Trezentos anos depois, Espanha consegue uma vitória diplomática de relevo sobre o Reino Unido em Gibraltar. Entre as diretrizes definidas pelos 27 e enviadas esta sexta-feira aos líderes europeus consta um ponto que reacende uma contenda ancestral: Espanha terá o direito de veto sobre a aplicação em Gibraltar do acordo para o Brexit.

O esboço de texto que foi enviado ao líderes europeus pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, — e que está a ser citado pela imprensa internacional — é claro em como o que for acordado não se aplica à colónia britânica localizada a sul de Espanha:

Depois de o Reino Unido deixar a União Europeia, nenhum acordo entre a UE e o Reino Unido pode aplicar-se ao território de Gibraltar sem um acordo entre o Reino de Espanha e o Reino Unido.

Em Espanha e também no Reino Unido, esta está a ser vista como uma vitória diplomática do Governo de Mariano Rajoy, que consegue, assim, que aquilo que for aplicado a Gibraltar tenha sempre de passar pela sua autorização, nomeadamente no que a relações comerciais diz respeito e no acesso ao mercado único europeu, depois do país soberano, o Reino Unido, sair da UE. Recorde-se que, no referendo de junho do ano passado, o Rochedo votou expressivamente contra a saída do Reino Unido da União Europeia: 95,6% da população opôs-se à solução, a votação mais alta de todo o Reino Unido.

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O Telegraph adianta que o texto a está a provocar desconforto em Londres e a ser visto como “absolutamente inaceitável”, por conceder a Espanha demasiado poder sobre o futuro de Gibraltar. O Rochedo está sob soberania britânica, depois de cedência espanhola, em 1713, nas trocas que existiram no âmbito do Tratado de Utrecht (o tratado de paz que acabou com a Guerra da Sucessão Espanhola). Ao longo dos séculos, Espanha foi sempre tentando recuperar o território.

O El Español cita um alto funcionário da UE a explicar que este texto mostra que houve uma mudança de posição da União que nunca tomou posição sobre a relação entre Espanha e Reino Unido, no que a Gibraltar diz respeito. “Algo mudou. Nas negociações do Brexit está uma União de 27 e só está representada uma das partes da disputa”, diz a mesma fonte que ainda acrescenta que a relação entre Espanha e Reino Unido deverá ficar resolvida num acordo posterior. No britânico Express, são também citadas fontes europeias que explicam que “Madrid quis marcar um ponto”, mas que em termos legais a cláusula conta pouco, já que “simplesmente coloca a situação tal como ela existe hoje e não muda nada”. Mas uma outra fonte, do Governo britânico, mostra desagrado com a cláusula “totalmente inaceitável”: “Questionamo-nos por que motivo a União Europeia considerou sensato por em questão um assunto que é bilateral, entre Espanha e Reino Unido”.

O ministro dos Assuntos Exteriores espanhol, Alfonso Dastis, tem defendido precisamente que o futuro de Gibraltar seja decidido numa negociação bilateral, à margem do processo do Brexit, como agora parece estar em vias de acontecer. O documento que foi agora posto a circular é um esboço em que o Conselho Europeu está a trabalhar, mas já surge a menos de um mês da cimeira — marcada para 29 de abril — onde os líderes europeus contam poder fechar a estratégia da União para o Brexit.