Domingos Piedade, antigo presidente do conselho de administração da Circuito Estoril, empresa estatal que explora o Autódromo do Estoril, e Isabel Brazão, ex-administradora, começam a ser julgados na quarta-feira, em Cascais, por abuso de poder, peculato e falsificação.

Segundo o despacho de acusação do Ministério Público (MP), a que a agência Lusa teve acesso, os dois antigos gestores da Circuito Estoril (CE), detida desde 2002 pela Parpúblca, ‘holding’ do Estado, utilizaram, entre 2007 e 2012, o cartão de crédito da empresa em despesas pessoais e receberam vencimentos adiantados que acabaram por não ser autorizados pelas Finanças. Domingos Piedade presidiu ao conselho de administração da CE entre 2003 e 2012 – entre agosto de 2009 e junho de 2010 foi apenas administrador não executivo – e Isabel Brazão foi vogal executiva entre 2007 e 2012, ano em que ambos renunciaram aos cargos.

Os arguidos, além de um salário entre 3.528 e 3.885 euros, tinham um cartão de crédito com ‘plafond’ até 7.500 euros para despesas ao serviço da CE. O MP sustenta que os ex-gestores utilizaram o cartão de crédito “para pagamento de despesas pessoais” e “levantamentos”. Os arguidos adquiriram produtos ou serviços “para si ou seus familiares”, tendo ordenado ao setor financeiro e contabilístico da CE que “procedesse a transferências bancárias para contas de terceiros para pagamento de despesas que lhe respeitavam ou aos seus familiares”.

Entre as mais de 200 faturas/despesas contabilizadas pelo MP como pessoais constam, designadamente, o pagamento, durante mais de três anos, da fatura mensal do telemóvel do filho de Domingos Piedade, assim como gastos em restaurantes, cabeleireiros, farmácia, hotéis e viagens de avião. O MP frisa que Domingos Piedade e Isabel Brazão continuaram a usar o cartão de crédito mesmo depois de o Governo, em março de 2012, proibir essa prática aos gestores públicos.

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A acusação diz ainda que Isabel Brazão, para comprovar despesas de deslocação ao serviço da CE, apresentou faturas de táxi rasuradas, de forma a discriminarem valores mais elevados, tendo com isso recebido 430 euros, quando a despesa real era de apenas 29 euros.

Os arguidos são ainda acusados de terem recebido ordenados e retroativos sem autorização do Ministério das Finanças, entregues a “título de adiantamento por vencimentos futuros”, os quais eram também incluídos numa conta corrente com a CE. A acusação conta que em julho de 2012, após os cortes de ordenados no setor público, os arguidos requereram ao Ministério das Finanças autorização para auferirem um vencimento superior calculado com base no valor médio dos últimos três anos dos seus lugares de origem, possibilidade prevista no estatuto do gestor público.

Dois meses depois, e apesar de ainda não terem resposta – e de a autorização das Finanças ser imprescindível -, ambos deram ordens aos serviços da empresa para que pagassem, “a título de antecipação de retroativos”, 8.600 euros a Domingos Piedade e 6.600 euros a Isabel Brazão. O MP sublinha que, não só os arguidos não podiam ter dado essa ordem ilegal, como os respetivos pedidos viriam a ser indeferidos pelas Finanças, em janeiro de 2013.

A acusação refere que Domingos Piedade terá usado indevidamente 37.900 euros – dos quais o ex-gestor ainda terá em dívida 14.600 euros (8.600 relativos ao adiantamento de vencimentos e 5.900 de despesas consideradas pessoais). Domingos Piedade vai responder por sete crimes de abuso de poder. Isabel Brazão, acusada de quatro crimes de abuso de poder, um de falsificação de documento e outro de peculato, já devolveu tudo à CE, segundo o MP – 34.000 euros, relativos às despesas do cartão e ao vencimento.