O ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, reiterou esta quarta-feira que a medida que obriga os hospitais a cortarem em pelo menos 35% nos gastos com a contratação de médicos tarefeiros externos ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) não vai provocar rutura nos hospitais. Os comunistas, no entanto, exigem saber mais: como vai o Governo proceder à substituição os profissionais temporários por trabalhadores dos quadros?

Numa nota enviada à comunicação social, o PCP defende que este corte nos gastos com médicos tarefeiros “tem de ser acompanhada do aproveitamento dos recursos do SNS e da contratação de mais profissionais” e assegura: “O PCP em nenhum momento aceitará medidas, que determinadas por razões orçamentais ou outras, se traduzam na degradação do Serviço Nacional de Saúde e no comprometimento da concretização do direito à saúde dos portugueses.”

Lembrando que no Orçamento do Estado para 2017, o PCP e o Governo acertaram o fim gradual dos contratos com empresas de subcontratação de profissionais de saúde e a contratação de novos quadros, os comunistas perguntam, volvidos seis meses depois da entrada em vigor do Orçamento, os comunistas perguntam: “Quantos contratos com empresas de trabalho de temporário foram rescindidos” no SNS e “quantos profissionais de saúde foram contratados para substituir as empresas de trabalho temporário”?

O tema acabou por ocupar parte da audição parlamentar de Adalberto Campos Fernandes. Perante os deputados, o ministro da Saúde voltou a garantir, tal como fizera na terça-feira, que a norma de execução orçamental aprovada prevê a substituição de “despesa que é considerada menos útil” para compensar a reposição do pagamento das horas extras aos “profissionais que estão dentro do sistema e para contratar mais profissionais”.

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Sem adiantar grandes detalhes sobre de que forma vai ser conduzido este processo de substituição dos profissionais de saúde temporários por efetivos, o ministro de Saúde assegurou que todos os casos vão ser tratados com ponderação, atendendo ao número de médicos que estão nos quadros. Ainda assim, insistiu Adalberto Campos Fernandes, é urgente acabar com um “péssimo modelo” que alimenta “leilões” e “tráficos” entre empresas de prestação de serviços que custam ao erário público “rios de dinheiro”.

Recorde-se que, tal como explicou ao Observador Mário Jorge Neves, presidente da Federação Nacional dos Médicos, “há médicos tarefeiros a ganhar quatro a cinco vezes mais que os médicos integrados no SNS”. No ano passado, a despesa com os médicos tarefeiros rondou os 100 milhões de euros, sendo ainda superior à de 2015.

Adalberto Campos Fernandes lembrou ainda que “até ao final do semestre, irão finalmente ser colocados os 774 enfermeiros” e deu garantias de que, em breve, vão ser lançados os concursos que visam integrar ainda este ano mais 1.200 médicos no Saúde, entre profissionais de medicina geral e familiar e de especialidades hospitalares.

As explicações do ministro sobre este corte de 35% na contratação de médicos tarefeiros — que não era o objeto da comissão parlamentar — não convenceram os deputados de PSD e CDS. O social-democrata Miguel Santos acusou mesmo o Governo de “ter sido incapaz de acautelar a reposição das 35 horas” e de estar agora “a cortar a eito”.

Isabel Galriça Neto, do CDS, por sua vez, sugeriu que o Governo, e em particular o Ministério da Saúde, vive mergulhado num “clima de social-otimismo” em que “finge que está tudo bem”, apesar das “dívidas crescentes e das limitações orçamentais”, impostas a partir do Ministério das Finanças.

A estas críticas, o ministro da Saúde garantiu que “não existe” qualquer condicionamento do Ministério das Finanças e assegurou “solidariedade total dentro do Governo”. “Trabalho muito bem com o senhor ministro das Finanças”, rematou Adalberto Campos Fernandes. Ainda assim, o governante admitiu que o país, e por maioria de razão o Governo, não está a “navegar numa fartura de dinheiro” nem em condições de o “esbanjar”, o que obriga a um “exercício orçamental de grande competência”.

Quando ainda decorria a audição de Adalberto Campos Fernandes no Parlamento, os deputados do PSD eleitos por Santarém fizeram chegar uma nota à agência Lusa onde acusam o Governo de ter “tirado o tapete” aos administradores hospitalares e de pôr em risco serviços nos hospitais da região com o corte de 35% nas contratações.

Em comunicado, os deputados Nuno Serra, Duarte Marques e Teresa Leal Coelho declaram a sua “indignação” e “protesto pelos novos cortes de 35% nas contratações na área da saúde, que colocam em causa diversos serviços dos hospitais do distrito” (Santarém e Centro Hospitalar do Médio Tejo, CHMT, que integra as unidades de Torres Novas, Tomar e Abrantes).

“Com esta decisão, o ministro da Saúde tira literalmente o tapete aos administradores hospitalares que ainda recentemente, ao lado da tutela, anunciaram novos serviços que afinal não vão passar do papel. A manter-se este despacho, esses anúncios, não passaram de manobras de propaganda em tempo de eleições autárquicas”, afirmam.

Por isso, os deputados “exigem a revogação imediata do despacho em causa” e afirmam que, no debate do Orçamento do Estado para este ano, “bem avisaram que a verba destinada aos hospitais do distrito não era suficiente para as despesas previstas”.

Na terça-feira, e em declarações ao Observador, Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Advogados, também criticou a decisão do Governo e não deixou espaço para dúvidas: “É óbvio que vai existir falta de médicos“.

Bastonário avisa Governo: “É óbvio que vai existir falta de médicos”