O Brexit tem impacto na indústria do vinho português?

“O comércio internacional de vinhos é uma incógnita e tudo o que se falar é especulação.” Jorge Monteiro, presidente da ViniPortugal, não arrisca fazer prognósticos, nem mesmo depois do Reino Unido ter votado para sair da União Europeia em junho de 2016. “Sinto que o setor dos vinhos está expectante, mas sem ansiedade”, continua. Apesar de não querer lançar cartas ou dar aso a hipóteses sobre como o setor se poderá vir a comportar, Jorge Monteiro deixa ficar uma ideia interessante: “A saída da União Europeia pode ser vista pelo Reino Unido como uma oportunidade para o desenvolvimento da própria indústria. Assim que saírem, poderão plantar castas à vontade”, diz, referindo-se às regras impostas pela UE que ajudam a delimitar a produção de vinho à escala europeia.

A produção de vinhos no Reino Unido — que para alguns poderá sugerir uma reação de surpresa — é recente, mas já vão sendo dadas cartadas ao nível dos brancos e dos espumantes. “As alterações climáticas estão a deslocar as fronteiras do vinho”, atira Jorge Monteiro, para explicar que no futuro as condições de produção de países que hoje não são conhecidos pelo vinho poderão otimizar-se. Quanto aos países que já têm presença assídua no mapa vitivinícola, o presidente da ViniPortugal fala na eventual necessidade de haver “mais controlo e regulação na produção, o que equivale a mais custos”. “A água vai ser um fator crítico e o recurso à régua inevitável.”

Quais são os principais mercados para 2017?

A pergunta pode, de alguma forma, parecer menos interessante, mas o mesmo não se pode dizer da resposta. Se por um lado Portugal vai “abandonar” Singapura, tida como uma plataforma, no sentido em que metade do que entra no país é escoado para outros destinos, há novos mercados a assinalar. Japão, Coreia do Sul, Taiwan e China (Hong Kong e Macau incluídos) são mercados onde Portugal está a começar a investir ou a reforçar envelopes de investimento. Suíça é um mercado para continuar e Rússia é, nestes parâmetros, uma estreia absoluta.

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Enquanto a China é descrita como “um mercado emergente e um dos maiores importadores mundiais de vinho”, no Japão, onde o comércio do vinho é mais maduro, existe muita apetência por conhecimento dentro do setor — há 30 mil escanções no país — e um especial apreço pela cultura e vinhos nacionais. “Na China somos um país desconhecido. Os japoneses estão mais atentos aos nossos vinhos.”

Qual a perceção do vinho português além-fronteiras?

Desde de 2004 que Portugal tem vindo a crescer nas exportações mundiais de uma forma “muito consistente”. Isto sem contar com uma “ligeira queda” em 2008, devido à crise que assolou o país e o mundo. Dito isto, desde 2016 que os Estados Unidos da América representam o primeiro destino de vinho mesa português, um pódio cedido por Angola, que agora enfrenta uma crise económica. Em 2016, os EUA exportaram 74,8 milhões de euros em vinho português.

França, é certo, continua a ser o primeiro destino de vinho nacional no total, mas apenas porque na balança ainda pesam as exportações do Vinho do Porto. E apesar de Portugal ser o 9.º operador global no comércio internacional, o crescimento nas exportações, assinalado por Jorge Monteiro, tem mascarado “alguma estagnação nas exportações de Vinho do Porto”.

O que se passa com o Vinho do Porto?

“O problema não é o Vinho do Porto é a categoria em si”, explica Jorge Monteiro. Quer isto dizer que o mercado mundial de vinhos licorosos ou fortificados, como o nacional Vinho do Porto ou o vizinho ibérico Xerez, não cresce e até apresenta “sinais de retração”. O problema é global, embora se note outra tendência: do ponto de vista do volume o setor do Vinho do Porto sofre uma retração, no entanto, há uma deslocação clara do consumidor para as categoriais especiais.

Vinho do Porto. O novo cálice da juventude?

Porque é que importamos vinho de Espanha?

“Exportamos 47% dos vinhos que produzimos, sendo que os melhores vinhos são exportados”, afirma Jorge Monteiro, para depois explicar que Portugal importa vinhos de menor qualidade para suprir uma falha no mercado nacional (considerando vinho engarrafado e vinho a granel). Existe, portanto, um “défice crónico entre o que produzimos, consumimos e exportamos”, continua. Apesar de Portugal ter um grande mercado doméstico, existe uma carência ao nível de vinhos que correspondem à chamada entrada de gama.

Como é que Portugal se deve vender lá fora?

“As empresas têm de deixar de ser monoregionais”, atira o presidente. Portugal, recordemos, pode ser um país geograficamente pequeno mas, no que ao vinho diz respeito, é de uma diversidade imensa: tem 14 regiões produtoras de vinho, todas diferentes entre si, e várias Denominações de Origem Controlada (DOC). “Um dos fatores de sucesso no comércio internacional é o facto de as empresas terem uma gama alargada, com várias categorias do produto, além de exportarem para diferentes segmentos. Têm vinhos que vão da entrada de gama aos topos de gama”, comenta, referindo que, segundo estudo internacionais que apontam nesse sentido, é preciso “abandonar alguma especialização regional”. “Nós já somos o país da diversidade!”