Por trás de um grande look, está um grande stylist. E por trás do vestido azul Stella McCartney usado por Sara Sampaio no Festival de Cannes, está Nelly de Melo Gonçalves. Uma lusodescendente que, para além de ocupar o cargo de editora de moda na Dsection Magazine, é personal stylist de Raquel Strada e já trabalhou com a modelo Maria Clara e com Cristiano Ronaldo. “Um stylist é um profissional que cria uma imagem e trabalha, por exemplo, em produções de moda, desfiles, campanhas ou a conceber a imagem de um cliente”, explica Nelly de Melo Gonçalves ao Observador. Que é como quem diz que tanto intervém pontualmente em determinados eventos como promove uma alteração geral da imagem.

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Nelly de Melo Gonçalves vive em Paris e é freelancer stylist e coordenadora de bastidores e desfiles de grandes marcas internacionais em Milão e Paris. (foto: Gonçalo Silva)

Quem folheia o seu portfólio (perdão, Tumblr) irá encontrar o cobiçado vestido laranja Zuhair Murad de Cláudia Vieira e o Ermanno Scervino de Maria Clara nos Globos de Ouro. “Para vestir uma pessoa, primeiro tens de ter em conta a personalidade e quais são as cores e as partes do corpo de que não gosta”, admite Nelly de Melo Gonçalves. “O mais importante não é a silhueta nem a cor. É a personalidade da pessoa. Se ela não se sentir confortável, não fiz um bom trabalho”. No entanto, não dispensa uns bons sapatos e casaco — “pequenas coisas que dão valor à silhueta”.

Trabalha como stylist freelancer há cerca de seis anos mas também é coordenadora de bastidores e desfiles de grandes marcas internacionais em Milão e Paris. Como vive na capital francesa, entra em contacto direto com as marcas para pedir roupa emprestada e aprovação para vestir celebridades portuguesas. “No meu trabalho ando sempre a competir contra o tempo por isso tento antecipar e pesquisar os looks o mais cedo possível”, diz. “Especialmente na altura das semanas de moda em que as marcas e showrooms estão ocupadas com a organização dos desfiles e das festas.” De seguida, envia sugestões às clientes para pedir feedback até o resultado final pisar uma passadeira vermelha e ser fotografado.

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Cláudia Vieira em Zuhair Murad, Sara Sampaio em Stella McCartney e Maria Clara em Versace, vestidas por Nelly de Melo Gonçalves. (foto: Globos de Ouro/Getty Images/GQ)

Qual é a diferença entre um stylist e um personal stylist?

“O stylist profissional atua em várias áreas e de várias maneiras. Pode, por exemplo, trabalhar em fotografia e produções de moda, em desfiles ou na conceção de campanhas comerciais para marcas”, escreve Gabriela Pinheiro n’O Meu Livro de Estilo. “A função do personal stylist é diferente. O seu objetivo é vestir pessoas e o método não é o mesmo. O personal stylist pode conceber para o seu cliente uma alteração de imagem geral, que pode envolver mudanças de cabelo, dietas, cursos de automaquilhagem e até alterações de comportamento social. Este é um processo mais completo, total. Noutros casos, o stylist pode apenas intervir pontualmente, atuando em determinados eventos ou momentos em que é solicitado para compor a imagem do seu cliente.”

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Gabriela Pinheiro é “personal stylist” de diversas celebridades como Cláudia Vieira, Diana Chaves, Daniela Ruah, Júlia Pinheiro, Fátima Lopes e Sara Matos. (foto: Divulgação)

Atualmente, Gabriela Pinheiro — Gabi para os amigos — colabora como produtora de moda para a revista Activa e destaca-se de nomes como Joyce Doret (stylist de Cristina Ferreira) por estar em constante evolução num mercado tão competitivo. Abusa dos básicos, brinca com tendências e trabalha junto de celebridades que têm de manter uma imagem atual, segura e diferenciadora ao longo da sua carreira. São elas Cláudia Vieira, Diana Chaves, Daniela Ruah, Sofia Carvalho, Nayma Mingas, Sofia Cerveira e Júlia Pinheiro. “A verdade é que nunca desejei, objetivamente, ser stylist. Nunca foi uma coisa programada, foi mesmo natural em mim”, contou no passado mês de outubro ao Observador.

Paralelamente, é também responsável de guarda-roupa em programas de televisão como o Got Talent Portugal, em campanhas publicitárias e em catálogos de moda. “Nunca quis ser estilista, no sentido de desenhar e confecionar roupa. Aquilo que sempre me interessou foi a imagem como um todo. O desafio, a construção, o chegar lá. Interpretar o que o cliente procura e dar-lhe o visual com que sempre sonhou. Pôr a máquina toda a funcionar, criar uma imagem espetacular.” Daí que seja uma das stylists com mais renome a nível nacional, ora pelo estilo simples e prático de Cláudia Vieira, ora pelo visual descontraído e fiel de Diana Chaves.

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Sara Matos, Júlia Pinheiro e Cláudia Vieira em Carolina Herrera, vestidas por Gabriela Pinheiro. (foto: Globos de Ouro)

O panorama português

Em comparação com o estrangeiro, o mundo do styling funciona de forma diferente em Portugal — especialmente no que toca ao empréstimo de roupa. Stylists portugueses como Daniel Baptista Ribeiro não entram em contacto direto com as marcas mas com as agências de comunicação que os representam a nível nacional. “O mercado português é pequeno (basta comparar com Espanha, por exemplo) e estamos sempre limitados às peças que chegam aos showrooms“, diz o jovem de 24 anos que, desde os 18, luta pelo reconhecimento como stylist. Começou a tirar um curso com Pedro Crispim e hoje veste Vanessa Martins com as tendências que a elevaram a ícone de estilo graças ao Frederica. Trabalha igualmente como editor de moda da revista PARQ, é stylist na empresa Farfetch e, em fevereiro, terá uma rubrica no Porto Canal de mudanças de visuais.

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Daniel Baptista Ribeiro tem 24 anos e luta pelo reconhecimento como stylist desde os 18, idade em que deu os primeiros passos na moda. (foto: António Medeiros)

“No início foi muito complicado porque tinha acabado de sair do curso e não tinha experiência”, admite em entrevista. Daí até ter uma boa base de contactos e criar uma relação de cumplicidade com os showrooms foi um processo gradual. O grande salto na carreira deu-o em 2016, nos Globos de Ouro, quando vestiu Sara Matos em BCBG Maxazria e Liliana Santos em Luís Carvalho. “Na altura, não estava 1oo% confiante na minha escolha e o vestido branco da Sara Matos acabou por ser um dos mais falados da noite.” No portfólio jovem e vanguardista, conta ainda com outros nomes como Marta Faial (nos GQ Men of the Year Awards, na semifinal dos Emmy e na ModaLisboa) e Daniela Ruah (nos prémios Sophia).

Já dei por mim a ajustar uma bainha Dolce & Gabanna à mão duas horas antes do vestido pisar uma passadeira vermelha mas faz parte da profissão e adoro”, explica o personal stylist de 24 anos.

Mas afinal, o que é ser stylist? “Pode não ter uma tradução literal em português mas ser stylist é ser um criador de sonhos que concebe a imagem que as pessoas querem ter. É um desafio. Tens de adaptar uma peça ao corpo de uma pessoa, à sua personalidade e ao que o público espera dela”, afirma Daniel Baptista Ribeiro. A inspiração, essa, encontra-a em blogues de moda, stylists internacionais, redes sociais como o Instagram e em revistas de moda onde gasta mais dinheiro do que gosta de admitir. E o que é mais importante na escolha de um coordenado? “A silhueta, o impacto que vai causar e se acrescenta alguma coisa de novo, ou não, ao que já está visto”. Sempre respondendo às necessidades dos clientes e combatendo as falhas na sua imagem.

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Sara Matos em BCBG Maxazria, Vanessa Martins em Miguel Vieira e Liliana Santos em Luís Carvalho, vestidas por Daniel Baptista Ribeiro. (foto: Divulgação)

Fora raras exceções de celebridades que se vestem a eles próprios — o modelo Luis Borges, por exemplo, que ainda assume o papel de stylist das atrizes Ana Sofia Martins e Kelly Bailey — os famosos precisam de ajuda para se vestirem em galas ou eventos como a Semana de Moda de Lisboa. Em média, um personal stylist pode ganhar entre 75€ a 250€ consoante o tipo de dress code (casual ou formal) mas precisa de, pelo menos, três dias de trabalho entre escolher os looks, o shopping, fazer o fitting e devolução. “É uma profissão subvalorizada até porque grande parte das pessoas nem faz ideia que as suas estrelas favoritas precisam de ajuda para se vestir”, confessa Daniel Baptista Ribeiro. “Ainda assim o mercado fica, por vezes, inflacionado e há sempre quem faça mais barato e desvalorize o nosso trabalho. É cada um por si.”

Artigo atualizado às 20h38 do dia 23.01.17.