A segunda vida do Leopold era aguardada com expetativa. Muita expetativa. E o sinal mais claro disso mesmo foi a quantidade de vezes que o chefe Tiago Feio teve de responder a questões sobre a data de abertura do novo espaço. “Foram muitas”, sorri. Era para ter sido em setembro do ano passado. Depois, em meados de outubro. Perdão, até ao final do ano. Calma, afinal só em janeiro. Disse janeiro? Queria dizer fevereiro. Ou talvez março. Oficialmente, foi só em abril.

O chefe Tiago Feio em ação na sua nova cozinha.
(foto: © Tiago Pais / Observador)

A que se deveu a mudança?

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No início de 2016, Frédéric Coustouls, dono do Palácio Belmonte, foi jantar ao Leopold. Gostou tanto que pediu a Tiago Feio que visitasse um espaço que tinha, anexo ao Palácio, onde estava a pensar colocar um restaurante. “Ele pediu-me para lá ir, para o ajudar a fazer o desenho da cozinha. Só que no final da visita perguntou-me: ‘Quer ficar com isto?'” Após alguma hesitação, o chefe aceitou a proposta. Até porque as intenções de ambos casavam bem: “Ele tinha três exigências: não queria cheiros, não queria barulho e queria qualidade. E eu não queria fazer um restaurante de hotel. Mas ele também não.”

E não é que o chefe portuense tenha prazer em dar o dito por não dito. Ou a data por não data. É que entre obras, pareceres e licenças o processo foi, no mínimo, complicado. Com prejuízo para o próprio. “Fechámos o Leopold na Mouraria em maio do ano passado porque estava previsto abrirmos aqui passados uns meses”, recorda.

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O impasse obrigou-o a receber alguns clientes de porta entreaberta desde janeiro, para ir amortizando o investimento. Começaram por ser hóspedes do vizinho Palácio Belmonte, cujo proprietário, Frédéric Coustouls, é, também, o senhorio do Leopold. Mas as redes sociais não guardam segredo, e artigos como este, da Bloomberg, muito menos. Outros curiosos se seguiram, sobretudo clientes do antigo Leopold, um pequeníssimo espaço na Mouraria onde não havia fogão nem extração de fumos e onde a cozinha praticada transformava essas limitações em linguagem.

A refeição começa assim: beterraba amarela, beldroega de inverno, agrião com flor, folha de azeda vermelha e maionese de ostras. (foto: © Tiago Pais / Observador)

No novo Leopold não há essas limitações — não falta equipamento (nem extração de fumos) à cozinha — mas a linguagem mantém-se. Como o nome. “Ainda nos debatemos se se devia chamar Leopold ou não. Mas decidimos que íamos dar continuidade, pegar no que temos de bom e passar ao nível dois”, conta Tiago. Ana Cachaço, a mulher e braço-direito do chefe, continua a ser parte essencial da experiência: é ela que recebe os clientes e lhes revela o que estão prestes a comer: um menu de degustação de oito pratos (40€), que, no futuro, pode chegar aos dez (45€).

O Leopold ocupa agora uma antiga casa de habitação em frente ao Palácio Belmonte, a poucos metros do Castelo de São Jorge. (foto: © Tiago Pais/Observador)

O Leopold reencarnou num corpo maior, mais espaçoso: se na Mouraria havia pouco mais de dez lugares, agora são 22. Mas continua a exibir traços únicos. “Queríamos que não parecesse um restaurante”, explica Tiago Feio. E não parece, de facto. Especialmente por fora: ocupa uma antiga casa de habitação, que estava, segundo o chefe, “toda dividida”. Uma das divisões resistiu, é agora uma sala semi privada com capacidade para seis pessoas. Ao centro da divisão principal, uma grande mesa comunitária pode juntar oito pessoas com vista para a cozinha “teatral”, como a define o anfitrião, e até para o vidro onde escreve a lista de compras e se desenham os esquissos dos novos pratos. Ao fundo, um gira-discos que não é apenas decorativo. “Gosto que a música venha de forma orgânica e não de uma playlist qualquer. E gosto que o serviço pare enquanto se troca o vinil”, refere.

Porquê Leopold?

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O nome deve-se a um poster com um auto retrato do pintor austríaco Egon Schiele que viajou do Museu Leopold, em Viena, para casa de Tiago Feio e Ana Cachaço, primeiro, e daí para a antiga padaria na Mouraria que acolheu o primeiro Leopold. Esse mesmo poster descansa, agora, apoiado numa das paredes do novo restaurante.

A loiça e grande parte do mobiliário são de artistas locais: respetivamente Teresa Pavão e Manuel Netto. Não é por acaso e não vem de agora, Tiago não quer ter apenas um restaurante, mas também a possibilidade de intervir no bairro que o rodeia. “É uma característica que ainda tem a ver com a minha formação de arquiteto”, justifica o chefe, que frequentava a Faculdade de Arquitetura da sua cidade-natal, o Porto, quando se apaixonou pela cozinha.

Puré de túberas e azeite com crocante de especiarias. Só este prato vale a visita ao Leopold. Felizmente, há mais motivos de interesse. (foto: © Tiago Pais / Observador)

O menu de degustação servido nestes primeiros tempos da nova casa ainda traz alguns elementos da vida anterior do Leopold. “A culpa é minha, com este impasse todo no arranque fui adiando a criação dos novos pratos”, admite o chefe, que mais do que mudar por mudar, quer continuar a desenvolver a sua identidade, a sua linguagem.

Talvez por isso tenha voltado atrás, e a pratos antigos, quando sentiu que os novos não estavam a cumprir bem essa função. Como o novilho dos Açores servido com algas ou o o ovo a baixa temperatura, com trigo sarraceno e cogumelos shiitake. Mas um dos que entretanto criou, um puré de túberas com crocante de especiarias, deixa adivinhar que está tudo muito bem encaminhado. Tal como o excelente trabalho de Olavo Rosa, escanção (e não só, também dá uns toques na sala e na cozinha) que desenhou, em conjunto com Tiago Feio, um menu de degustação de vinhos (30€) para acompanhar o do chefe. Vinhos esses que também estão disponíveis a copo e são, na sua grande maioria naturais e de pequenos produtores. “Cada vinho tem que nos contar uma história”, dizem. Como faz este Leopold.

Nome: Leopold
Morada: Pátio de Dom Fradique, 12 (Castelo), Lisboa. 21 886 1697.
Horário: De quarta a domingo, das 19h às 23h
Telefone: 21 886 1697
Preço Médio: 50€
Reservas: Aceitam
Site: facebook.com/restaurante.leopold