“O Bosque dos Quincôncios”

Os actores que se estreiam a realizar costumam fazê-lo com alguma precaução, defendendo-se nos seus primeiros passos atrás da câmara com a adaptação de uma peça de teatro ou de uma obra literária maneirinha, um conto ou uma novela, ou então com uma história convencional. Tais cautelas não são para o actor francês Grégoire Leprince-Radiguet, que depois de entrar em filmes de realizadores como André Téchiné, Robert Guédigian ou Christophe Honoré, lança-se na realização de longas-metragens com este atrevido e desconcertante “O Bosque dos Quincôncios”, onde interpreta também o papel principal, o de um parisiense dividido entre duas mulheres, e escreve o argumento, parcialmente baseado em poemas seus.

O filme movimenta-se entre um registo prosaico e romanesco, e outro de recorte mais fantástico (o protagonista tem encontros com o Destino, figurado por um sem-abrigo e uma das mulheres lança-lhe uma maldição mágica), e é parcialmente falado em verso alexandrino, o que o torna “teatral” e artificial. “O Bosque dos Quincôncios” não é uma fita para todos os paladares, tem desequilíbrios e dá tropeções, mas também mostra ambição de desafiar rotinas e fazer diferente, deixando-nos curiosos em relação ao que Leprince-Radiguet fará a seguir, se pretender continuar a fazer filmes paralelamente a apenas interpretá-los.

“Silêncio”

Em “Silêncio”, o seu novo filme, e um projecto que tentava realizar há mais de 25 anos, Martin Scorsese instala-nos em cheio no meio da dor. Dor física, dor emocional, dor intelectual, dor espiritual. Estamos no Japão, em meados do século XVII e no auge das purgas anti-cristãs no país. Ao terem notícia de que o padre Ferreira, o seu mentor, terá abjurado da fé sob tortura extrema e a seguir convertido ao budismo e adoptado os costumes nipónicos, dois outros jesuítas portugueses, os padres Ferreira (Adam Garfield) e Garrupe (Adam Driver), recusam-se a acreditar nisto e conseguem autorização do seu superior para viajarem clandestinamente até ao Japão e saberem o que aconteceu na realidade.

Uma vez lá chegados, os dois jovens jesuítas são testemunhas da implacável perseguição e dos tremendos suplícios infligidos quer aos missionários portugueses, quer às populações convertidas. E vão ver a sua fé posta à prova de uma forma, e com uma violência, como nunca ambos imaginaram. O filme adapta o romance homónimo do escritor japonês católico Shushaku Endo, já filmado em 1971, com o mesmo título, por Masahiro Shinoda, e que em 1996 inspirou “Os Olhos da Ásia”, do português João Mário Grilo. “Silêncio” foi escolhido pelo Observador como filme da semana, e pode ler a crítica aqui.

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