Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), diz que o ano de 2016 foi um ano de “muito trabalho, a arrumar a casa”, para reforçar os capitais dos bancos, devolver empréstimos públicos e reconhecer imparidades de crédito, mas está confiante de que 2017 é o ano do início da recuperação do setor. Ainda assim, vai manter-se a dificuldade em gerar rentabilidade e a cobrança de comissões será, como é “legítimo e normal” uma das formas de tentar sair da crise que abalou o setor nos últimos anos. Os bancos têm aumentado as comissões, mas o presidente da APB sublinha que existe concorrência e que cobrar comissões é normal “em qualquer atividade económica, na prestação de qualquer serviço e na disponibilização de uma rede, como a luz, as telecomunicações ou a água”. O que houve nos últimos foi, diz o presidente da APB, uma “subsidiação” das comissões.

As declarações foram proferidas num encontro com jornalistas, esta tarde, em Lisboa, uma espécie de ponto de situação sobre o setor bancário em Portugal. Apesar de sublinhar que a cobrança de comissões, em ambiente concorrencial, é algo “legítimo e normal”, o presidente da APB começou por sublinhar que, apesar das notícias de que as comissões estão a aumentar, no ano passado houve uma quebra de mais de 12% nas comissões líquidas cobradas pelos bancos em Portugal, a julgar pelas contas das instituições. Passou-se de um total de 3,1 mil milhões de euros para 2,7 mil milhões, segundo um quadro distribuído pela APB.

Ainda assim, a ideia que Faria de Oliveira quis sublinhar é que existe alguma incompreensão em torno do tema das comissões porque, “durante muito tempo, um período longuíssimo, os resultados dos bancos e a margem financeira [a diferença entre o que o banco cobra em juros e o que paga pelos recursos que empresta, além de outros ganhos operacionais) era suficiente para que tivéssemos uma subsidiação das comissões. Com uma margem financeira menor, houve necessidade de fazer olhar para as comissões como fonte de receitas de forma a que desse um contributo maior para os resultados”. Ou seja, por outras palavras, não se trata de cobrar mais pelos serviços mas sim de ter de cobrar valores que permitam, de forma mais próxima, compensar os custos de estrutura e os gastos que os bancos têm com a disponibilização da infraestrutura, seja balcões ou taxas de multibanco, por exemplo.

Além disso, Faria de Oliveira diz que em Portugal se paga pouco em comissões, comparativamente com a maioria dos países europeus. “O sistema bancário português posiciona-se, nesta matéria, muito favoravelmente, apesar de ser dos setores bancários com maior pressão sobre a rentabilidade”, acrescentou.

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“Estamos sempre a atirar acusações significativas ao sistema bancário mas temos de comparar com as taxas de acesso às redes que são cobradas nos mais diferentes setores de atividade”, afirmou Faria de Oliveira, enumerando os exemplos da eletricidade, das telecomunicações, na água, no gás, etc”.

Os custos das contas à ordem estão cada vez mais altos, alertou recentemente a associação de defesa do consumidor Deco, num estudo em que concluiu que as tradicionais isenções desapareceram mesmo nas contas-ordenado de grandes bancos. “Os bancos passaram a encarar as contas-ordenado como a nova galinha poedeira, capaz de lhes render um fluxo ininterrupto de ovos de ouro”, lê-se na edição de março da revista Dinheiro & Direitos, que admite que a recomendação que dava anteriormente aos seus associados de domiciliarem o ordenado como forma de pouparem em custos bancários deixou em muitos casos de fazer sentido.

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Má solução no Novo Banco? “Resolução foi o pecado original”

Para nós, a decisão de resolução foi o pecado original. A APB, na noite que antecedeu a resolução, teve uma reunião com o Banco de Portugal, outra com o Ministério das Finanças, onde defendeu a utilização da linha de recapitalização da troika, com a justificação formal de que a administração do banco não tinha pedido uma recapitalização, com reestruturação associada etc.”.

Contudo, a justificação que Faria de Oliveira discerne é que os responsáveis estavam confiantes de que iriam conseguir uma venda rápida e a valores próximos do que tinha sido injetado”. O que falhou? “Houve aqui, manifestamente, algum desconhecimento da situação real da carteira dos ativos”.

Agora, com a venda da instituição à Lone Star, em que o Fundo de Resolução conserva 25%, Faria de Oliveira diz que “na solução encontrada, o mecanismo contingente, uma espécie de garantia concedida pelo Fundo de Resolução (do Estado mas responsabilidade dos bancos), pode ir até aos 3,9 mil milhões de euros, o que significa que a exposição dos bancos ao Fundo de Resolução ascende até um máximo de 8,9 mil milhões [cenário pior, em que o mecanismo era ativado na totalidade, ou seja, se as vendas de ativos resultassem em perdas que teria de ser o Fundo de Resolução a cobrir, até 3.900 milhões). É um valor “astronómico”, diz Faria de Oliveira.

Ninguém sabe quanta dessa “garantia” será exercida, portanto ninguém sabe qual será a fatura final para o Fundo de Resolução e para os bancos, que são os contribuintes para esse Fundo. Tudo vai depender da forma como forem vendidos os ativos, mais rapidamente ou mais lentamente, a valores mais elevados ou mais baixos. O que preocupa a Associação de Portuguesa de Bancos é a forma como vai ser gerido o conjunto de ativos que são para vender — “estar a vender sob pressão é sempre pior”. Daí que a APB tenha pedido já “algum tipo de garantia de que no Comité de Monitorização [dos ativos] que vai ser criado estejam verdadeiros experts em gestão de ativos, e pessoas que sejam da nossa total confiança”.