O município de Alcácer do Sal conseguiu, em tribunal arbitral, uma decisão “inédita” que condena a EDP Distribuição a devolver uma parte das receitas que resultam da cedência de apoios a outros operadores, a partir da rede de distribuição de eletricidade. A rede elétrica é uma concessão da autarquia à empresa do Grupo EDP, mas a concessionária tem vindo a explorar comercialmente a infraestrutura para outros serviços para além da distribuição de eletricidade, ficando com os proveitos. A EDP Distribuição argumenta que a cedência de rede aos operadores de telecomunicações é uma imposição legal.

Em comunicado, a Câmara de Alcácer do Sal destaca que é uma “decisão, inédita no panorama nacional, abala todo o sector e promove uma maior responsabilidade dos concedentes enquanto entidades a quem o património público é atribuído para gestão”. A autarquia acredita que outros municípios vão avançar com ações similares, depois de tomarem conhecimento desta decisão. O presidente da câmara, Vítor Proença, sublinha o “ato de coragem” da autarquia que “enfrentou um gigante”, o grupo EDP.

O valor a pagar pela EDP à Câmara de Alcácer não será muito significativo, mas a deliberação do tribunal arbitral pode ter um efeito em cadeia a outros municípios que concessionaram à elétrica a distribuição da eletricidade em baixa tensão. A maioria dos municípios concessionou a rede de distribuição de eletricidade à EDP, mas muitos destes contratos vão terminar entre 2021 e 2022 e as autarquias deverão lançar um concurso público para escolher o novo concessionário. Em troca destas concessões, as câmaras recebem rendas, cerca de 250 milhões de euros por ano, que são suportadas pelas tarifas de eletricidade pagas por todos os consumidores.

Para a Câmara de Alcácer do Sal, a EDP Distribuição “estava a usufruir de uma receita indevida pela disponibilização dos apoios a diversos operadores de telecomunicações”, o que estava a acontecer, pelo menos desde 2008, refere em comunicado. E avançou com uma ação judicial contra a empresa, a reclamar o pagamento de uma indemnização. O caso foi parar a um tribunal arbitral, presidido pelo jurista Eduardo Paz Ferreira, que condenou a EDP Distribuição a pagar 50% da receita que recebeu entre 2008 e 2017, para além de ter direito a auferir os proveitos futuros, descontados dos custos.

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Em esclarecimento ao Observador, o gabinete de comunicação da autarquia informa que está em causa o pagamento de uma verba de cerca de 40 mil euros, acrescida de juros de mora deste a data da notificação até ao pagamento. A mesma fonte acrescenta que em causa neste processo estava a “permissão de utilização de infraestruturas do Município de Alcácer do Sal que estão afetas a uma concessão, colhendo a EDP benefícios financeiros que cobrava a várias operadoras de telecomunicações.”

Para a autarquia, esta decisão não é passível de recurso.

A EDP Distribuição adianta ao Observador que a disponibilização dos postes da rede de baixa tensão aos operadores de comunicações eletrónicas, em complemento com as redes próprias “é imposta por lei”. A empresa “entende que a remuneração recebida por aquela disponibilização não deve ser repartida com os Municípios, dado que os custos com a construção e conservação dos apoios, bem como o acréscimo de custos decorrentes duma utilização diferente da distribuição de eletricidade, são considerados nas tarifas de acesso às redes, no âmbito da regulação económica a que a EDP Distribuição está sujeita”. Se os custos são considerados, as “receitas dessa utilização devem igualmente ser consideradas naquele âmbito tarifário, regulado pela ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos).