José Carlos Luz é o primeiro português com um dispositivo conhecido por “coração artificial”, que inicialmente recusou, mas ao qual sabe hoje que deve a qualidade de vida que recuperou.

Três meses após ser notícia por se tornar no primeiro português a receber um dispositivo de assistência circulatória interno, conhecido por “coração artificial”, José Carlos Luz contou à agência Lusa que inicialmente recusou a proposta da equipa médica, por recear a intervenção e porque não existia outro em Portugal.

A doença que o acompanha há 30 anos chama-se cardiomiopatia dilatada, à qual mais tarde se juntou uma diabetes e uma insuficiência renal, um quadro clínico que o obrigou a “internamentos sucessivos” e que o impossibilitava de receber um transplante.

“O meu coração estava muito debilitado e tinha pouco tempo de vida”, disse. A proposta de receber um “coração artificial” chegou pelo cirurgião cardiotorácico José Fragata, do Hospital de Santa Marta (Centro Hospitalar de Lisboa Central).

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“Como tenho 65 anos, em princípio hesitei. Tive aquele receio, agradeci na mesma, mas a resposta foi um não”.

Passado uns dias, uma crise muito grande causou-lhe falta de ar e José Carlos Luz perdeu a mobilidade. Decidiu, com a mulher, aceitar a proposta de José Fragata. Da operação nada se lembra, recordando apenas as dificuldades dos primeiros tempos pós-operatório, cuja adaptação custou “um bocado”. “Consegui estabilizar a diabetes e a função renal. Foi mais demorado, porque eu tinha vários problemas, mas agora já consegui assinalar que foi bom para mim, uma vez que estou a sentir grandes melhoras. Já ando e não me canso”, contou.

Sobre o aparelho — uma bomba muito diferenciada, que funciona por levitação magnética, aspira o sangue da ponta esquerda do coração e injeta na aorta — José Carlos Luz reconheceu que no início faz confusão a ligação às baterias e os alarmes. Isto porque o dispositivo ligado por uma ‘drive line’ que sai pela parede abdominal do doente liga-se a um conjunto de baterias durante o dia. À noite, a ligação faz-se a um carregador que está ligado à eletricidade e garante o seu funcionamento.

“Causa-nos um bocadinho de pânico aparente, mas depois adaptamo-nos facilmente”, declarou. Para tal também contribuiu a mulher e a família que receberam “uma formação”, seja de como fazer o penso, como a tratar com a parte da tecnologia e do equipamento.

O doente só mais tarde soube do alarido que esta intervenção pioneira em Portugal causou. Mas já o tinha previsto, pois sabia que ia ser “o primeiro”. E hoje tem consciência de que esta intervenção é também uma esperança para os outros: “Uma pessoa, no estado em que eu estava era muito difícil, com falta de ar, em momentos de crise, sem forças para por os braços no ar para agarrar o chuveiro na altura do banho”.

“Felizmente agora já tomo banho sozinho, quase normal”, disse, lembrando que o “coração artificial” devolveu-lhe os movimentos, estabilizou a insuficiência renal, pois estava a um passo de ter de fazer hemodiálise, o que já não é necessário, além de controlar a diabetes.

Agora, “é tempo da reabilitação, com vários exercícios como tapete, alongamento, andar de bicicleta. Custa-me um bocadinho, por causa da idade, mas tenho de fazer, para o meu bem”. José Carlos Luz juntou-se às 1.200 pessoas que em todo o mundo receberam um coração artificial desta geração e que chegam a viver mais 11 a 12 anos.

Cada dispositivo custou 100 mil euros, sendo obrigatória a aquisição de dois, num total de 200 mil euros. A este valor acrescem os 7 mil euros que, por norma, custam a produção por doente nesta unidade de saúde.