A ex-diretora financeira do BES disse esta segunda-feira, em Tribunal, que quando soube que faltavam 1,3 mil milhões de euros de dívidas da ESI nas contas do grupo ficou “sem pinga de sangue” e a achar que havia um erro.

Isabel Almeida, antiga diretora do Departamento Financeiro, Mercados e Estudos (DFME) do Banco Espírito Santo (BES), depôs esta segunda-feira no âmbito do julgamento, que decorre desde 6 de março no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, dos pedidos de impugnação das contraordenações aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP) ao ex-presidente do BES, Ricardo Salgado (quatro milhões de euros), e ao ex-administrador Amílcar Morais Pires (600.000 euros) por terem permitido que fossem comercializados títulos de dívida da Espírito Santo Internacional (ESI) junto de clientes do BES, apesar de conhecerem a situação líquida negativa da ESI.

Isabel Almeida, arrolada como testemunha neste processo, disse ao tribunal que o valor do passivo da ESI foi transmitido por Ricardo Salgado numa reunião realizada em 9 de setembro de 2013, tendo ficado “absolutamente incrédula” com a explicação do então contabilista, Francisco Machado da Cruz, de que existiam emissões que não tinham sido registadas.

Ricardo Salgado “disse que eventualmente podia ser um problema de consolidação” da ESCom (Espírito Santo Comercial) e foi referida a existência de ativos em Angola, investimentos que teriam valorizado e dos quais “nunca tinha ouvido falar”, e também (nessa ou na reunião que se realizou uns dias depois) de “diversas operações do GES [Grupo Espírito Santo] realizadas no passado que tinham grande prejuízo”, acrescentou.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Isabel Almeida disse ao tribunal que achou o discurso de Ricardo Salgado “um bocadinho esquisito” porque não se estava a falar de contas consolidadas mas de dívida da ESI, o que era para si “uma situação totalmente nova”, que lhe causou “muita estranheza”.

Machado da Cruz e Carlos Calvário terão sido incumbidos de analisar em detalhe o problema, o que a levou a alimentar “uma réstia de esperança de que havia um erro”.

A situação era tão mais “preocupante” quanto, devido à alteração legislativa ocorrida na primavera de 2013, estava em curso uma operação para lançar um produto novo junto dos clientes, já não sob a forma de fundo, como acontecia com o ES Liquidez, mas de papel comercial.

Segundo Isabel Almeida, no verão de 2013 o fundo atingiu o seu máximo, cerca de dois mil milhões de euros, sendo os investidores sobretudo institucionais, como a PT, e clientes venezuelanos, esperando-se agora aumentar o retalho, com uma emissão da ordem dos 1,6 mil milhões de euros, operação que acabou por ser suspensa em 02 de dezembro.

A ex-diretora financeira do BES afirmou que foi em setembro de 2013 que pediu a um colaborador, Gonçalo Gaspar, um balanço mensal das emissões, mapas que foram esta segunda-feira alvo de muitas questões e que Isabel Almeida afirmou ter achado “caricato” o BdP os ter usado quando o seu âmbito “nada tinha a ver com a totalidade da dívida” do grupo.

Justificou esta iniciativa com a necessidade de estar munida de informação para dar resposta célere aos pedidos que lhe eram feitos pelos administradores, primeiro esporadicamente e depois com maior regularidade, sobre prazos e renovações das emissões.

O depoimento de Isabel Almeida prossegue na terça-feira, num julgamento que tem sessões de segunda a quinta-feira e que está em fase de audição de testemunhas arroladas pelo Ministério Público e pelo BdP.