O primeiro Benefício nasceu a 31 de outubro — uma garrafa de azeite produzida artesanalmente na Herdade da Tapada da Tojeira. “Como se fazia há cem anos”, explicou Paulo Fernandes ao Observador. Em três meses, houve 56 garrafas que chegaram ao Reino Unido, Alemanha, Suíça, Bélgica, Suécia e Espanha. Custam 50 euros cada. E, apesar de iguais, são diferentes: cada consumidor que quiser comprar este #benefício pode escolher um número de série (por superstição ou não) e as palavras que quer ver no rótulo. A garrafa de Paulo nunca será igual à de Ricardo Nunes, por exemplo. E são os dois fundadores do projeto que quer ter uma escala certa: 100.

Mas vamos ao início. A história do Benefício começou porque Ricardo Nunes, 42 anos, utilizava “excessivamente” a hashtag (etiqueta) “benefício” para definir bons momentos que passava com a família e amigos.

“Sempre que estava numa situação boa com os meus amigos, num jantar ou no dia a dia, ilustrava-a nas redes sociais com uma fotografia, acompanhada pela #benefício”, conta o cofundador do projeto.

O uso começou a ser tão recorrente que as pessoas lhe diziam que reconheciam a palavra já quase “como uma marca”. E assim foi. Ricardo registou o nome como uma marca, mas a ideia de criar um negócio a partir dali acabou por “ficar na gaveta durante muito tempo”. Até 21 de abril de 2015, data em que Ricardo e Paulo decidiram criar a empresa que quer desenvolver produtos de alto valor acrescentado, através de uma produção que é limitada, colocando apenas no mercado 100 unidades do produto que é desenvolvido. E que utiliza métodos artesanais na produção dos seus artigos — são assentes no respeito pelo comércio justo e pelo ambiente e devem causar impacto positivo na economia e no talento local.

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O produto pode ser personalizado para cada cliente, fazendo frente à ideia de que “tudo é feito em grande escala e de que todas as coisas são sempre esmagadas pelo preço e pela capacidade de produção, através do desconto”, explica Ricardo Nunes.

“Os produtos não vão salvar o mundo. Mas a forma como são produzidos pode trazer mais regalias tanto às populações locais como ao pequeno comércio, aos pequenos artistas, que não conseguem sobreviver num mercado global se não tiverem uma escala global. E esse é o nosso fator de diferenciação. Apresentamos-lhes uma plataforma de comunicação global, assim como uma plataforma de distribuição do produto nos mercados mais competitivos”, explica Ricardo.

Como transformar uma hashtag num negócio?

“A ideia cresceu a partir de valores que já partilhávamos antes em relação à forma de estar, como tratar e estar perante as pessoas, perante o mundo”, conta Paulo Fernandes, 44 anos, que está neste momento dedicado a tempo inteiro ao projeto.

A experiência como profissionais na área da publicidade fê-los acreditar que havia um nicho de mercado que pensava como eles. A primeira entidade que se juntou ao projeto foi a Lavandaria, oficina de serigrafia, que ficou responsável por tratar do processo manual da rotulagem das garrafas de azeite. Falaram depois com “pessoas de talento”, como designers, programadores, artistas visuais, artistas conceptuais.

“Começámos a perceber que o problema da sociedade moderna, do capitalismo mais intensivo, era a exploração total do talento das pessoas. E isso causa um problema a quem tem talento porque está sempre com uma pressão constante de produzir ao mais alto nível”, salienta Ricardo Nunes.

Depois de um “quase debate filosófico” entre ideias e economia, os empreendedores definiram que o Benefício ia funcionar como um modelo de co-criação entre micro e pequenas empresas. E que assenta na “partilha de negócio e não na partilha de capital”, pondo “à consideração dos produtores e criadores a participação intrínseca na construção do preço e na venda”, explica Ricardo.

“A maior parte das empresas gosta de contratar, de juntar pessoas com talento para ter o talento na casa. Nós achamos o contrário. O talento deve ser livre e deve juntar-se aos projetos”, acrescenta.

Estão, por isso, abertos a qualquer tipo de projeto que os “desafie”, ao ponto de, por exemplo, “hoje estar a fazer azeite e amanhã um carro”.

“Uma pessoa pode chegar ao pé de nós e dizer que tem uma ideia. Nós dizemos se é ou não possível executá-la. Pretendemos que as pessoas entreguem o produto ou o protótipo e, em conjunto, fazemos um plano de negócio para ver se é viável produzir as cem unidades. Se forem todas vendidas, o produtor (criador, artista) já tem um beta testing num determinado nicho de mercado”, considera o cofundador do projeto.

Como a produção é limitada, os fundadores do Benefício acreditam que a escala da empresa será feita pela multiplicidade de produtos.

“Queremos ser uma editora que mete no mercado global tudo o que for diferenciador. A maior parte dessas pessoas têm um talento imenso, uma criatividade acima da média, mas não são pessoas que se coadunam com a burocracia de criar uma marca, de fazer uma estrutura de distribuição. Têm outro tipo de capacidades e, muitas vezes, há projetos que ficam na gaveta por isso mesmo”, explica Ricardo.

O primeiro produto, a garrafa de azeite, foi lançado no final de outubro. Teve origem numa herdade do Geopark Naturtejo, a partir de um processo “inteiramente tradicional, como se fazia há cem anos, com a apanha da azeitona feita à mão, numa exploração certificada como fair trade [comércio justo]”, explica Paulo Fernandes. A venda é feita exclusivamente online no website do Benefício.

A embalagem é manufaturada, com uma impressão em serigrafia tradicional e manual, lacrada, com personalização e marcação de número de série para cada cliente

O desenvolvimento da garrafa de azeite envolveu 12 entidades, com o apoio da Startup Lisboa (onde o projeto está incubado) e do Parque Tecnológico de Óbidos (onde está a sede), num investimento total de cerca de 10 mil euros, em capitais próprios.

Chegar às 2.500 unidades em 2017

A segunda edição do Benefício será lançada daqui a dois meses. O produto que está a ser desenvolvido ainda não foi revelado mas está a ser elaborado a partir de uma “tripla parceria”.

Em fevereiro, os empreendedores querem começar a internacionalização total da marca. “Agora que o conceito, o produto e o sistema de distribuição já estão validados, achamos que é a altura correta de avançar para outros mercados”, admite Ricardo.

Para 2017, a startup tem como meta fazer 25 edições do Benefício, ou seja, colocar no mercado 2.500 unidades “do melhor talento”, nota Ricardo. E dos “melhores produtos, remata Paulo.

*Tive uma ideia! é uma rubrica do Observador destinada a novos negócios com ADN português.