Uma. Duas. Três. Quatro. Cinco. Ufa, será impossível? Durante quatro décadas, entre os anos 30 e 70, o Benfica andou atrás do objetivo do tetracampeonato. Depois, por contingências internas e o aparecimento de um outro FC Porto versão Pinto da Costa, andou arredado dessas lutas. Podia ter sido o primeiro entre grandes a atingir essa meta, agora ainda anda a percorrer o caminho para o alcançar. Este sábado, uma vitória com o V. Guimarães, na Luz, pode finalmente quebrar essa malapata: valerá o quarto Campeonato consecutivo.

Mas o que falhou nas outras ocasiões para que esse cenário só agora se colocasse de forma tão real? Fomos fazer uma visita histórica aos livros e jornais das épocas para perceber o constante adiamento, por “culpa” de Sporting (três vezes) e FC Porto (duas ocasiões). E, aparentemente, não existem pontos de contacto com o filme deste ano.

1938/39. O golo anulado e a festa que se fez na mesma

O FC Porto ganhou a primeira versão do Campeonato Nacional, mas cedo o Benfica percebeu como ganhar o gostinho pelas vitórias na competição e, vai daí, arrancou uma série de três títulos consecutivos. Em 1938/39, ainda assim, não conquistou o tetra. Por uma nesga. Martins ganhou o lugar a Amaro na baliza; Brito e Barbosa entraram para os lugares de Xavier e Domingos Lopes; Fernando Ferreira foi um reforço de peso. O treinador, esse, continuou a ser o mesmo, o húngaro Lipo Herczka. Mas o sonho acabaria por ruir na última jornada.

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O Benfica deu algumas “goelas” inesperadas até às últimas jornadas: perdeu com o Belenenses em casa (3-4), empatou no Barreiro (1-1) e em Coimbra (3-3), foi goleado no Campo das Amoreiras pelo Sporting (1-4) num encontro onde até Gaspar Pinto falhou um penálti. Depois, acertou o passo. E tudo ficou decidido no derradeiro jogo, no Campo da Constituição, contra o FC Porto. Foi uma partida de nervos, com os encarnados sempre atrás do resultado: António Santos inaugurou o marcador aos 2′, Rogério empatou aos 7′; Costuras fez o 2-1 aos 44′, Brito repôs a igualdade aos 47′; António Santos apontou o 3-2 aos 61′, Brito marcou o 3-3 aos 62′. No penúltimo minuto, o árbitro invalidou um golo ao Benfica, perante os protestos das águias. E o que poderia ter resultado num primeiro lugar (se o Sporting escorregasse), redundou numa terceira posição. Ainda assim, o clube não deixou de fazer uma festa de homenagem pela temporada… sem conquistas.

1965/66. Nem Bela Guttmann quebrou a maldição

Parecia impossível alguém parar este Benfica. O Benfica de Eusébio, de Simões, de Torres, de José Augusto, de Coluna, de Cavém, de Costa Pereira, de Germano, de tantos outros. Era uma verdadeira equipa de sonho, “reforçada” no início da época quando o presidente António Catarino Duarte foi buscar de novo Bela Guttmann, o húngaro que tinha comandado os encarnados nas duas vitórias na Taça dos Clubes Campeões Europeus, em 1961 e 1962.

No entanto, parece que se virou o feitiço contra o feiticeiro: o técnico que um dia disse que, sem ele, não mais o Benfica ganharia a Taça dos Clubes Campeões Europeus também não fugiu à maldição do tetra. Pior: em 1966, oito anos depois, as águias não conquistaram nenhum troféu. Qual foi o maior problema? A irregularidade. Logo à quinta jornada, um póquer de Lourenço deu uma vitória por 4-2 do Sporting na Luz; na segunda volta, Eusébio e Torres vingaram o desaire em Alvalade (2-0). A luta estava taco-a-taco e os encarnados passaram mesmo para a frente quando, a cinco rondas do fim, os leões empataram no Restelo. No entanto, logo a seguir, o Benfica perdeu em Guimarães e empatou sem golos em Braga. Tudo acabou no Minho e o Sporting é que dançou o vira.

1969/70. Tudo correu mal: sem Glória, nem a moeda ao ar ajudou

Fernando Riera começou, Otto Glória acabou e estava conquistado mais um tricampeonato. No entanto, estava a estabelecer-se uma moda: o Benfica ganhava três seguidos, o Sporting conquistava um. E assim foi em 1970, no ano em que tudo aconteceu mas, espremido, só sobrou de bom a Taça de Portugal e a renovação de Eusébio. Nem o próprio técnico brasileiro, um dos melhores de sempre, conseguiu terminar a temporada.

O Campeonato começou mal, logo com uma derrota em Matosinhos com o Leixões (0-2). A redenção veio nas jornadas seguintes, mas as derrotas fora com Sporting (0-1), V. Setúbal (0-1) e V. Guimarães (1-2), além do empate no Barreiro (2-2), deixavam o título mais longe até janeiro. Pelo meio, surgiu a eliminação da Taça dos Clubes Campeões Europeus com o Celtic… por desempate por moeda ao ar. O problema maior, esse, veio à 16.ª jornada: revoltados com as expulsões de Torres e Malta da Silva ainda antes do intervalo, os adeptos encarnados invadiram o relvado, o jogo foi interrompido e a Luz foi interditada por oito jogos. Numa época em que o FC Porto terminou no nono lugar, a segunda posição no Campeonato, a oito pontos dos leões, foi um mal menor.

1973/74. E como não há duas sem três em ano de Mundial…

Ano de mais um Mundial, ano de quebrar de novo a hegemonia do Benfica… após três Campeonatos consecutivos. E, neste caso, como tinha acontecido na década de 60, os encarnados quebraram mesmo um ciclo de oito anos seguidos onde ganharam sempre pelo menos um título. Mais uma vez, quando nada o fazia antever. Até setembro.

O Benfica voltou a perder na primeira jornada, no Bessa (0-2), ganhou ao Leixões (3-0) e ao Belenenses (2-1) e… Jimmy Hagan saiu. Não por resultados, mas devido a uma confusão que se levantou após ter proibido Toni, Humberto Coelho e Nelinho de participarem na festa de homenagem a Eusébio. Foi uma festa em grande e mais um ano de sucesso para o goleador, mas não para a equipa, que passou a ser comandada por Fernando Cabrita. A vitória em Alvalade por 5-3, quando ficavam a faltar apenas quatro jornadas para o final do Campeonato, deixou tudo em aberto até ao final, mas, mais uma vez, os leões foram campeões em ano de Mundial.

1977/78. Não perder um jogo sequer e falhar o objetivo

É um fenómeno raro, raríssimo mesmo a nível mundial: uma equipa não ser campeã sem perder nenhum jogo. Mas foi isso que aconteceu com o Benfica em 1978, depois de mais três triunfos seguidos no Campeonato. A única diferença foi mesmo o vencedor, que seria o FC Porto e não o Sporting. José Maria Pedroto, que tinha estado no último título dos dragões quase 20 anos antes como jogador, ganhou também como treinador.

No segundo ano do inglês John Mortimore, o Benfica dobra a primeira volta com dois pontos de vantagem e arranca uma vitória preciosa na receção ao Sporting por 1-0, com um golo de Vítor Batista, que perdeu o brinco a festejar e fez com que o jogo estivesse parado. No entanto, os nulos seguintes no Restelo e na Póvoa do Varzim entregaram a liderança ao FC Porto, por causa da diferença de golos. O clássico nas Antas seria decisivo, mas o empate a um, com um golo do portista Ademir a sete minutos do final, quase sentenciou a conquista dos azuis e brancos.