As primeiras palavras duras foram logo as iniciais. No comentário habitual de domingo à noite na SIC, Luís Marques Mendes disse que a linguagem utilizada pelo general Pina Monteiro nas declarações sobre o assalto a Tancos está “mais próxima de jogador de futebol do que de oficial general”.

O chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA) comparou o furto de material militar nos paióis de Tancos a “um soco no estômago”, mas garantiu que “os chefes militares levantaram logo a cabeça”. Marques Mendes não gostou das declarações porque “não prestigiam as instituições militares”.

Para o ex-líder do PSD, também ficou patente no discurso do general aquilo que ele considera serem as constantes contradições que têm envolvido este caso. “Durante muitos dias andou a dizer-se que este assalto a Tancos era grave, muito grave, com razão, e, de repente, vem tentar desvalorizar-se porque afinal o material roubado não custava mais de 34 mil euros e era sucata. Só faltou quase dizer que os assaltantes foram uns queridos que andaram de borla a limpar o armazém e o paiol de Tancos”, ironizou.

Marques Mendes considera haver uma “preocupação em desvalorizar o que aconteceu” e em “baixar a pressão sobre o governo”. Lembrando que o governo tem sofrido poucas críticas em relação ao assalto em Tancos, o ex-líder do PSD considera que “o papel da instituição militar não é ser simpática nem antipática com o governo, é ter a sua autonomia e preservar a sua independência”, deixando, ainda, um alerta: “nota-se alguma pressão, de forma mais direita ou menos direta, mais velada ou menos velada” do Estado “nas várias instituições, nas Forças Armadas e nos reguladores”.

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Segundo round. Constança Urbano de Sousa é uma ministra que, para Luís Marques Mendes, “não existe”. O último caso a colocar em cheque a atuação da ministra da Administração Interna, considera o advogado, é o caso da acusação do Ministério Público aos agentes da PSP de Alfragide, por alegados racismo, tortura, violência policial e falsas declarações. Marques Mendes estranhou não ter visto a ministra, a quem pede que diga “duas coisas muito simples”.

Em primeiro lugar, Marques Mendes é da opinião que Constança Urbano de Sousa devia ter pedido “justiça em relação àqueles que prevaricaram” e, depois, poder “separar o trigo do joio”. “A circunstância de alguns agentes prevaricarem e terem comportamentos muito maus não significa que a PSP no seu conjunto, milhares de agentes, sejam prevaricadores, bem pelo contrário”, disse Marques Mendes.

Com o incêndio de Pedrógão Grande e o assalto a Tancos ainda na memória, Marques Mendes conclui que “não há ministro, não há”, na Administração Interna. Urbano de Sousa está “muito fragilizada, muito diminuída politicamente e até, um dia, ser substituída, na prática é ausência como agora se viu”. O comentador enaltece ainda a ação do Ministério Público que iniciou “uma investigação relativamente inédita, corajosa, e, sobretudo, importante” para conhecer a verdade, “mesmo que ela seja cruel”.

Santos Silva sai “reforçado” da dança de secretários de Estado

Apesar de “não serem eles a definir a política”, Marques Mendes considera que a recente renovação nas secretarias de Estado merece um comentário. E um comentário dirigido a Augusto Santos Silva. De todos os nomes substituídos, Marques Mendes releva o de Margarida Marques, “que tinha na prática um estatuto de ministra, na pasta dos Assuntos Europeus”.

Para o ex-líder do PSD, Marques é “uma histórica do PS”, um “peso pesado no melhor sentido”, “íntima do primeiro-ministro” e “competente em matéria europeia”, o que o leva a a perguntar “porque é que saiu?”. E responde: “Estava incompatibilizada com a Comissão Europeia, ou com uma parte dela, e com a representação portuguesa lá, ou uma parte dela mas, sobretudo, respondia mais perante o primeiro-ministro do que perante o ministro dos Negócios Estrangeiros”.

Segundo Marques Mendes, Santos Silva sentir-se-ia “como que amputado de uma parte que eram os Assuntos Europeus”. Esta substituição, considerou, “reforça o peso e a autoridade” do ministro.

Oposição “não está a capitalizar”

Foram semanas horribilis, mas a “oposição não foi capaz de dificultar a vida ao governo”, considerou Marques Mendes, que retirou pouco do debate sobre o estado da Nação. “Debate pobrezinho, uma pobreza franciscana, só mais um debate quinzenal, repetitivo, previsível, mais do mesmo, só questões da atualidade e nada de futuro”, disse o comentador.

O governo acabou por passar “incólume” por esse teste, mas a culpa é mais da oposição, que não mostrou serviço. Quem soube fazer o que está no contrato, foi a coligação “que apoiou e protegeu”. PCP e Bloco de Esquerda foram “uma orquestra afinadíssima”, disse o comentador, e a coligação “está de pedra e cal até 2019”, disse Marques Mendes.

As águas ainda agora se começaram a agitar para a oposição que, lembra o comentador, tem as autárquicas à porta, “que não são eleições fáceis para o PSD” e, como a economia está a crescer, podendo até atingir os 3% do PIB, será mais difícil encontrar por onde pegar. Uma boa ponta seria “a redução da dívida pública”, que também não foi um tema muito explorado no debate. Marques Mendes considera que ninguém pressionou o governo nesta matéria que é “importante para ganharmos credibilidade internacional, para melhorar o nosso rating, e para atrair novos investidores”.

“Negócio da compra da TVI ainda vai dar muitas voltas”

A Compra da TVI pela Altice não é nada menos do que “uma revolução no domínio da comunicação social e no mercado de telecomunicações”, disse Marques Mendes. É um passo largo para “um grupo de comunicação social estrangeiro passar a ter um poder em Portugal como nunca antes aconteceu na área dos media e das telecomunicações”. O potencial negócio merece a Marques Mendes algumas reservas. Por exemplo, por causa dos riscos de posição dominante, no domínio da rádio e da televisão e do mercado publicitário. Mas como “a procissão” ainda vai no adro”, o comentador considera que a Autoridade da Concorrência irá aprovar o negócio “com restrições e com garantias para defender a concorrência e evitar situações de abuso de posição dominante”.

Para o remate, mais uma dura crítica, desta vez ao chefe de governo. António Costa esteve “muito mal” sobre a Altice, disse Marques Mendes, que considera que um primeiro-ministro não deve falar “sobre a vida e as atuações das empresas privadas”.

António Costa disse, no debate sobre o estado da Nação, que esperava que “a autoridade reguladora [para as telecomunicações]” olhasse “com atenção” para “o que aconteceu com as diferentes operadoras nestes incêndios de Pedrógão Grande” para logo depois acrescentar : “houve algumas que conseguiram sempre manter as comunicações e houve outra que esteve muito tempo sem conseguir comunicações nenhumas – e isso é muito grave”. Para Marques Mendes, António Costa estava a tentar “demarcar-se do negócio e agradar ao Bloco e ao PCP”, mas, para o ex-líder do PSD, apenas revelou “tiques socráticos e gestos terceiromundistas”.

Sobre a situação interna do PSD, o advogado afirmou vislumbrar dois novos nomes para a liderança do seu partido: Luís Montenegro, que deixa a liderança da bancada parlamentar após seis anos, e Carlos Moedas, comissário europeu, que pode regressar à política interna “fresquinho como uma alface”.