Quando, no início de fevereiro, Roberto Beristain Cegueda foi levado pelo Departamento de Imigração (ICE), a mulher, Helen, nem queria acreditar. Sempre pensara que a deportação de imigrantes ilegais prometida por Donald Trump se destinava apenas a cadastrados, aos “bad hombres” (homens maus, numa tradução livre), explicou à imprensa durante um dos múltiplos esforços que fez desde então para libertar o marido e manter a família de três filhos unida – foi por isso, e só por isso, que votou nele, garantiu.

Na terça-feira à noite, contudo, foi informada que, apesar de toda a pressão mediática, do apoio de várias figuras de destaque da comunidade (democratas, claro), da petição a correr pela sua libertação, e do esforço da equipa de advogados especialistas no tema que aceitou o caso em regime pro bono, não havia mesmo nada a fazer. Roberto, 44 anos, tinha sido levado de volta para o México, sem aviso à família ou possibilidade de contactar os advogados, escassas horas antes. Entregue às autoridades locais na fronteira El Paso-Ciudad Juarez, estava já num abrigo para migrantes na cidade fronteiriça.

Foi a primeira vez que voltou ao país desde que, em 1998, passou para o lado americano a salto, com um grupo de outros migrantes. Tinha 26 anos. Conheceria Helen não muito tempo depois, num restaurante em Fort Wayne, no Texas. Ela já tinha um filho – casaram em 2001 e tiveram outros três nos anos seguintes: Maria tem 15 anos, Jasmine 14 e Demetri apenas 8.

Assentaram em Mishawaka, no Indiana, onde Roberto trabalhou durante anos num restaurante de que, em Janeiro passado, acabou por tornar-se proprietário. Nada faria prever este desfecho, garantem Helen e Adam Ansari, o advogado da família. Helen, logo depois de o marido ser detido há dois meses, ainda estava convicta de que tudo não passara de um engano: “Não me parece que o ICE ande por aí a deter qualquer um e a destruir famílias”.

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Agora o advogado, a quem Roberto foi impedido de telefonar, apesar de o ter solicitado, quando na noite de terça-feira foi metido numa carrinha rumo ao México: “Ele nunca cometeu nenhum crime, nem uma multa de estacionamento tem. Toda a gente que o conhece diz que é provavelmente uma das pessoas mais adoráveis com quem já se cruzaram. É um pai e marido extremoso. E trabalha muito no seu restaurante”.

Uma saga para ser enviado de volta às origens

Depois de nos últimos meses ter sido transferido de estabelecimento prisional para estabelecimento prisional, sempre em Estados diferentes e cada vez para mais longe de casa e perto do país de origem (Indiana, Wisconsin, Illinois, Louisiana, Novo México e Texas), Roberto Beristain Cegueda está agora confinado ao asilo para migrantes em Ciudad Juarez.

“De repente disseram-me que era hora de ir embora. Disseram-me para pegar nas minhas coisas, meteram-me na parte de trás de uma carrinha e aceleraram em direção à fronteira. Levaram-me para outras instalações no meio do caminho para assinar uma série de documentos. Pedi para falar com o meu advogado, mas disseram-me que não havia tempo para isso. Por volta das 22h00 fui deixado na fronteira México – Estados Unidos e caminhei até ao México”, revela Roberto, em comunicado.

Casado com uma norte-americana, pai de três norte-americanos e proprietário recente de um restaurante em solo norte-americano, Roberto só foi deportado porque, em 2000, durante uma viagem às Cataratas do Niágara, com Helen e Phil, o enteado, se enganaram no caminho e cruzaram inadvertidamente a fronteira para o Canadá. A história é contada no texto da petição pela sua permanência nos Estados Unidos: quando voltaram a passar para o lado americano, Roberto, sem documentos para apresentar às autoridades, recebeu uma ordem de deportação voluntária – que nem por um segundo, com a mulher grávida na altura, pensou cumprir.

Em vez disso, casou com ela e tiveram outros dois filhos. Entretanto, tirou a carta de condução, recebeu uma autorização de trabalho, um cartão da segurança social, tornou-se um membro destacado da comunidade e um cidadão cumpridor. E foi exatamente quando, no dia 6 de fevereiro, se dirigiu a Indianapolis, no Indiana, para cumprir e renovar a autorização de trabalho que a luz vermelha se acendeu e foi detido: de acordo com a tal ordem de deportação voluntária devia ter saído do país há 17 anos.

Saiu. Mas Adam Ansari garante que não vai descansar até que seja admitido de volta: “É fundamentalmente injusto fazer isto a uma pessoa, tenha ou não documentos. Ele está cá há 20 anos. Tem família e um negócio. Não vais dar-lhe uma oportunidade? Ele contribuiu tanto para a comunidade. Como cidadãos dos Estados Unidos devemos-lhe isso”.