João Paulo II teve um papamóvel português, em 1991, no Funchal, mas só andou no jipe UMM transformado e pintado de branco porque a diocese madeirense escondeu num armazém a viatura vinda de Roma.

A história desta operação quase secreta, deste braço de ferro com as autoridades de Lisboa é contada pelo bispo do Funchal, Teodoro de Faria, no livro “João Paulo II – Pastor Universal na Madeira”, que descreve como o Governo de então ameaçou não garantir a segurança do papa se a diocese insistisse em usar o carro português.

Mas no dia em que João Paulo II chegou ao Funchal tudo correu bem. A segurança papal aceitou que Karol Woytila andasse no jipe português, por ser perfeitamente seguro, e a diocese não teve de pagar os 10 mil contos (50 mil euros) exigido pela marca se o papa não usasse aquela viatura na Madeira.

É esta a história do até agora único papamóvel português, encomendado pela Diocese do Funchal para transportar João Paulo II durante a sua visita à Madeira, a 12 de maio de 1991, e que ainda hoje é exibido em dias festivos.

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A viatura fora encomendada à então representante da Peugeot em Portugal, a Mocar, depois de a diocese do Funchal ter recebido a informação de Roma de que não seria possível enviar o papamóvel para a visita a Portugal. O Vaticano remeteu à Diocese do Funchal as características de segurança exigidas para a viatura (“uma estrutura blindada e cabina à prova de bala prova de bala, de forma que o Santo Padre, do interior pudesse ver e abençoar os fiéis que o esperavam ao longo da estrada”).

O conflito com Lisboa começou quando as autoridades portuguesas conseguiram obter do Vaticano um papamóvel para todas as deslocações de João Paulo II em território português, de Lisboa, aos Açores, Madeira e Fátima, uma vez que a Diocese dos Açores não dispunha de viatura adequada.

No seu livro, Teodoro de Faria recorda que comunicou então a Lisboa que, face a indicações anteriores, tinha providenciado uma viatura, a qual seria usada durante a curta estada no Funchal, fornecendo as especificações de segurança que tinham sido cumpridas, seguindo as exigências do Vaticano.

A resposta de Lisboa foi negativa: considerava que a viatura não era segura, pelo que o papamóvel seguiria dos Açores para a Madeira e da Madeira de volta para o continente, de modo a ser usado em Fátima, o que significaria, recordou o bispo, que a Diocese teria de pagar 10 mil contos por uma viatura inútil, o que seria incomportável.

“Neste momento, criou-se um braço de ferro entre Lisboa e a diocese do Funchal. Comunicaram-me que, se não optasse pelo carro do Vaticano, seria o bispo do Funchal responsável pela segurança do Papa e não o governo português. Escrevi para o Vaticano que me informaram ser o nosso papamóvel seguro e cumpria todas as condições, até melhores do que viera do Vaticano”, escreve.

Depois de consultado o Governo Regional e as autoridades locais de segurança, o bispo do Funchal decidiu não responder, deixando no ar a incerteza sobre se tinha ou não aceitado a exigência de Lisboa. Tal como tinha sido anunciado, o papamóvel do Vaticano foi entregue no aeroporto de Santa Catarina, no Funchal, na manhã do dia 12 de maio, horas antes da chegada de João Paulo II à Madeira.

“Foi colocado e fechado num armazém, nada se comunicou a Lisboa e, quando o Santo Padre chegou à Madeira, entrou no papamóvel do Funchal. Os membros da polícia do Vaticano disseram-me que o papamóvel cumpria todas as regras de segurança. Quando o Papa entrou e se sentou, disse-me e ao seu secretário para abrirmos a janela para ver, acenar e abençoar o povo. Desta forma ficamos com um papamóvel gratuito”, revela Teodoro de Faria.

De tal modo era seguro que a Diocese do Funchal emprestou a viatura para ser utilizada na visita de João Paulo II a São Tomé e Príncipe, de 4 a 10 de junho de 1992. O papamóvel português ainda está ao serviço: foi utilizado para transportar a imagem da Virgem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima na visita efetuada à Madeira entre 2009 e 2010.