A Banda Amizade, de Aveiro, quer ir à Holanda representar Portugal no World Music Contest. Speedy, bailarino de breakdance, precisa de 20 mil euros para fazer uma prótese especial para atletas, nos Estados Unidos. Pedro Tavares quer editar um novo álbum e a Meia Dúzia e Meia de Gatos Pingados precisa de ajuda para realizar o festival “A Porta”, em Leiria. Por enquanto, são estes os quatro projetos que estão à procura de financiamento na Pernas Pr’andar, a plataforma de crowdfunding para projetos sociais lançada por Paulo Veríssimo no início de abril.

“Há muitas ideias e muitas propostas nas gavetas por esse país fora”, diz o responsável. A ideia é que os projetos nas áreas de cultura, desporto, responsabilidade social e empreendedorismo, que “normalmente não passam de sonhos”, possam ser concretizados através da promoção de campanhas, pessoais ou coletivas, e que tenham uma alternativa aos canais de financiamento tradicionais.

Na Pernas Pr’andar, cada cidadão pode investir o que quiser em projetos que podem ir da edição de um livro à criação de um negócio, aquisição de uma carrinha para uma associação, reparação de uma sala de aula, à organização de um concerto de uma orquestra ou de um bailado.

A plataforma foi criada por Paulo Veríssimo, 42 anos, economista de formação, agora responsável pela área de novos negócios da Blueticket e do Meo Arena. Diz que a ideia começou a ser pensada há um ano e meio, quando ainda era diretor de Recursos Humanos do Teatro Nacional de São Carlos, e que lhe surgiu da experiência e do “ADN ligado ao associativismo”: foi presidente da Associação Académica da Universidade Lusíada e vice-presidente da Associação Académica de Lisboa, fez parte da Santa Casa da Misericórdia de Sintra e foi presidente da Associação Empresarial de Sintra. Decidiu arrancar com o projeto por causa do “avanço na legislação portuguesa, que há cerca de um ano e meio, dois, começou a aparecer”.

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Vamos vendo que há apoios para tudo e mais alguma coisa, a nível das empresas, de startups, e, às vezes, estes projetos mais pequenos, que até podem ter mais relevância, ficam parados e não avançam. Vi no crowdfunding uma oportunidade para poder ajudar a dar pernas a este tipo de projetos, sem terem de recorrer ao financiamento tradicional”, explica Paulo Veríssimo ao Observador.

Como funciona?

Tudo começa com um vídeo ou texto que apresenta o projeto que está à procura de financiamento. Nesta fase, a Pernas Pr’andar presta “um serviço de consultoria” e avalia se a ideia tem interesse para ser colocada na plataforma. Se for aprovada, a proposta começa a ser divulgada nas redes sociais, a circular entre amigos, amigos de amigos até chegar ao público geral. Há também uma rede de empreendedores e particulares interessados em apoiar projetos deste tipo, diz Paulo Veríssimo.

O prazo das campanhas varia entre um e três meses. No final, se o valor da campanha for atingido, é entregue aos responsáveis do projeto. Senão, é devolvido aos financiadores. As doações têm “contrapartidas”. Se a campanha for para a edição de um livro, por exemplo, os doadores podem receber um exemplar do livro. Se for a realização de um concerto, podem receber um bilhete.

Isto ajuda a criar uma relação afetiva com o cliente. As pessoas não estão a dar dinheiro para ter algo em troca, estão a criar uma relação com os projetos. Se nós estivermos a doar, estamos a acreditar num projeto e vamos criar uma relação que pode perdurar no tempo. Essa é a vantagem do crowdfunding: não ser uma compra direta. Se vou apoiar um jovem escritor na edição do seu livro, vou querer seguir esta relação”, sublinha o responsável.

De freguesia em freguesia, instituição a instituição

A plataforma também tem como objetivo apoiar projetos apresentados no âmbito dos orçamentos participativos municipais. E as autarquias, associações culturais ou instituições de solidariedade social também podem recorrer à “Pernas Pr’andar”. Quando os projetos são aprovados, a plataforma cobra uma taxa de 5% (adicionada ao valor necessário à campanha). Esse montante, diz Paulo Veríssimo, é depois reinvestido na divulgação dos projetos.

Não estamos vocacionados para criar startups, angariar dinheiro ou comparticipar financeiramente as empresas. É uma forma de solidariedade, não estamos preocupados com o lucro”, sublinha Paulo Veríssimo.

O empreendedor considera que, em Portugal, “as pessoas ainda estão muito pouco familiarizadas” com esta alternativa de financiamento, ao contrário, de “países como os Estados Unidos ou o Brasil, que são uma loucura ao nível dos projetos que são financiados por este tipo de modelo”.

Há aqui um caminho a percorrer, de partir pedra, de explicar às pessoas como funciona o sistema e torná-lo credível. Somos sempre resistentes a este tipo de financiamento e de coisas novas que surgem”, acrescenta.

Quanto às propostas que conseguirem angariar o montante pretendido, Paulo Veríssimo garante que a “Pernas Pr’andar” não quer perder a ligação a esses projetos. “Queremos acompanhar a implementação [dos projetos], e dar alguma consultoria, se for necessário. Queremos, sobretudo, ver até onde chegaram”, conclui o responsável.