O Tribunal da Relação de Lisboa voltou a recusar os recursos apresentados pela Caixa Geral de Depósitos, Banco de Portugal e Comissão de Mercado de Valores Mobiliários contra a entrega de informação sensível sobre os maiores clientes do banco ao Parlamento. Esta decisão surge a dias de ser retomada a atividade na comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da CGD.

Apesar de este ser o segundo recurso recusado pela Relação, ainda poderá haver reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça, mas essa “é uma matéria que só poderá ser suscitada e decidida no processo”, esclareceu uma resposta dada ao Observador pelo presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Orlando Nascimento.

Os recorrentes já foram notificados do despacho da Relação e podem apresentar uma reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça ao abrigo do Código do Processo Civil, mas a decisão sobre se o processo passa para a instância superior será tomada no Tribunal de Relação de Lisboa. Até agora, Caixa, CMVM, Banco de Portugal, e também o Ministério das Finanças, têm recorrido contra a ordem para o levantamento parcial do sigilo, argumentando com o risco de consequências negativas para o banco público.

A Caixa está a estudar ainda o despacho, mas fonte oficial refere que o banco vai continuar a defender os seus interesses pelos meios legais. Também a CMVM tenciona reclamar da referida decisão de não admissão do recurso, por considerar que o mesmo foi interposto dentro do prazo legal aplicável, refere fonte oficial.

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Recursos fora do prazo

A decisão, a que o Observador teve acesso, considera que os recursos apresentados por estas três entidades para o Supremo Tribunal de Justiça da decisão — que permitia levantar o segredo profissional para entrega de documentação sobre a Caixa Geral de Depósitos — foram entregues fora do prazo. E como tal, “independentemente, da questão da recorribilidade da decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, os requerimentos de recurso mostram-se interpostos fora do prazo”.

Segundo o despaçho, os recorrentes que interpuseram os recursos ultrapassaram “em muito o prazo de 15 dias que, em nosso entender, se impunha para o efeito (…) atendendo à natureza urgente do presente incidente, que como tal, foi distribuído e assim processado neste tribunal”. Daí a decisão da Relação de indeferir esses recursos.

Esta decisão surge dias antes de serem retomados os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito à recapitalização da Caixa que foram suspensos até 5 de maio, em parte para permitir que os documentos pedidos pelos deputados fossem entregues.

Em causa está o pedido de informação que inclui dados sobre a evolução e reestruturação dos créditos dos maiores clientes devedores que estiveram na origem do reconhecimento de imparidades (perdas) pela Caixa Geral de Depósitos e que contribuíram para as necessidades de recapitalização do banco. Entre a documentação pedida, constam auditorias ao banco, inspeções feitas pelo Banco de Portugal e relatórios da comissão de auditoria interna da CGD.

A comissão de inquérito recorreu aos tribunais perante a recusa da Caixa, do Banco de Portugal, da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e do Ministério das Finanças de entregarem documentos e informação sobre a situação de créditos e clientes, invocando o sigilo bancário e de supervisão. A decisão da Relação que autorizou o levantamento parcial do sigilo, mas que excluindo a troca de correspondência entre supervisores, banco e Governo, é considerada inédita e pode fazer jurisprudência para futuros inquéritos parlamentares.

Todas as entidades visadas, tal como o Ministério das Finanças, contestaram este levantamento parcial do sigilo profissional e de supervisão, tendo alertado para as graves consequências da quebra do segredo que protege informação confidencial e sensível do banco e dos seus clientes. O Ministério considerou mesmo que o cumprimento do acórdão da Relação que autoriza o levantamento parcial desse sigilo pode ter consequências sistémicas e implicar uma perda de confiança irreversível para o banco público.

Finanças. Revelar informação sigilosa da Caixa pode implicar quebra de confiança irreversível