A longevidade de algumas espécies de animais sempre foi uma incógnita aos olhos da maioria dos cientistas. Uns conseguem viver durante séculos, como o tubarão-da-gronelândia ou o molusco ming – o animal mais antigo do mundo encontrado vivo -, outros apenas durante meses, semanas ou até dias. Mas porque é que tal acontece? Vários especialistas acreditam que um conhecimento mais aprofundado das razões que levam à longevidade no reino animal dá-nos a possibilidade não só de entender melhor os animais, como também a espécie humana, conta a BBC.

Uma das ideias mais profundamente ligadas ao tempo de vida dos animais é a taxa metabólica, ou a velocidade das reações químicas que transformam os alimentos em energia e produzem os componentes necessários para as células. Ao longo do tempo, foram surgindo teorias com o objetivo de comparar o tempo médio de vida de uma determinada espécie e a sua taxa metabólica. Diversas investigações levaram a cabo um mecanismo para apoiar o que ficou conhecido como a teoria da taxa de vida, que defendia que quanto mais rápido fosse o metabolismo de um organismo vivo, menor seria a sua vida útil. No entanto, embora seja verdade que os mamíferos têm taxas metabólicas mais lentas e vivem mais tempo, a teoria da taxa de vida acabou por ser abandonada pela comunidade científica com o passar dos anos. Os investigadores têm vindo a apontar que muitas aves vivem muito mais tempo do que aquilo que deveriam para as suas taxas metabólicas.

John Speakman, cientista da Universidade de Aberdeen (Reino Unido) não vê qualquer ligação entre metabolismos mais lentos e um maior tempo de vida dos animais. “Todas as evidências que foram utilizadas para justificar a teoria da taxa de vida têm uma grande falha. Ou seja, provêm de estudos que comparam animais com diferentes pesos e tamanhos”, referiu Speakman. Para contornar a situação, o investigador levou a cabo um estudo em que analisou 239 espécies de mamíferos e 164 espécies de aves diferentes mas, desta vez, sem contar com a massa corporal de cada um. “Para ambos os mamíferos e aves, uma vez que a massa corporal foi removida, a relação entre a taxa metabólica e a duração de vida foi zero”, salientou Speakman.

Numa segunda tentativa, e em busca de resultados mais esclarecedores, John Speakman decidiu comparar ainda o gasto de energia diária e o tempo de vida de 28 espécies de mamíferos e 44 espécies de aves, retirando na mesma a massa corporal de cada um. “Existe uma relação entre eles, mas é o oposto àquilo que se previa a partir da teoria da taxa viva”, referiu o cientista. “Nos mamíferos, pôde concluir-se que aqueles que têm taxas metabólicas mais rápidas, são os que vivem mais tempo”. Já nas aves, não foram registados dados significativos.

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Entre as vastas teorias, e com a descoberta do molusco ming em 2006, veio a acreditar-se ainda que a longevidade estaria relacionada diretamente com o baixo consumo de oxigénio. Mas essa ideia rapidamente foi ultrapassada, graças aos vários estudos que analisaram as mitocôndrias, uma parte das células que gera energia.

Molusco ming, da espécie Arctica islandica

O tamanho do corpo dos animais de grande porte foi outros dos fatores a ter em conta. João Pedro Magalhães, da Universidade de Liverpool (Reino Unido) comparou a massa corporal com o tempo de vida útil de mais de 1.400 espécies de mamíferos, aves, anfíbios e reptéis. Magalhães chegou à conclusão que 63% da variação do tempo médio de vida tinha a ver com a quantidade de massa corporal e que isso se devia, principalmente, a fatores ecológicos e evolutivos.

“O tamanho do corpo é um grande determinante de oportunidades ecológicas. Animais menores têm mais predadores e têm de crescer mais rápido, bem como reproduzir mais cedo, se quiserem realmente transmitir os seus genes. Os animais maiores, como os elefantes e as baleias, são menos propensos a ser comidos por predadores e não têm a pressão evolutiva para amadurecer e reproduzir numa idade ainda precoce”, explicou Magalhães.

Além do tamanho do corpo e das oportunidades ecológicas, há ainda outros fatores que podem ser tidos em conta em relação às expetativas de vida no reino animal. O tamanho do cérebro, por exemplo, que se tem vindo a relacionar com o tempo máximo de vida das espécies, especialmente nos primatas, bem como o tamanho do globo ocular. “Se temos alguma coisa que muda consoante o crescimento do tamanho do corpo, é como se estivesse relacionada com a vida, simplesmente porque não há qualquer relação entre o tamanho do corpo e o tempo de vida útil”, disse ainda Speakman.

Sem quaisquer pistas que relacionassem o tamanho do corpo com a longevidade, os investigadores viraram-se para os ambientes onde cada espécie se insere e a sua temperatura corporal. Steven Austad, jornalista, argumentou que o facto do tubarão-da-gronelândia e o molusco ming serem os seres vivos mais antigos não é nenhuma coincidência. “A maioria dos animais que vive durante muito tempo tem uma temperatura corporal baixa ou vive num ambiente de baixas temperaturas”, justificou Austad.

O tubarão-da-gronelândia

Com o passar dos anos, foram feitas outras pesquisas e investigações para tentar comprovar quais são, afinal, os grandes responsáveis pela longa vida de algumas espécies. No entanto, ainda não se conseguiu chegar a nenhuma conclusão e João Pedro Magalhães garantiu que “há muito trabalho a fazer” para haver dados consensuais acerca das expetativas de vida e do envelhecimento dos animais.