Estávamos na temporada de 1994/95, 14.ª jornada. O Benfica, campeão em título, tinha sofrido alguns deslizes no início do Campeonato e ia receber na Luz um dos Boavistas mais fortes da década de 90 com a obrigação de ganhar. O conjunto comandado por Manuel José ainda atuava naquele esquema com um líbero (Rui Bento), defesa a cinco com laterais ofensivos, homens rápidos na frente e com boa meia-distância como Sanchéz, Timofte ou Artur. Logo no primeiro minuto, primeiro golo. Um golo que deixou o treinador axadrezado fora de si. “Como é possível sofrermos com um jogador 30 centímetros mais baixo a saltar mais alto do que o Nogueira?”, atirou. Foi inusitado mas aconteceu. E o ‘baixinho’ era o brasileiro Edílson.

Depois de passagens por Industrial e Tanabi, Edílson, mais conhecido como o Capetinha, começou a destacar-se no Guarani e não demorou a chegar ao Palmeiras, onde ganhou Campeonato Paulista e Brasileiro. Pelo meio, beneficiando do patrocinado em comum que os dois conjuntos tinham (Parmalat), o pequeno avançado fez uma época nos encarnados após o título de 1994 e marcou 17 golos em 31 jogos num ataque que tinha ainda nomes como Caniggia, João Pinto, Clóvis ou Stanic (além de Vítor Paneira ou Isaías). Num dos encontros mais marcantes, apontou quatro golos na goleada do Benfica ao Marinhense por 12-0. Voltou ao Palmeiras antes de arriscar a segunda aventura no estrangeiro, no Japão (Kashima Reysol).

Passaria ainda por grandes nomes do futebol brasileiro, como o Corinthians ou o Flamengo, antes de ir jogar para os Emiratos Árabes Unidos, onde alinhou no Al Ain. Voltou, esteve no Vitória, no São Caetano, no Vasco da Gama e no EC Bahia, dois anos depois de ter arrumado as chuteiras. No ano passado, assinou contrato com o modesto Taboão da Serra, da 4.ª Divisão, com o objetivo de marcar golos e dar espetáculo. Fez apenas um encontro oficial (também já tem 46 anos…), também porque tem mais funções no conjunto fora de campo.

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Foi uma carreira que deixou a marca, nos clubes ou na seleção. Além dos Campeonatos nacionais, paulistas e baianos, sagrou-se vencedor do Mundial de Clubes em 2000, com um jogo fabuloso frente ao Real Madrid onde marcou dois golos. Pelo Brasil, fez parte do elenco que se sagrou campeão mundial no Campeonato do Mundo de 2002, na Coreia do Sul, em que os comandados de Luiz Felipe Scolari derrotaram a Alemanha na final com um bis de Ronaldo Fenómeno. Chegou também a ser eleito melhor jogador no Brasil (1998) e do Mundial de Clubes (2000). Um craque, um artista da bola a sério.

No entanto, a vida não corre tão bem fora dos relvados a Edílson. Longe disso. O avançado que participou no Dança dos Famosos teve uma banda, um estúdio e uma empresa ligada à música, chamada ED10, mas os negócios deram para o torto e foi esta sexta-feira à noite libertado pela terceira vez da prisão.

Na terça-feira, quando estava a passear num centro comercial, Capetinha foi abordado pela polícia e levado para a esquadra, dando cumprimento a um mandado de prisão em Brasília por atraso no pagamento da pensão de alimentos, conseguindo apenas sair três dias depois do Complexo Penitenciário da Mata Escura, em Salvador, após chegar a acordo para a liquidação da dívida.

Foi já a terceira vez (segunda nos últimos dois meses, a primeira por dever 120 mil euros) que foi detido por este motivo, numa altura em que tem grande parte dos seus bens penhorados pelo Tribunal Regional do Trabalho, na sequência de dezenas de processos interpostos por antigos funcionários e credores do grupo ED10.

Antes, Edílson já tinha sido ligado uma rede acusada de fraude no pagamento de lotarias oficiais, mas o jogador reclamou sempre inocência no caso (“Só estou envolvido nisso porque um dia me ligaram para casa, mais nada”) e colocou-se à disposição do Procurador para prestar todos os esclarecimentos depois de ter visto discos rígidos e computadores serem levados de sua casa pela polícia. O avançado foi mesmo constituído arguido no processo que ainda decorre. Em resumo, a Operação Desventura desmontou um esquema onde alegadamente os intervenientes, depois da informação de funcionários da Caixa Económica Federal de que algumas lotarias estavam a esgotar o prazo para o levantamento do prémio, falsificavam esses mesmos bilhetes e iam recolher esses valores que seriam depois distribuídos pelos restantes envolvidos na operação.