Não se pode falar de “tempestade”, antes de uma “depressão que vem do norte do oceano Atlântico e que provoca ondulações frontais” em grande parte da costa, atingindo Portugal, à beira-mar plantado, em cheio. Pode não ser uma tempestade, no sentido meteorológico do termo, mas desde que chegou esta noite, vinda do norte em direção à Península Ibérica, e até ao início da próxima semana, pode mesmo assemelhar-se a uma. As ondas deverão ter em média 8 metros de altura, mas podem chegar aos 14; as rajadas de vento podem atingir os 120km/h; e a chuva, que não será ininterrupta, promete não dar descanso durante as duas próximas noites. Não é uma tempestade, não, mas até já lhe deram um nome: Dóris.

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Veio pela noite e durante a manhã deu tréguas, mas está tudo a postos para o período mais crítico: entre as 15h00 e a meia noite desta quinta-feira o Instituto português do Mar e Atmosfera (IPMA) pôs todos os distritos a norte do Cabo da Roca, de Lisboa ao Porto, passando por Braga, Aveiro, Coimbra, Leiria e Viana do Castelo em alerta vermelho, o máximo da escala. “O pior período está para começar”, explicou ao Observador o meteorologista Bruno Café, do IPMA, destacando que a praia-mar (maré alta) é as 18h esta quinta-feira, pelo que a essa hora será o ponto mais alto da ondulação, que aliada ao vento e à chuva pode causar estragos.

“Pode haver constrangimentos na costa ocidental”, diz o meteorologista, referindo-se a estragos ao nível dos bares de praia, dos paredões, passeios marítimos ou zonas de estacionamento junto à costa. As ondas, diz, deverão ter em média 7 a 8 metros de altitude, podendo chegar aos 14; enquanto as rajadas de vento podem chegar aos 120km/h nas zonas altas e aos 100km/h no litoral. Mas “o impacto sobre a costa depende do que acontece na altura da praia-mar”, prevista para o final da tarde. Essa será a hora crítica. Para já, a Proteção Civil garante ao Observador que ainda não há “ocorrências significativas”, apesar de ao início da tarde haver cerca de 60 ocorrências ligeiras registadas.

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Não é uma tempestade, é certo, mas o IPMA não hesita em comparar a atual situação meteorológica à chamada tempestade “Hércules”, que em janeiro de 2014, provocou estragos em vários pontos do país, junto à costa, devido precisamente à intensa agitação marítima. Os estragos materiais, entre estragos nos paredões, passeios, estradas e estacionamentos, assim como os estragos ao nível da erosão de praias e dunas, foram avaliados na altura pelo Governo em cerca de 21 milhões de euros de prejuízo.

Foi essa indicação que o IPMA deu inclusivamente à Proteção Civil, segundo conta ao Observador Marco Martins, adjunto de operações nacionais da Autoridade Nacional da Proteção Civil. “Tivemos ainda agora uma reunião com o IPMA que fez essa comparação, com a diferença de que desta vez é mais intercalar e não tão persistente”, diz. As semelhanças com a tempestade Hércules são evidentes: “são núcleos depressionários que veem do norte do Atlântico e que passam de oeste para este provocando ondulações fortes”, explica o meteorologista, acrescentando que o vento se junta à equação, produzindo uma mistura mais explosiva. “A passagem destes sistemas frontais leva a rajadas fortes de vento, não constantes, que se mantém pelo menos até sábado. Enquanto se mantiver esta situação haverá ondas bastante elevadas a atingir a costa”, continua.

Em 2014 foi assim:

A diferença face à tempestade Hércules do início de 2014 é que, nessa altura, a situação de baixa pressão manteve-se de forma persistente durante mais tempo, merecendo por isso o título de tempestade. Apesar de o alerta vermelho ser apenas até à meia-noite desta quinta-feira, o IPMA garante que “o período de maior agitação marítima, vento e chuva é até sábado”. A chuva não será persistente, devendo oscilar entre aguaceiros, mas o período de maior intensidade será precisamente a noite desta quinta-feira e a manhã de sexta, bem como entre o final da tarde de sexta e a manhã de sábado. E sobretudo no norte e centro-norte do país. Aveiro, Braga e Viana do Castelo são os distritos onde o alarme está mais apurado.

Passado o alerta vermelho, que fica até à meia-noite desta quinta-feira, a costa portuguesa fica em alerta laranja até às 6h da manhã de sábado, passando depois para aviso amarelo pelo menos até ao resto do fim de semana e início da próxima semana. O mau tempo chegou a Portugal continental esta noite vindo dos Açores, mas passou no arquipélago sem estragos de maior. Resta saber como vai ser a passagem pela zona costeira continental.

Não circular, não estacionar, não pescar, não surfar….

A Proteção Civil não registou, até ao início da tarde, “ocorrências significativas”, mas o estado de alerta é máximo. Durante a noite, segundo Marco Martins, adjunto de operações nacionais, registaram-se cerca de 60 ocorrências devido ao mau tempo, mas tudo situações ligeiras. “A maior agitação marítima foi durante a noite e a próxima será ao final da tarde/noite desta quinta-feira, e à noite as pessoas não se expõem tanto ao risco”, diz ao Observador.

Reforçando que as ocorrências registadas são “muito comuns”, associadas a “pequenas inundações”, a Proteção Civil está alerta para os avisos de agravamento do estado do tempo para “o final da tarde”. E deixa conselhos à população:

  • Não circular junto à orla costeira;
  • Não estacionar o carro junto ao mar;
  • Não praticar qualquer atividade desportiva relacionada com mar, desde pesca a desportos aquáticos;
  • Garantir o bom escoamento das águas, desobstruindo as vias e os esgotos, para o caso de cheias;
  • Conduzir sempre de forma defensiva devido aos lençóis de água nas vias;
  • Ter especial atenção às estruturas soltas, como andaimes e placards, devido ao vento forte;
  • Evitar zonas muito arborizadas nos períodos de maior ventania.

Condicionamentos e cuidados em todo o país

O aviso vermelho estende-se de Lisboa aos distritos de Viana do Castelo, Braga, Porto, Aveiro, Leiria e Coimbra. Mas os condicionamentos não ficam por aí. Segundo disse o comandante da Capitania, Marco Augusto, à agência Lusa, os acessos ao Cabo Carvoeiro e à praia do Portinho da Areia Sul passaram a estar também condicionados. E em Peniche, também o acesso de pessoas e viaturas aos molhes Leste (junto à praia dos Supertubos) e Oeste (junto à marina) se mantém condicionado.

A Proteção Civil Municipal decidiu ainda colocar “barreiras físicas” para proteção dos bares nas praias do Molhe Leste e do Baleal e condicionar o acesso à praia de Peniche de Cima, à entrada da cidade, disse o presidente da câmara, António José Correia. Nas Caldas da Rainha, o passeio marítimo e a marginal da Foz do Arelho vão estar fechados à circulação de pessoas e viaturas, assim como o acesso ao paredão da Praia da Areia Branca (Lourinhã).

Na Lourinhã, a Proteção Civil Municipal decidiu também interditar o estacionamento da praia local de Porto Dinheiro. Em função do estado do mar, a Autoridade Marítima pode vir ainda a restringir o acesso à ilha do Baleal, fechar a marginal norte, em Peniche, e o passeio marítimo de Santa Cruz (Torres Vedras).

O norte do país registava, ao final da manhã, ondas com oito metros de altura em Leixões e Matosinhos, mas nenhuma situação preocupante. Em declarações à agência Lusa, o comandante da Zona Marítima do Norte e chefe do Departamento Marítimo do Norte, Rodrigues Campos, afirmou que até ao momento não há conhecimento de nenhuma situação “merecedora de maior cuidado” e alertou para se evitarem aproximações das zonas da orla costeira.

Segundo Rodrigues Campos, as ondas gigantes que se esperam proporcionam “imagens espetaculares” e de” vídeos muito interessantes para colocar nas redes sociais”, mas, avisa, colocam os seus autores em “risco desnecessário”. Neste momento, na zona Norte estão vários meios “prontos e em ação”, designadamente embarcações do Instituto de Socorros a Náufragos, e meios da Polícia Marítima na água e por terra.

Fonte da Câmara do Porto adiantou à Lusa que a avenida D. Carlos e rua Coronel Raúl Peres foram cortadas ao trânsito devido à forte ondulação prevista e que o corte das duas estradas vai manter-se até ao final do dia de sexta-feira, estando os serviços da Proteção Civil acionados em “toda a zona costeira”, com patrulhamentos, por exemplo, junto ao Farol.

A Câmara de Matosinhos, por seu turno, decidiu esta manhã mandar cortar a circulação pedonal nos passadiços desde a zona da Boa Nova até Angeiras, incluindo a Ponte Pedonal da Conchinha, avançou fonte do gabinete de imprensa da autarquia.

Em Vila Nova de Gaia fonte das relações públicas informou que há equipas de bombeiros nos locais mais críticos, designadamente em Granja, Valadares e Lavradores desde as 11h00 de hoje, mas acrescenta que não foi registada nenhuma situação grave.