António Domingues, ex-presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD), tentou convencer o Tribunal Constitucional a garantir o sigilo em torno das suas declarações de rendimento e património. Os argumentos foram vários: o antigo vice-presidente do BPI invocou razões de segurança e de reserva da vida privada, a sua e a da mulher, com quem tem todo o património em comunhão. Chegou mesmo a argumentar que, pelo facto de ter um património muito superior a outros gestores públicos, deveria merecer um tratamento diferenciado. E até sugeriu que uma coisa é ser detentor de um alto cargo público, outra é ser detentor de um alto cargo político — as obrigações de transparência não eram as mesmas, defendeu Domingues. Sem efeito. Os juízes do Palácio Ratton rebateram todos os argumentos e negaram o pedido do então presidente da Caixa.

Os detalhes são contados pelo Público [link para assinantes], que teve acesso ao despacho onde o Tribunal Constitucional nega o pedido de sigilo de António Domingues. Desse despacho constam também os argumentos do então presidente da Caixa, que estava claramente convencido de que o Governo, através das alterações introduzidas no Estatuto do Gestor Público, o isentara de entregar as declarações de rendimento e património. Argumentava Domingues: “O gestor diligente, ao assumir funções na Caixa Geral de Depósitos, SA, não pode deixar de presumir que o legislador [o Governo] soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, pelo que uma exclusão de determinadas categorias de titularidade do conceito público definido no respetivo estatuto conduzirá naturalmente à conclusão que os titulares excluídos não estão sujeitos aos deveres próprios do gestor público”.

Mas a “razão fundamental” para António Domingues era a segurança. O então presidente do banco público argumentava que a consolidação da “num único documento do património individual com identificação de imóveis” como a “casa de morada de família, casa de férias ou casas onde habitam familiares” permitiria a “terceiros” a localização dos seus bens, pondo em causa a sua segurança e a segurança e privacidade da sua mulher.

Perante este argumento, o Tribunal Constitucional lembrou a jurisprudência neste tipo de casos, argumentando que a menos que existisse uma ameaça de risco concreta, o direito ao sigilo não se justificava.

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Quanto ao facto de ter um património superior à maioria dos gestores públicos — outro dos argumento invocados por Domingues para justificar o sigilo —, os juízes do Tribunal Constitucional foram taxativos: “Seria incompreensível, face aos objetivos da transparência, que uns declarastes fossem beneficiados […] só por terem património mais elevado”. E ainda sobre as diferentes obrigações entre titular de alto cargo público e titular de alto cargo político: “Não se descortina qual seria a justificação para a tal distinção”, contra-argumentou o Constitucional.

No final de fevereiro, o Tribunal Constitucional recusou formalmente o pedido de sigilo de António Domingues, uma semana depois decidir pela obrigatoriedade dos 11 antigos administradores do banco público de entregarem as suas declarações. Os juízes consideraram na altura que criar exceções ao princípio de transparência aplicado ao Estatuto do Gestor Público e a gestores de empresas participadas pelo Estado representaria seria uma “insustentável subversão valorativa”. Além disso, e ao contrário do que esperava António Domingues, as alterações ao Estatuto de Gestor Público não podia prevalecer sobre uma lei já existente de 1983, onde estão identificadas essas obrigações.

Constitucional obriga António Domingues a apresentar declaração de rendimentos