O futuro superdesportivo que a Mercedes e a AMG estão a desenvolver, e de que apenas se conhece o perfil e uma ou outra característica técnica, ainda não anda, mas já anda nas bocas do mundo. Pelo menos no que aos construtores desta classe de veículos, tão potentes quanto caros, diz respeito.

Os alemães, desejosos de tornar a AMG uma marca independente e mais exclusiva, com pergaminhos para poder rivalizar com marcas como a Ferrari, Porsche e Lamborghini – o que a Mercedes dificilmente conseguirá devido à democratização da sua gama, especialmente após à chegada do Classe A –, decidiram aplicar no seu Project One o melhor que têm lá em casa. E isto, em termos de motorizações, significa a unidade motriz que equipa o F1 da marca e que venceu os três últimos campeonatos do mundo da disciplina. E anunciaram-no com pompa e circunstância.

Ora a Ferrari, que já deve estar farta de perseguir sem grande sucesso os carros da flecha prateada nas pistas – excepção feita para a primeira corrida deste ano, na Austrália, em que Vettel foi segundo nos treinos, mas bateu Hamilton em prova –, não morreu de amores por ver a Mercedes passear pela estrada e materializar em forma de superdesportivo, a superioridade que tem revelado na competição. Vai daí, como quem não se sente não é filho de boa gente, resolveu espetar uma farpa no Project One. E, para doer ainda mais, arranjou um alemão para passar a mensagem.

Michael Hugo Leiters é alemão e o CTO da Ferrari (Chief Technology Officer) desde início de 2014, isto depois de ter trabalhado 13 anos na Porsche. Foi ele o escolhido para recordar a Mercedes-AMG que, em termos de montar motores de F1 em automóveis de série, a Ferrari já tinha feito aquilo que os americanos tanto gostam de afirmar: been there, done that. Ou seja, já experimentou adaptar um motor derivado de um F1 num superdesportivo e, curiosamente, não ficou fã da solução. A prova? Há 21 anos que não repete a graça.

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O Ferrari a que Leiters se referia é o F50, produzido a partir de 1995 e de que apenas foram construídas 349 unidades. O principal argumento do F50 era o seu motor, um impressionante V12 atmosférico com 4,7 litros de cilindrada, que derivada directamente do 3.5 V12 que equipava o Ferrari de F1 utilizado em 1990, exactamente o modelo 641 que foi conduzido por Alain Prost nesse mesmo ano. Esta unidade motriz – extremamente compacta e leve ou não tivesse ela sido concebida para animar um F1– desenvolve na versão de estrada 520 cv às 8.000 rpm e um binário máximo de 470 Nm às 6.500 rpm.

Comparado com o motor do F1, o V12 do F50 viu a sua capacidade incrementada para compensar o que iria perder em potência ao tornar o motor mais civilizado, tudo para o compatibilizar com uma utilização normal no dia-a-dia, como no pára-arranca em cidade. Assim, em vez dos 680 cv do F1, o F50 fornecia menos 160 cv, mas em compensação tinha mais força a baixo regime, pois de contrário queimaria a embraiagem ao primeiro ponto de embraiagem que fosse necessário realizar.

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Regressando a Michael Leiters, o técnico da Ferrari afirmou ainda que “em vez de montar um motor de F1 num superdesportivo, é preferível adoptar algumas das soluções utilizadas na F1, para tornar os superdesportivos ainda mais exuberantes e eficazes”. Será que a Ferrari tem razão? Sim, a acreditar na Aston Martin, que vai produzir o Valkyrie. Este impressionante superdesportivo inglês, concebido pelo talentoso Adrian Newey, anuncia mais de 1.000 cv e pouco mais de uma tonelada de peso, mas não recorre à mecânica de um F1, essencialmente pela relação entre a potência e a robustez que é exigível a um automóvel apto para circular nas vias públicas. E a Mercedes-AMG sabe o que isto significa, pois também ela já anunciou que o seu Project One, que irá surgir ao público no próximo Salão de Frankfurt, em Setembro, vai necessitar de reconstruir o motor ao fim de cada 50.000 km. Isto num modelo que deverá custar 2,5 milhões de euros e de que apenas deverão ser produzidas 300 unidades.