A primeira-ministra britânica, Theresa May, tem ou não autoridade para entregar os papéis do divórcio da União Europeia sem consultar o parlamento? Um painel de 11 juízes do Supremo Tribunal anuncia esta terça-feira uma decisão crucial para o processo que deverá levar o Reino Unido para fora do bloco europeu, podendo atrasar os trabalhos que o governo quer iniciar até março. A expectativa é de que a decisão, conhecida pelas 9h30, irá no sentido de obrigar o Parlamento a pronunciar-se, o que é um revés para a primeira-ministra britânica.

A argumentação do governo é que o referendo de 23 de junho, não sendo vinculativo, foi convocado pelo parlamento, portanto o resultado tem validade parlamentar. Em rigor, a intenção de Theresa May é utilizar o que se chama “prerrogativa real“, uma figura herdada pelo governo e que pertencia à família real. Em causa está a ativação do Artigo 50 do Tratado de Lisboa, o que lança formalmente as negociações para o Brexit e determina que essas negociações têm de terminar no prazo de dois anos, período após o qual o país abandonará a União Europeia.

Uma maioria de juízes do Supremo Tribunal deverá, contudo, colocar alguma areia na engrenagem de Theresa May, que na semana passada traçou as suas condições para a negociação com os outros países europeus — dizendo que prefere que não se chegue a qualquer acordo do que se obtenha um mau acordo para o Reino Unido. Theresa May não quer levar a ativação do Artigo 50 ao parlamento mas prometeu que, uma vez concluídas as negociações, May admite submeter o acordo a votação dos deputados— não sendo claro o que é que isso poderia significar, em caso de chumbo, porque o processo de saída da UE é, em teoria, irreversível uma vez ativado o Artigo 50.

A decisão será anunciada pelo presidente deste tribunal, o Lord Neuberger, às 9h30, uma declaração curta que será transmitida pelas televisões britânicas. Pelas 9h35, a decisão será publicada na íntegra neste website.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Caso os juízes bloqueiem a ativação do Artigo 50 através de “prerrogativa real”, o Supremo Tribunal dará algumas indicações sobre o cariz da legislação que terá de ser formulada e submetida à votação do parlamento. Segundo o The Guardian, Theresa May está a ser aconselhada por juristas a não optar por responder ao chumbo do Tribunal com uma proposta legislativa simples, algo que poderia facilitar a aprovação parlamentar — quanto mais detalhada for a legislação, maior será o risco de uma votação desfavorável. Mas May está a ser aconselhada a não ir por essa via, porque a estratégia poderá revelar-se contraproducente mais à frente. E todo o plano que apresentou no discurso da semana passada pode estar em risco.

Já houve, em novembro, uma decisão no sentido de obrigar Theresa May a consultar os deputados britânicos antes de ativar o Artigo 50. A decisão foi dos High Courts of Justice de Londres, mas o governo recorreu, como se esperava, para o Supremo Tribunal. Para uma decisão tão importante quanto esta, foi convocado um painel de 11 juízes, algo inédito desde que o organismo foi criado — normalmente, as decisões são tomadas por painéis de cinco ou sete pessoas (sempre um número ímpar).

O caso começou com uma queixa apresentada por um grupo de pessoas, lideradas por uma gestora de investimentos chamada Gina Miller, que defendiam que ficarão em causa direitos fundamentais atribuídos por uma lei de 1972 que prevê a liberdade de pessoas e serviços em toda a Europa. Daí que, na opinião destes, o governo não pode ativar unilateralmente o processo porque isso obrigaria à revogação automática de leis, sem que o parlamento pudesse ter algo a dizer.

O Observador entrevistou Gina Miller, a mulher que quer travar o Brexit, um trabalho publicado no dia 16 de janeiro. A gestora de investimentos diz ter recebido várias ameaças de morte devido ao seu papel importante neste processo.