Existiam dúvidas sobre se o recém-lançamento (e sucesso) da Nintendo Switch iria deitar por terra outro grande sucesso recente da Nintendo: a consola portátil 3DS. Ainda no mercado e com “muito para dar”, segundo os seus dirigentes, foi com agrado que vimos mais um grande lançamento acontecer para a 3DS, Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia, ainda que acreditemos que, por razões óbvias, os próximos títulos desta e de outras franquias comecem a ser canalizados para a Switch.

Mas se este Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia é a despedida da emblemática e veterana série da portátil da Nintendo, então aqui fica um adeus condigno, marcando com um portão dourado todos os muito bons jogos que Fire Emblem trouxe para a 3DS.

Lançado em 1990 na NES, Fire Emblem: Shadow Dragon and the Blade of Light marcou uma abordagem atípica da Nintendo: o desenvolvimento de jogos de estratégia tática. Não foi o primeiro jogo do género desenvolvido pela companhia nipónica, mas provou até aos dias de hoje ser a joia da coroa em termos comerciais e críticos.

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O jogo acabaria por ser refeito e a sua história recontada quase 20 anos depois, em Fire Emblem: Shadow Dragon, o que acabou invariavelmente por abrir as portas à chegada deste Shadows of Valentia, um remake de Fire Emblem Gaiden (o segundo jogo da série) de 1992, e que nunca chegou a ter uma versão traduzida no Ocidente.

Em Shadows of Valentia seguimos o tumulto bélico entre duas fações medievais opostas: Zofia e Rigel, “abençoados” respetivamente por dois deuses opostos, Mila e Duma, com pontos de vista distintos sobre o destino da civilização humana. A história do jogo começa especificamente na aldeia onde Celica e Alm, dois jovens amigos que são separados pelo conflito armado que se vive entre os dois reinos.

Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia segue a estrutura habitual dos jogos do género, trazendo para a nossa mão um aprimorado jogo de estratégia e tática de unidades, com um enredo rico e bem construído. É usual sentirmos que a história e os diálogos entre combates, na maioria dos jogos do género, sirvam apenas para encher o espaço intermédio e que pouco ou nenhum sumo seja extraído, mas este jogo prova mais uma vez o contrário.

Começando por Alm e Celica, e passando pelo enredo de largas dezenas de personagens, Fire Emblem volta a contar uma história de guerra com o mesmo balanceamento narrativo que pauta toda a série: a de demonstrar que existem sempre perspetivas opostas e que os conceitos maniqueístas de “bem” e “mal” são muito mais cinzentos do que poderíamos estar à espera à primeira vista.

Do ponto de vista de combate e estratégia em si, e para quem não conhece a série Fire Emblem, toda a ação se desenrola num sistema por turnos num tabuleiro quadriculado. Cada unidade tem forças e fraquezas (num sistema de pedra-papel-tesoura) onde, por exemplo, um espadachim tem vantagem em relação a alguém com um machado, e este com superioridade sobre um utilizador de lança, ainda que uma lança seja mais forte que uma espada.

Movimentamos as unidades como peças de xadrez, das quais temos de conhecer as limitações, seja pelo número de quadrados que podem andar, seja pelas já referidas vantagens e desvantagens. O terreno é um elemento a ter em conta, já que uma quadrícula ocupada por floresta oferece uma defesa superior à do campo aberto. Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia mantém o mesmo desafio mental de sempre, sem nunca baixar a qualidade nas centenas de combates que fazemos.

Como referimos antes, a história e o elenco são um dos pontos fortes de Fire Emblem e é frequente que, no meio do campo de batalha, tenhamos a oportunidade de colocar dois personagens a conversarem um com o outro. Esse diálogo não só desvenda mais detalhes sobre a história como aumenta o relacionamento entre ambos, levando a uma maior eficácia mecânica dos dois personagens no terreno.

De regresso está a possibilidade de jogarmos com um desafio superior e com permadeath ligado. Aqui, perder uma unidade, não significa apenas ver morrer uma peça essencial do nosso exército, como um guerreiro ou um mago. Em Fire Emblem significa perder Lukas ou Faye, ou qualquer uma das dezenas de personagens perfeitamente identificáveis e desenvolvidas. Vê-las perder a vida em combate, se tivermos a permadeath (morte permanente ligada) ativa significa que este é o nosso adeus à personagem e que ele morreu definitivamente no jogo. Este modo, que é o habitual para os jogadores veteranos de Fire Emblem, acentua ainda mais a cautela e a estratégia, em que cada movimento tem que ser refletido e pesado, sob pena de perdermos um personagem ou mais para sempre.

Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia é o adeus da série à 3DS e o recontar de uma história que o público ocidental nunca conheceu da famosa franquia desenvolvida pelo estúdio Intelligent Systems. É o regresso de uma das séries mais cerebrais e táticas da Nintendo e aquela que tem servido, ao longo de quase 30 anos, como uma excelente porta de entrada de muitos jogadores nos jogos de estratégia.

Não fosse o catálogo da 3DS possuir duas iterações sublimes de Fire Emblem nos últimos cinco anos, e facilmente este Shadows of Valentia seria um dos melhores jogos que a consola teria para oferecer. Mas alguma lentidão no desenvolvimento inicial do enredo e o aspecto desinteressante e monótono de muitos dos “tabuleiros” impedem-no de esticar as asas tão alto quanto os seus antecessores.

Um excelente jogo de estratégia, que apesar do tom mais sério de conflito entre duas nações (mas sem qualquer tipo de violência gráfica expressiva) se torna um dos grandes jogos recomendados para toda a família para a 3DS.

Ricardo Correia, Rubber Chicken