Henrique Sá Pessoa está sentado numa das mesas do recém-aberto Tapisco quando ouve um cliente pedir um pisco sour. “Já não é a primeira vez. Eu sabia que isto podia acontecer”, conta o chefe, consciente de que o nome escolhido para o restaurante e a corrente fama do cocktail legitima o pedido. Acontece, porém, que não há pisco no Tapisco, cujo nome é uma aglutinação desprovida de teor alcoólico. “Estava a pensar em tapas, petiscos, tapas, petiscos, tapas, petiscos… surgiu-me tapisco”, recorda.

A bebida de eleição da casa é outra: o vermute, um clássico que os espanhóis converteram em tendência nos últimos anos. A aposta nessa importação foi decidida por Sá Pessoa e pelo sócio Rui Sanches [do grupo Multifood, com quem também tem parceria no Alma] depois de uma viagem em conjunto a Barcelona. “Passámos por várias vermuterias e percebemos o potencial que tinham.” Não se trata de imitar o que os outros fazem, assegura o anfitrião, mas sim aproveitar para “trazer coisas novas a Lisboa, algo que o Rui gosta de fazer em todos os seus projetos.” E seria um erro reduzir o Tapisco aos vermutes. Até porque, para já, há apenas seis disponíveis, a preços propositadamente baixos (entre os 4€ e os 6€), com o intuito de aguçar a curiosidade e a sede dos clientes.

Se 2016 acabou em beleza para Henrique Sá Pessoa, com uma estrela Michelin no Alma, 2017 não começa nada mal com este novo Tapisco. (foto: © Tiago Pais / Observador)

Tão ou mais importante do que se bebe é o que se come. As tais tapas e petiscos, sobretudo, num matrimónio que põe em causa a velha máxima que assegura que do lado de lá da fronteira nem bons ventos, nem bons casamentos. “É cozinha ibérica. Metade da carta é portuguesa, metade é espanhola”, assume o chefe, que conta com uma subchefe experimentada na matéria: Joana Duarte, que em Barcelona passou pelo Moo, dos irmãos Roca, e pelo Tapas 24 de Carles Abellan, que Sá Pessoa considera “o pai deste tipo de cozinha”.

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A ementa, que também serve de individual — o espaço é informal a esse ponto — divide-se em Tapiscos, Ovos, Brasas, Tachinhos e Sobremesas. O destaque vai, obviamente, para a primeira secção, onde tão depressa se encontram amêijoas à Bulhão Pato (17€) ou choco frito (12€) ” a baixa temperatura, muito cuidado, com uma tempura própria”, nas palavras do chefe, como patatas bravas (6€), croquetas de jamón (4€) ou a catalã esqueixada de bacalao (10€), tudo escrito assim mesmo, em castelhano, para se perceber a diferença na proveniência.

A esqueixada de bacalao, uma fresquíssima salada de bacalhau tipicamente catalã, é um dos tapiscos da ementa. (foto: © Tiago Pais / Observador)

Esta renascida união ibérica prevalece também nas restantes secções da carta. Os Ovos, por exemplo, tanto podem ser rotos con morcilla (11€) ou paletilla (12€), como mexidos com espargos (7€), ou chegar na forma de um bacalhau à Brás com gema confitada (14€). Apesar de estar incluída em Tachinhos, a paella negra (28€), que deve o nome à tinta de choco, podia, facilmente, constar em Tachões, se existisse tal coisa: é muito bem servida, dá para três a quatro pessoas, dependendo da fome. Também de Espanha chega o estofado de lentejas (lentilhas) con embutidos (enchidos) ibéricos (18€). Os nacionalistas mais convictos podem optar, neste caso, pelas ervilhas com chouriço de porco alentejano e ovo a baixa temperatura (16€) ou pela açorda de gambas (19€).

Presa de porco ibérico com pimentos padrón, um dos pratos que usa o Josper, um forno a carvão vegetal de origem espanhola. (foto: © Tiago Pais / Observador)

Convém, no entanto, esquecer as fronteiras — as gastronómicas, caros comentadores impulsivos — e partilhar de tudo um pouco. No Josper, um forno espanhol a carvão vegetal, cozinham-se as Brasas do menu: o bacalhau à lagareiro com batatinha assada (17€) e a presa de porco ibérico (21€) são duas das opções. Já as Sobremesas vão, como diz Henrique Sá Pessoa, “diretas ao assunto”. Se a crema catalana (5€) podia perfeitamente ser um leite-creme, já a mousse de turrón de Alicante (6€) só podia ser isso mesmo, apesar de surpreender pela leveza. No toucinho do céu com sorvete de tangerina (5€) e no sorvete de limão com espuma de vermute (5€) houve mão do chefe pasteleiro do Alma, Telmo Moutinho, também conhecido nas lides televisivas pelo recente papel de jurado em Best Bakery.

O Tapisco funciona em horário contínuo do meio-dia à meia-noite e tanto permite fazer uma refeição substancial como apenas beber um copo que até pode ser sem álcool, como este Lei Seca, o chá gelado da casa à base de lima e gengibre. (foto: © Tiago Pais / Observador)

Entre as 12h e as 23h59 é possível tapiscar por estas bandas: a cozinha funciona de modo contínuo. Seja num dos 22 lugares com mesa ou num dos 10 ao balcão, com vista privilegiada para a acção. E o melhor, pelo menos por estes dias, será aparecer fora de horas, já que a casa tem andado concorrida e não se aceitam reservas. Segundo consta, até já houve quem se tivesse oferecido para comer de pé — outra tradição espanhola — num pequeno espaço junto à zona de bar. É a prova de que Sá Pessoa tinha bons motivos para andar a matutar nesta ideia há quase dois anos. E porquê? “Porque esta é a cozinha que me apetece quando estou fora do Alma”, confessa. Pelo vistos, não está sozinho.

Nome: Tapisco
Morada: Rua Dom Pedro V, 81 (Príncipe Real), Lisboa
Telefone: 21 342 0681
Horário: Todos os dias das 12h à 00h
Preço Médio: 25€
Reservas: Não aceitam
Site: tapisco.pt