Há futebóis com a energia de uma dezena de gremlins: não páram quietos, correm de um lado para o outro, atiram-se à bola como se não houvesse amanhã, esbarram contra tudo e mais alguma coisa, surpreendem-nos, inspiram-nos. É a Premier League no seu habitual? Sim, é. E, já agora, é também o clássico Porto-Sporting. Ufffff, que partidazo. Assim-assim na primeira parte, eléctrico na segunda, com uma belíssima resposta do Sporting à entrada de leão (salvo seja) do Porto. Tanto um como outro surpreendem no onze: Jesus aposta em Matheus, com tão-só um minuto de utilização em toda a época, precisamente no sábado passado, vs Paços, em Alvalade; Nuno acredita em Soares, reforço de Inverno via-Vitória SC, mais os extremos Brahimi e Corona. Uyyyyyy, espectáculo. Vamos lá cambada, todos à molhada, qu’isto é futebol tooooootaaal.

Antes de mais, o Porto é superior ao Sporting em toda a linha: mais pontos (44-38), mais vitórias (13-11), menos derrotas (1-3), mais golos marcadores (37-35) e menos sofridos (10-20). Os primeiros minutos de jogo evidenciam em absoluto essa superioridade. O Porto agiganta-se, o Sporting encolhe-se. Aos seis minutos, Corona dança à frente de Marvin antes de cruzar para o segundo poste, onde Soares se desmarca de Palhinha (ou será o contrário?) e cabeceia sem hipótese para Patrício. É o 1-0. O primeiro no Porto aos 6′ desde aquele de Boavida em Abril 1947.

A reacção do Sporting é ineficaz, sem incomodar minimamente Casillas. À direita, Schelotto e Gelson tentam (só isso) atrapalhar a defesa contrária. Em vão. Dos outros nove, ni hablar. O Porto defende bem, com o capitão Marcano a dar uma de patrão aos laterais Maxi e Alex. Lá à frente, Danilo controla Adrien com os olhos e não só. Aos 40′, Danilo ganha uma bola solta no seu meio-campo e desmarca Soares de forma sensacional, pelo meio dos centrais Coates e Rúben Semedo. O avançado dá um toque para avançar, um outro para passar por Patrício e ainda só mais um para empurrar a bola rumo à baliza deserta. Bis de Soares, natural do Natal. Isso mesmo, o Natal do Sporting é este aqui ò: Franciso das Chagas Soares dos Santos. Curiosidade maiúscula, o último número 29 do FCP a bisar é um tal Deco, em 1999, vs. Ribeira Brava. E o último 29 a marcar aos pares em casa? Deco, de novo. Em 1999, again. Com o Molde, para a Liga dos Campeões. Já chega? Calma, só um toque sobre Palhinha: o mais eficaz em campo, com seis cortes de cabeça e 10 duelos ganhos a Danilo em 12. Fechado? Só mais isto, Soares tem mais remates que todo o Sporting (3-2) e Casillas toca mais vezes na bola que Bas Dost (13-12). Agora sim, vamos mazé para intervalo. Está 2-0 e isto, atenção, acontece pela primeira vez desde Março 1990 (golos de Demol e Branco).

O Sporting começa a segunda parte cheio de vontade, com Alan Ruiz a entrar por Matheus (é dele o único remate digno desse nome, aos 18′, por cima; antes, toca pela primeira vez na bola aos 13′, já depois do 1-0, e vê o primeiro cartão amarelo do jogo, aos 18′). Significa isto, Bryan deixa de jogar nas costas de Bas Dost e passa a pasta a Alan. A agressividade do argentino é notória aos 18 segundos, com uma falta como que a dizer presente. Presente, presente e mais presente. Com qualidade e nervo, o Sporting agiganta-se. O Porto encolhe-se e o jogo passa de quase ganho a tremido. Bryan obriga Casillas a defesa tremida (49′) e Adrien acerta na parte de cima da trave (57′) antes do pontapé de Alan Ruiz, numa jogada de Gelson pela direita e amortie de Bas Dost para a entrada da área. Casillas deixa escapar a bola e o clássico ganha um outro élan.

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Olá se ganha. Nuno responde com as entradas de André André e Diogo Jota para os lugares de André Silva (importante no 1-0 com o passe de cabeça para Corona, descaída na direita) e Brahimi (brinca na areia, sem um único drible sem sucedido em seis) (atenção à novidade: Brahimi é substituído e, hip hip huraaaay, cumprimenta Nuno. O Porto reequilibra-se. Pouco, verdade seja dita. Soares começa a ganhar faltas inexistentes lá à frente e, à excepção disso, não há meio-campo. O reflexo disso é uma aventura de Diogo Jota pela direita, cortada in extremis por Rúben Semedo. A bola sobra para a zona de ninguém, a câmara acompanha-a demoradamente e não há um único portista naquele perímetro. Nem um sequer. Só dá Sporting. O respectivo contra-ataque de Gelson perde-se em Adrien. Adiante, fica a ideia de um Porto partido. Da ideia à confirmação, Patrício nem se vê. Só a marcar livres e joga como Neuer, bem fora da área.

Nos últimos dez minutos, o Sporting atira-se à baliza de Casillas. O espanhol responde com galhardia às duas entradas de Coates. Primeiro, aos 82′. Depois, aos 90’+3. Tanto um lance como outro, aquilo é golo. Sim, Casillas salva um golo. Dois, vá. Daí que os adeptos portistas vibrem ruidosamente com as defesas. A última delas é do outro planeta. O Dragão silencia-se por breves milésimos de segundo e até dá para ouvir a palmada na bola. Casillas, o dragão da estrela. Grande jogo e vitória justa pela entrada do Porto – o Sporting acumula a 11.ª derrota da época e nunca, em circunstância alguma, poderia ter entrado daquela forma sob pena de evitar o adeus prematuro ao título (e, quem sabe, ao segundo lugar? Nove pontos é muito). Amanhã há mais, com o agora segundo classificado benfica, a dois pontos do FCP, na recepção ao penúltimo classificado Nacional. Que seja mais um jogo cheio de gremlins.

Estádio do Dragão, no Porto
Árbitro: Hugo Miguel (Lisboa)
PORTO: Casillas; Maxi, Felipe, Marcano e Alex Telles; Danilo; Corona (João Teixeira, 83′), Óliver e Brahimi (Diogo Jota, 70′); Soares e André Silva (André André. 64′)
Treinador: Nuno Espírito Santo (português)
SPORTING: Patrício; Schelotto, Coates, Rúben e Marvin (Esgaio, 58′); Palhinha (Podence, 80′); Gelson, Adrien e Matheus (Alan Ruiz, 46′); Bryan Ruiz e Bas Dost
Treinador: Jorge Jesus (português)
Marcadores: 1-0, Soares (6′); 2-0, Soares (40′); 2-1, Alan Ruiz (60′)