O ex-ministro das Finanças não concorda com a tese de que o aumento de capital decidido na Caixa Geral de Depósitos em 2012 era o valor mínimo. Em respostas por escrito à comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da CGD, Vítor Gaspar afirmou que, apesar dos constrangimentos impostos pelas ajudas de Estado, a operação incluiu uma margem de segurança de 350 milhões de euros.

Em quem definiu o valor de 1.650 milhões de euros? “O montante de reforço de fundos próprios foi determinado, como para os outros bancos, com base na análise e pareceres do Banco de Portugal”. A leitura feita pelo ex-ministro das Finanças sobre a posição do supervisor bancário é a de que o BdP considerava que o aumento de capital “excedia em cerca de 350 milhões de euros os mínimos exigidos”.

Ou seja, Vítor Gaspar remete para o Banco de Portugal a responsabilidade pela dimensão da recapitalização feita pelo anterior Governo. “De acordo com o Banco de Portugal, o grupo CGD tinha capacidade para gerar resultados capazes de remunerar o capital e reembolsar o Estado do montante correspondente a instrumentos híbridos”. Ora a incapacidade para reembolsar estes instrumentos (os chamados CoCos) no valor de 750 milhões de euros, é uma das razões que determina a necessidade de colocar mais capital no banco do Estado.

No entanto, o então ministro diz que a margem prevista no aumento de capital de 2012 foi “considerada apropriada para cobrir provisões possivelmente insuficientes, alterações regulamentares e outros eventos imprevistos a nível nacional ou internacional”.

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Em 2013, não havia expetativa da Caixa precisar de mais capital

Vítor Gaspar revela ainda que a carta de missão de 31 de maio de 2013 da troika “torna claro que a operação de aumento de capital do ano anterior era avaliada como bem sucedida e que não havia expetativa de necessidade de qualquer reforço adicional”. O ex-ministro deixou o cargo em julho de 2013. E não tem memória de ter havido algum alerta específico por parte da troika para a situação da Caixa Geral de Depósitos.

A insuficiência do aumento de capital feito em 2012 pelo Governo do PSD/CDS tem sido apontado pelo atual Executivo como um dos fatores que contribui para as elevadas necessidades de capital que o banco público enfrenta atualmente. A desadequação desta recapitalização, decidida quando Gaspar era ministro, também foi defendida pelo antigo vice-presidente da Caixa. António Nogueira Leite revelou na comissão de inquérito ter avisado o então ministro das Finanças de que ia ser muito complicado ao que Gaspar terá respondido: “Não tive oportunidade de fazer diferente”.

Com aumento de capital de 2012, pôr a Caixa dar lucro era uma “missão impossível”

O ex-ministro diz ainda os interlocutores mais importantes para determinar os montantes de reforço de capital da Caixa foram o Banco de Portugal, a própria Caixa, e a DG Comp (direção europeia da concorrência), mas destaca que a posição mais determinante foi a do supervisor bancário. A principal matéria que determinou a necessidade da recapitalização da CGD em 2012 foi a exposição à dívida pública portuguesa, depois de o regulador europeu ter exigido uma almofada suplementar aos bancos nacionais por causa destes ativos.

Ao longo das respostas a várias perguntas repetidas, o atual diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI) assinala que as necessidades de reforço de capital da Caixa foram “estimadas com base na melhor informação disponível na altura”. E com a informação disponível à data, a operação tinha sido bem sucedida.

Quanto questionado sobre as razões pelas quais a Caixa não conseguiu cumprir o plano de reestruturação acordado com Bruxelas em troca da recapitalização de 2012, Gaspar admite, a título de conjetura, que a responsabilidade terá sido de dois fatores:

  • Taxas de juro persistentemente mais baixas do que o previsto — associadas à inflação na área do euro muito abaixo do objetivo do BCE (Banco Central Europeu).
  • Crescimento nominal e real abaixo do previsto em Portugal.

Questionado sobre se um diferencial das taxas de juro seria suficiente para abalar os pressupostos do plano da Caixa, Vítor Gaspar realça que as estimativas apresentadas pelo então presidente do banco, José de Matos, apontam para isso mesmo.

Vítor Gaspar confirma ainda a tese, já avançada no Parlamento por Maria Luís Albuquerque, de que a Comissão Europeia se opôs a um aumento direto do capital feito pelo Estado, como aconteceu no passado. Para a Comissão Europeia, o reforço de capital da CGD, como o dos bancos privados, consubstanciava uma ajuda de Estado. Como tal estava sujeita ao regime europeu que regula as ajudas de Estado”.

Bruxelas argumentava que se previa o regresso do banco aos lucros em 2014 e concluía por isso que um investidor privado não estaria disposto a investir nestas condições. Gaspar revela que Portugal contestou juridicamente a classificação de ajuda de Estado que impôs um plano de reestruturação, mas que os argumentos não convenceram os serviços da DG Comp.

O aumento de capital aprovado já este ano pela direção da concorrência europeia prevê que a Caixa volte a dar lucros em 2018.