevista pelo decreto. Perante um provável chumbo do decreto-lei, o socialista lembrou que “quem põe em causa uma parte do acordo está a pôr em causa o acordo no seu todo”. E rematou: “Nós assumiremos as nossas responsabilidades. Outros assumirão as suas”. Um recado que era originalmente dirigido a PSD e CDS, mas que é também extensível a Bloco de Esquerda, PCP e PEV.

Segurança Social fecha ano com receitas de 14 mil milhões

Vieira da Silva levaria ainda ao Parlamento os dados da execução orçamental da Segurança Social: segundo o relatório apresentado pelo ministro, a Segurança Social fechou o ano de 2016 com uma receita aproximada de 14,8 mil milhões de euros em contribuições, o que represente um crescimento de 5,2% em relação a 2015. Em contrapartida, a despesa com pensões foi mais elevada —16,2 mil milhões de euros — mas a subida foi menos expressiva (2,5%).

Ainda de acordo com os dados apresentados pelo ministro do Trabalho e da Segurança Social, em 2016, havia 161 mil pessoas a receber o Complemento Solidário para Idosos (CSI), enquanto 216 mil beneficiaram do Rendimento Social de Inserção (RSI).

Em termos de despesa, o CSI representou uma despesa de 203,1 milhões de euros, enquanto o RSI custou 334,7 milhões de euros, estando previsto que essa despesa aumente durante 2017, com 230,6 milhões de euros para o CSI e 379 milhões de euros para o RSI.

Ainda em matéria de prestações sociais, o ano terminou com 1.096 mil famílias com direito a abono de família, numa despesa global de 644,6 milhões de euros, havendo também 41 mil pessoas que pediram o subsídio de parentalidade, com as quais foram gastos 476,1 milhões de euros.

Já no que diz respeito às pensões, o ano de 2016 terminou com 2.034 mil beneficiários da pensão de velhice, 717 mil pessoas a receber pensões de sobrevivência e 240 mil com direito a pensões de invalidez, que, no global, representaram uma despesa de 16.173,5 milhões de euros.

Por outro lado, com as pensões da Caixa Geral de Aposentações (CGA) foram gastos 9.653 milhões de euros com 160 mil pensionistas e 483 mil aposentados.

Ajuda alimentar europeia chega a 60 mil carenciados a partir do 2.º semestre

Na primeira fase da audição de José António Vieira da Silva, o ministro foi confrontado com a não execução do Fundo Europeu de Auxílio às Pessoas Mais Carenciadas em 2016 — uma decisão que mereceu críticas dos vários partidos com assento parlamentar e de organizações como o Banco Alimentar Contra a Fome.

O socialista acabaria por anunciar que o programa vai estar operacional no segundo semestre do ano, com a distribuição mensal de um cabaz de alimentos a cerca de 60 mil beneficiários, tendo sido já dado o primeiro passo com a realização do concurso público para aquisição de alimentos, com um montante no valor de 35 milhões de euros por ano.

Sobre a não execução do fundo, Vieira da Silva explicou que o novo programa operacional exigia uma “definição mais rigorosa” do cabaz alimentar, dos beneficiários e das entidades parceiras deste processo.

Além disso, continuou o ministro, foi preciso criar um sistema de informação de raiz, exigido pela Comissão Europeia, que permita, entre outros aspetos, que “os processos de fiscalização europeus possam seguir todas as pistas desde aquisição dos alimentos até ao beneficiário final”.