Jorge Jesus sabe que nunca passa indiferente numa sala, numa palestra, num congresso. Mas, com aquele seu jeito inconfundível, também faz para que não passe ao lado. “O presidente convidou-me para este congresso e lançou-me o desafio para falar sobre o treino. Aceitei. E fiz um Power Point para ajudar a minha ideia”, atirou. Se era um momento aguardado, ainda mais passou a ser. E vai daí, começou a explanar os seus mandamentos.

O treinador é um criador, ele e a sua equipa técnica, deve dar uma filosofia à equipa, ideias à equipa, criar métodos de treino, ter um objetivos de treino e a ciência no treino, que também ajuda e contribui para as ideias da equipa: o sistema de jogo, o modelo de jogo e o modelo de jogador. Mas isto não é uma cartilha coletiva, é a ideia que eu tenho”, soltou com um sorriso antes de entrar na explicação de cada um dos pontos.

“O sistema de jogo não é um número de telefone, é o princípio de tudo. Aqui no slide, por exemplo, está um 3x4x3. E porque é que isto é tão importante? Porque os jogadores, com a evolução do futebol, vão ter de saber vários sistemas, porque no futuro vai ser assim, as equipas vão mudar várias vezes de sistema durante o jogo. O futebol vai ser como o andebol ou o basquetebol e, por isso, a cultura tática dos jogadores vai ter de ser ainda maior. O futuro vai ser isto, mas eu já o faço“, argumentou, antes de recordar os tempos que passava em Alvalade com o pai, Virgolino, que chegou a jogar com a célebre equipa dos Cinco Violinos.

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“Quando era miúdo e vinha a Alvalade com o meu pai, ouvia as pessoas a dizer ‘esta equipa não tem fio de jogo’. Mas o que é isso do fio de jogo? É exatamente o modelo de jogo da sua equipa, são os compromissos e comportamentos que dão depois a identidade de jogo à equipa. Mas atenção, isto não é uma ciência exata… Começaram por falar-se em quatro momentos de jogo mas sempre falei em cinco. E qual é o quinto? As bolas paradas!“, recordou enquanto tinha um slide ao lado que juntava estratégia posicional a organização defensiva, transição ataque/defesa (reorganização), organização ofensiva e transição defesa/ataque.

Por fim, entrou no modelo de jogador. “Isso tem a ver com os comportamentos individuais, mas com as características que um jogador tem para entrar no modelo de jogo e no sistema de jogo. Por isso é que importa ser o treinador a escolher, porque não basta só ter técnica, precisa de outros argumentos para o que estou a tentar criar no Sporting, que é uma cultura de campeão. Isto não é chegar e meter o Figo, o Beto… O treinador deve ter mais qualidades trabalhando em equipas de top como eu aqui no Sporting”, destacou.

Após a apresentação, também no âmbito do painel I do The Future of Football, Jorge Jesus respondeu ainda a algumas questões. Disse, por exemplo, que Marcelo falhou no golo do Barcelona que decidiu o último clássico com o Real Madrid nos descontos (“embora seja o melhor lateral do Mundo, pelo menos ofensivamente é”, atirou) por não ter feito logo no início da jogada uma falta tática. E pormenorizou o que distingue um bom treinador dos outros.

“O treinador tem que criar as suas ideias, ter os seus dez mandamentos, embora cinco só os vá dizer no próximo congresso. Tem de ser criativo, organizado, tem de operacionalizar o treino, liderar e ter paixão. Estes são os cinco requisitos. Os outros passo para a comunicação com o jogador. Mas se um jogador sem talento treinar comigo, nunca vai dar jogador! Não se consegue potenciar se não houver o talento. No futebol, a prática é o critério da verdade. Jogo falado é uma coisa, jogo jogado é outra, jogo treinado é outra”, salientou.