Depois de suceder a David Cameron sem ir a votos, Theresa May convocou eleições para testar a sua força nas urnas e reforçar o seu mandato como primeira-ministra britânica. Mais importante: a líder dos Conservadores foi a votos para fortalecer a sua autoridade (interna e externa) como grande negociadora do Brexit. Os resultados estão à vista e não há grande margem para outras conclusões que não uma: depois de perderem a maioria absoluta, os tories saem muito fragilizados destas eleições. E a grande responsável por isso é May. O que deixa uma pergunta: depois do tropeção eleitoral, já se afiam facas no Partido Conservador?

A questão da sucessão de Theresa May tem merecido algum eco da comunicação social britânica, ainda que os primeiros sinais apontem para a continuação da conservadora à frente do partido. Basta ler o que vão escrevendo a BBC, a ITV ou a Sky News, por exemplo, que, na ressaca das eleições, já garantiram que May não se vai demitir. Ninguém se arrisca a dizer que a carreira política de May termina esta sexta-feira, mas há quem coloque a discussão noutros termos: pode não ser hoje, nem amanhã, mas é uma questão de tempo até May ser afastada.

Continuando ou não à frente do partido, há palavras que voltarão para assombrar a líder do Conservadores. Quando tudo ainda apontava para uma vitória sólida dos tories, a primeira-ministra foi clara: “Se perder seis assentos parlamentares, significa que perdi as eleições e que Jeremy Corbyn vai sentar-se para negociar [o Brexit] com os Presidentes, os chanceleres e os primeiros-ministros de toda a Europa”. Numa altura em que ainda não são conhecidos os resultados oficiais, Theresa May não perdeu só seis lugares, mas pelo menos 12 assentos parlamentares. E as bases do partido agitam-se à procura de um sucessor.

Num plano teórico, Boris Johnson, ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, seria o melhor colocado para suceder a Theresa May — ele que foi um dos principais rostos da campanha pelo Brexit que dividiu o Partido Conservador e resultou na demissão de David Cameron.

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De resto, o antigo mayor de Londres chegou a ser apontado como possível sucessor de David Cameron, mas acabou por afastar-se da corrida quando foram conhecidos os resultados do referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia.

Resta saber o que fará agora. Segundo os relatos da imprensa britânica, quando foram conhecidas os primeiros resultados destas eleições, Boris Johnson fez uma intervenção curta, saiu de cena rapidamente e celebrou a vitória de pirro dos Conservadores com uma daquelas frases que em política estão carregadas de veneno: “Ainda é muito cedo para comentar”. Até ao momento, ainda não se ouviu mais nada de Johson — e todos os silêncios contam.

Numa segunda pista corre Philip Hammond, ministro das Finanças do Reino Unido. Como escreve o The Telegraph, o conservador manteve-se praticamente invisível durante a campanha eleitoral, mas é tido como alguém em quem as bases do partido podem confiar para trazer alguma estabilidade (e previsibilidade) ao Reino Unido — características que Boris Johnson manifestamente não tem.

Amber Rudd, ministra do Interior britânica, é outro dos nomes apontados para suceder a Theresa May. E dela não se pode dizer que tenha tido um papel invísivel nas eleições britânicas: estrela em ascensão nos tories, Rudd fez campanha ao lado da primeira-ministra britânica.

Mas, tal como Theresa May, Amber Rudd terá sempre um problema de discurso político. Em plena discussão sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia, esta antiga jornalista — que trabalhou depois na área da gestão de capital de risco — foi uma feroz defensora do remain. E, tendo tido um papel de destaque nesta campanha eleitoral, será sempre responsabilizada pela perda da maioria absoluta no Parlamento britânico.

Como ministra do Interior (ou da Administração Interna), tem outro desafio: durante a campanha eleitoral, e na sequência do ataque em Manchester, Amber Rudd foi uma das visadas pelas críticas de Jeremy Corbyn. O trabalhista acusou o Governo conservador de ter demitido cerca de 20 mil polícias e pediu mesmo a demissão de May — algo desmentido prontamente pela primeira-ministra. Rudd, no entanto, terá de lidar com essa herança.

A título de curiosidade, o The Telegraph recupera algumas palavras de Amber Rudd sobre Boris Johnson. Em pleno debate sobre o Brexit, a conservador teve uma tirada curiosa: “Boris é a vida e a alma do partido, mas não é o homem que queres que te conduza para casa no final da noite.”

Há ainda um outro candidato a sucessor de May: David Davis, o ministro que tutela a saída do Reino Unido da União Europeia. Tido como o eterno candidato a líder dos conservadores, a verdade é que o governante é há muito um defensor convicto do Brexit — ainda antes do termo ser cunhado, como lembra o The Telegraph.

Com o processo formalizado, Davis tem conseguido, naturalmente, mais destaque no Partido Conservador e tem um trunfo que apenas partilha com Boris Johnson: os dois fizeram campanha pela saída do Reino Unido da União Europeia, ao contrário da ala liderada por Theresa May, Amber Rudd e, antes, por David Cameron. Ainda assim, é tido como um outsider.