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10 de Junho. O que Marcelo disse nas entrelinhas

Este artigo tem mais de 5 anos

Portugal é livre da "prepotência" do "pensamento único": elogio a Costa e crítica a Passos? O Presidente falou pouco. Mas isso não significa um discurso vazio. Veja aqui o que ele disse e quis dizer.

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JOSÉ COELHO/LUSA

JOSÉ COELHO/LUSA

O Presidente da República falou pouco. Apenas cinco minutos. Foi tão breve e económico nas palavras que o discurso pode ter parecido inócuo. Não foi assim tanto. Há palavras escolhidas com cuidado e um simbolismo intencional em algumas expressões. Nos feriados comemorativos, como o 25 de Abril, o 5 de Outubro ou o 10 de Junho, Marcelo Rebelo de Sousa prefere fazer intervenções relativamente curtas e sem muitos recados políticos ou críticas ao Governo. Mas isso não quer dizer que sejam textos anódinos e vazios de significado: o Presidente disse que Portugal era livre da “prepotência” do “pensamento único”. É um elogio à “geringonça” e uma crítica a Passos Coelho?

Reproduzimos aqui em baixo o discurso do Presidente e a amarelo pode ler a nossa interpretação do que Marcelo disse.

Portugueses, militares de Portugal , antigos combatentes, 10 de junho dia de Portugal, de um Portugal que sabemos ser passado, mas que queremos futuro, independente e livre.

Pode parecer um detalhe sem importância, mas não é. Estas cerimónias estão carregadas de simbolismo e as originalidades protocolares de Marcelo também são simbólicas. Ao contrário do que manda o protocolo e o cerimonial, o Presidente não começou por se dirigir a todas as entidades oficiais presentes. Dirigiu-se apenas aos "portugueses" sem referir os titulares dos órgãos de soberania presentes, mencionou os "militares" em geral sem designar as altas patentes, num registo que colocou todos em pé de igualdade. Mais importante do que isso, foi a referência específica e particularizada aos antigos combatentes (da Guerra Colonial) -- que estão sempre presentes nestas comemorações com as boinas dos seus regimentos -- cujas celebrações do 10 de Junho chegaram em alguns anos a estar envolvidas em polémica. Foi uma forma simples e subtil de os sublinhar e homenagear, sem precisar de mais palavras de circunstância.

Independente do atraso, da ignorância, da pobreza, da injustiça, da dívida, da sujeição. Livre da prepotência, da demagogia, do pensamento único, da xenofobia e do racismo.

É a passagem mais importante do discurso do ponto de vista político. Curta, mas cheia de significado. Quanto mais condicionado pela dívida, mais subjugado a outros, aos credores e aos mercados, fica o país. É a forma mais subtil de recado ao Governo. A redução da dívida é condição de independência: lembra-se de Paulo Portas chamar “protectorado” ao tempo em que a troika esteve em Portugal? Também é evidente que quando mais rica e educada for a população, maior é o seu grau de liberdade. A seguir, em poucas palavras, regressou ao seu discurso do 25 de abril, para falar da xenofobia, do racismo e da demagogia, que assolam parte da Europa, de cujas tendências Marcelo quer distância. Quando diz que Portugal é independente e livre da "prepotência" do “pensamento único” está a referir-se a quê? Ao alegado sucesso da geringonça contra a ortodoxia financeira de Bruxelas? Será um elogio ao Governo que comporta em si uma crítica à oposição? É o que parece.

Dia das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, desse outro Portugal que nos faz universais, andarilhos que somos por vocação e desígnio, comunidades que queremos mais presentes nas nossas leis, na nossas decisões coletivas, na nossa economia, mas sobretudo na nossa alma. E que acompanhamos de muito perto com uma palavra de incondicional solidariedade em especial para as que mais sofrem ou desesperam.

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Marcelo Rebelo de Sousa tem uma especial sensibilidade em relação aos emigrantes. Foi só quando ele negociou a revisão constitucional com António Guterres que os portugueses no estrangeiro passaram a poder votar no Presidente da República. Em todas as gerações da sua família teve emigrantes: avós, pais, irmãos, filhos, netos. Quando diz que quer os emigrantes mais presentes nas leis, estará a referir-se aos diplomas que estão na Assembleia da República para os emigrantes votarem por antecipação nas eleições, por exemplo, ou sobre a possibilidade de poderem recorrer ao voto eletrónico. Quando menciona a "solidariedade" para com as comunidades, está a dirigir-se em concreto às centenas de milhar de portugueses e lusodescendentes que estão com dificuldades a viver os dias complicados na Venezuela, com o endurecimento do regime de Maduro.

Tal como nos abrimos aqueles e qualquer que nos chegam de tantas paragens sonhando ficar connosco a vida que lhes é negada nas suas terra natais.

Forma de se referir, de modo equivalente, aos imigrantes estrangeiros que vivem em Portugal, mas também aos refugiados. Ou seja, se gostamos que os nossos sejam bem tratados lá fora, convém que tratemos bem os de fora que estão cá dentro.

Dia das Forças Armadas, dos portugueses em armas que nos deram vezes sem conta a independência e a liberdade e as constroem com determinação cá dentro e lá fora, com a serena consciência do dever cumprido. Dia de Portugal, Dia de Camões e das Comunidades Portuguesas, dia das Forças Armadas. Dia simbólico do que é a nossa missão de todos os dias: respeitar quem nos dá a independência e a liberdade de sermos como somos, criar riqueza, combater a pobreza, superar injustiças promover conhecimentos, abraçar uma pátria sem fronteiras espirituais que nasceu para ser encuménica e fraternal.

É um eco de outros discursos sobre as Forças Armadas. São o povo em armas — mesmo com o fim do Serviço Militar Obrigatório — ou seja, representam todos os portugueses. Como Comandante Supremo, refere-se aos militares não como um corpo especial da nação, não como uma corporação fechada na sua cultura, nos seus códigos e unidades, mas como povo em armas que garante a independência e a liberdade de todos. Marcelo está bem informado sobre o que se passa nas Forças Armadas. Pode ser uma forma de apelar à compreensão para algumas reivindicações mais corporativas e uma sensibilização para os militares não se pensarem como estando à parte da restante população (também nos sacrifícios e nas restrições). Por outro lado, pede respeito pelos militares porque nos deram a liberdade e a independência, que permitiram o desenvolvimento do país. Também tenta colocar esta perspetiva numa visão aberta, universalista e ecuménica para não se confundir com visões nacionalistas (como aliás fez no 25 de abril).

São muitos os caminhos que confluem nesse desígnio, mas é bem mais o que nos aproxima do que aquilo que nos afasta. Hoje, nesta manhã gloriosa no Porto, nesta leal nobre e livre independente cidade, que nunca traiu, nunca temeu, nunca validou, como dentro de horas em terras de Vera Cruz unidos nos encontramos todos, para além do que nos possa apartar, reafirmando que acreditamos em Portugal, acreditamos nos portugueses. O passado , mesmo quando menos feliz foi a nossa garantia. O presente é a nossa exigência. O futuro é o nosso destino.

Num discurso tão breve, tinha de fazer uma referência às qualidades da cidade do Porto, onde se realizaram as cerimónias, e ainda lançar a ida ao Brasil, onde passará os próximos dias (apesar da referência um tanto colonialista a terras de Vera Cruz). Num dia em que tradicionalmente se exalta o passado — e Marcelo conheceu bem a retórica dos 10 de junho no Estado Novo, que celebrava o Dia da Raça — também reconheceu que por vezes esse passado não foi fantástico. Mas que apesar disso, Portugal continua a ser uma comunidade. E que a “exigência”, seja ou não uma palavra de circunstância, é para vigorar no presente.
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