Uma equipa internacional de cientistas conseguiu ler o genoma mitocondrial de 90 múmias e analisar parcialmente o ADN nuclear de três delas, anunciou esta terça-feira a Nature Communications. É a primeira vez que os cientistas conseguem estudar a informação genética guardada no núcleo das células de múmias porque o ADN deteriorava-se com o tempo. A análise dessas informações pode trazer novidades sobre a evolução humana.

Estes dados foram conseguidos depois de a equipa ter estudado 151 múmias da necrópole de Abusir-El Meleq, entre o Cairo e Luxor. Todos os cadáveres pertenciam a homens de classe média que tinham entre 20 e 30 anos e que viveram entre os tempos do Império Novo (época da história do Antigo Egipto entre 1550 a.C. e 1 070 a.C.) e os tempos em que o Egipto esteve nas mãos do Império Romano. Esse período abarca 1300 anos da História do mundo. Duas das múmias “tinham pele clara, olhos escuros e eram intolerantes à lactose” mas, quanto à terceira múmia, os cientistas não conseguiram averiguar quais eram as suas características físicas. O estudo sugere ainda que estas múmias são geneticamente mais parecidas com as pessoas do Oriente Próximo (Iraque, parte do Irão, parte da Turquia, Síria, Líbano e Israel) do que com os atuais egípcios, que são mais parecidos com os “africanos subsaarianos dos tempos mais recentes” provavelmente porque se cruzaram com escravos dessa região.

Estas conclusões foram possíveis porque os cientistas utilizaram uma técnica que lê o ADN “letra a letra”, ou seja, gene a gene. Comparando os genes destas múmias aos genes de outras mais antigas, como a do faraó Tutancámon, é possível descobrir as semelhanças e diferenças entre os diferentes genomas e perceber como evoluíram com o tempo. Esta não é uma tarefa fácil: primeiro, porque depende da autorização do governo para a extração de amostras de células das múmias mais antigas; e depois porque essas amostras costumam estar contaminadas pelos produtos usados para o embalsamento ou podem deteriorar-se com a temperatura ou a humidade.

Os resultados deste estudo ainda não foram alvo de análise pela comunidade científica, mas as técnicas utilizadas foram diferentes. Neste caso, foram estudados mais genes do que em todos os estudos mais antigos. Além disso, as amostras de ADN da pele ou músculo (a maior parte dos outros cientistas escolhe estes órgãos porque são os que parecem mais preservados nas múmias). Esta equipa retirou amostras dos ossos e dos dentes e garantem ter obtido “melhores resultados”.

Há 30 anos que os cientistas tentavam encontrar amostras viáveis de ADN de múmias: a primeira extração de uma amostra das células de uma múmia foi feita por Svante Paabo, grande especialista em múmias, em 1985. A extração mais recente aconteceu em 2010 na múmia de Tutancámon, mas os resultados científicos não foram aceites pela comunidade científica, porque as técnicas utilizadas para conseguir as amostras de ADN seriam “pouco adequadas”, justificaram os cientistas. Segundo Wolfgang Haak, cientista do Instituto Max Planck da História Humana, este é “o maior estudo genético de múmias egípcias” alguma vez realizado.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR