Ponto prévio para se perceber o primeiro e único debate entre os dois candidatos à presidência do Sporting. Imagine que equipa B ganhou à equipa A em casa sem sofrer golos na primeira mão da eliminatória e este é o momento onde se joga o segundo jogo: a equipa A, apertada pela desvantagem no marcador, ia com jogadas preparadas para atacar as fragilidades do adversário e poder igualar a eliminatória e passar para a frente, ao passo que à equipa B bastaria apenas controlar as investidas do opositor porque o resultado estava a seu favor. Agora troque-se equipa A por lista A, de Pedro Madeira Rodrigues; equipa B por lista B, de Bruno de Carvalho; e primeira mão da eliminatória por realidade do clube quatro anos depois do atual Conselho Diretivo ter tomado posse.

“Fizemos uma reestruturação financeira, dos serviços, com grande rigor e equilíbrio financeiro, contornámos o desinvestimento nas modalidades. Que olhem para os dois projetos, para os dois candidatos e livremente tomem uma decisão. O importante é que se mobilizem e mostrem a força desta grande instituição com as eleições mais concorridas de sempre a 4 de março. E que, no final, ganhe o Sporting”, começou por referir Bruno de Carvalho.

“Sinto na rua e onde vou que tenho vindo a convencer os sportinguistas através do meu projeto, que é um projeto para o futuro. Somos pessoas diferentes, temos dois projetos diferentes e vamos finalmente ter uma estrutura no futebol, algo que Jorge Jesus tantas vezes pediu”, disse Madeira Rodrigues na primeira intervenção. Que terminou com a primeira alfinetada. Ou, como se perceberia uma hora depois (e o debate ainda ia mais ou menos a meio), o lançamento de uma narrativa de ataques, contra-ataques, foras-de-jogo e poucas ideias.

Continuemos esta analogia do jogo de futebol. Durante a metade inicial da primeira parte, deu a clara ideia de que Madeira Rodrigues poderia superiorizar-se porque fez com que Bruno de Carvalho, ainda um pouco amorfo e sem ritmo, perdesse quase todo o tempo a rebater apenas o que dizia. “Tenho uma equipa coesa nos órgãos sociais mas também no futebol, que é aquilo que mais tem falhado. Hoje está tudo resumido a duas pessoas mas comigo, finalmente, vamos ter uma estrutura. No que toca à direção, destaco Vítor Ferreira, homem do futebol, que trabalhou na AF Coimbra e que vem colaborar numa área onde não estamos representados, que é nos centros de decisão; Rogério de Brito, fundamental na área dos núcleos que teve um excelente papel há uns anos; Mário Saldanha, um senhor do Sporting e do basquetebol que vai trazer a modalidade de volta; Pedro Rebelo Pinto, que estará na área financeira para que se termine esta deriva despesista; Rui Morgado, candidato à presidência da mesa da assembleia geral. Bruno de Carvalho teve a capacidade de trazer algumas pessoas boas mas não os conseguiu manter no clube”, atirou numa tentativa de marcar o primeiro golo – puxar das figuras dissidentes do atual elenco.

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“De facto há grandes diferenças de equipas, é verdade. Mantivemos a mesma equipa da direção, trouxemos para a AG uma pessoa que não era da nossa lista e juntámos membros de três listas no Conselho Fiscal. São pessoas com quatro anos de experiência e que se reveem no que tem sido feito. Ou seja, mostra agregação, não desagregação. Agora vamos aos nomes que enunciou: Vítor Ferreira foi afastado por unanimidade do clube e da SAD porque estava de facto afastado do futebol há 20 anos, mas como somos pessoas de bem deixámos que saísse por si; Mário Saldanha deixou de me falar quando troquei os lugares dos membros do Conselho Leonino por outros nos estádio que eram menos vendáveis; Rui Morgado teve desde o primeiro dia um comportamento na tribuna, por exemplo, que fazia com que parceiros e os próprios órgãos sociais se queixassem, pelas palavras venenosas. Acrescento mais uns – José Pedro Rodrigues, que teve um processo contra o Sporting onde reclamava 21 mil euros; Delfim, que tem um processo contra o Sporting porque se lembrou dez anos depois que teve uma lesão incapacitante. Olhe, em quatro anos saíram duas pessoas do meu elenco; do seu, em 15 dias, já saiu uma – apresentou Susana Cabral e afinal não aparece nas listas”, contra-argumentou Bruno de Carvalho, que vinha claramente preparado para abafar essa questão dos elementos dissidentes que se juntaram à lista de Pedro Madeira Rodrigues.

Pedro Madeira Rodrigues assumiu que Susana Cabral, “por uns meses, não podia fazer parte da candidatura” mas continua a trabalhar com a sua equipa. E acusou o toque, contra-atacando com algo que tocou no nervo do atual líder – os processos a sócios. “As pessoas que trabalharam consigo e estão na nossa lista é porque pensam pela sua cabeça, não são yes men. Custa-me que ofenda assim os sportinguistas como o Delfim, um grande campeão e profissional. Mas os sócios já estão habituados às ofensas e até a serem processados. Para si, tudo o que é anterior era tudo mau. Mas já agora, diga-me que se é verdade que André Geraldes, que só conhecemos das imagens dos vídeos com o presidente do Arouca, vai ser diretor desportivo? E quer comparar com um campeão como Bölöni?”, atirou o candidato da lista A. O jogo mudou a partir daqui. E o animal quase político que tinha dado nas vistas nos debates de 2011 (quando poucos o conheciam) e de 2013 acabou por soltar-se na altura da resposta.

“Foram três processos a sócios que diziam que bati em crianças, roubei etc. Foram coisas graves. Já percebi que está com uma estratégia clara de deixar dúvidas, aquelas coisas que ficam no ar… Muito bem. No futebol, que não está a correr este ano como queríamos, tirámos a equipa do sétimo lugar para segundo e no ano passado não fomos campeões por azar e outras coisas mas estamos no rumo certo. Olhe, fala do gestor de ativos. O meu, que sou eu, tem um lucro de 30,5 milhões de euros com os jogadores contratados que saíram entre 2013 e 2017 e colocou quatro vendas no top-10 das maiores de sempre do Sporting”, rebateu Bruno de Carvalho.

Cedo se percebeu que os 60 a 90 minutos de debate previstos iriam ser largamente ultrapassados porque estávamos com cerca de 40 minutos de debate e não se tinha ouvido uma única ideia de futuro para o Sporting. Aquele “vamos fazer assim e assado”. Chegava-se ao final, “ganhar”, sem se passar pelo meio. E isso favorecia mais quem tem de defender o que fez do que quem quer desafiar o que se deveria ter feito. Pedro Madeira Rodrigues garantiu a saída de Jorge Jesus acreditando que o técnico deixará o comando de livre vontade (“é uma saída limpinha, limpinha”, atirou), acusou o atual presidente de desestabilizar a equipa com “uma postura patética” em Chaves, onde percebeu o amadorismo que existe no estádio que os leões por lá realizaram e deixou a pergunta sobre Costa Aguiar, “que recebeu tanto dinheiro em comissões?”. Bruno de Carvalho começou a puxar das folhas das contas da SAD para dizer que o Sporting pagara apenas em média 3,94% em comissões nas transferências de jogadores, ou 2,7% sem contar com os jogadores livres; que conseguira um saldo positivo entre compras e vendas de 82 milhões de euros; e que as receitas tinham aumentado de forma exponencial, o que garantira o total equilíbrio das contas leoninas.

“Aquilo que peço é que os sócios do Sporting venham massivamente votar. Ficou claro que quem tem projeto é a lista B. Cada vez que acordo continuo a achar que está tudo por fazer, sou insatisfeito. E quero melhorar cada vez mais o Sporting, melhorando a união entre sportinguistas e esta onda verde. Vamos ter um Sporting no rumo certo, forte, sólido e que todos merecemos”, lançou Bruno de Carvalho no último minuto. “O próximo dia 4 de março será de grande sportinguismo, acredito que a nossa equipa vai merecer a confiança para querer voltar a trazer as vitórias para o Sporting e daí termos apresentado o último campeão, Bölöni. Queremos manter a maioria da SAD e tirar o Sporting do isolamento que existiu no futebol português”, rematou Pedro Madeira Rodrigues.

E falou-se, de forma pouco aprofundada, de modalidades. E repetiram-se os argumentos que já tinham sido falados por ambas as listas em termos financeiros (como o Observador dera nota na antevisão deste debate, esta manhã). Quase no final, Bruno de Carvalho fez um mea culpa: “Espero resguardar-me mais nos próximos quatro anos porque expus-me muito e isso prejudicou-me bastante”. Mas deixou de novo uma farpa para a falta de militância: “Espero que outros sportinguistas com poderes decisórios possam fazer o seu trabalho”. Pedro Madeira Rodrigues respondeu de forma brusca. “O sacrifício dessa exposição foi nosso, dos sportinguistas. Tive de sair de uma assembleia geral em que falava com um tom ordinário”, exclamou, voltando de novo a falar de José Maria Ricciardi como um nome com o qual não quer contar mais no Sporting.

No final, cada uma das listas considerou que o debate lhe correu bem. E que tinham cumprido os propósitos que estavam preparados. Admitamos que sim – a questão é que este foi uma espécie de segunda mão de uma eliminatória onde uma das equipas tinha apenas de segurar o resultado. Terá o opositor marcado os golos suficientes para anular a desvantagem? No final, Pedro Madeira Rodrigues considerou que sim. No dia 4 de março logo se verá.