Um ano após a destituição de Dilma Rousseff não se pode afirmar que a crise política brasileira tenha atingido o pico, quando a ex-Presidente foi afastada do cargo e que agora está sob controlo, avaliam especialistas consultados pela Lusa.

O impeachment (destituição) de Dilma Rousseff foi um dos pontos altos da crise, mas não podemos falar em auge já que percebemos que agora, no Governo de Michel Temer, a crise continua tão forte quanto era antes”, disse Carlos Melo, cientista político e professor do Insper.

O afastamento definitivo da ex-chefe de Estado, formalizado pelo Senado (câmara alta do Congresso) em 31 de agosto de 2016, depois de um longo processo em que Dilma acabou condenada pela prática de crimes fiscais, também colocou em cheque o sistema presidencialista, adotado com a nova Constituição do Brasil em 1988.

Desde as presidenciais de 1989 foram eleitos e reeleitos diretamente quatro chefes de Estado, mas apenas Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva terminaram os dois mandatos. Para o professor do Insper, trata-se de um sinal claro de que em pouco menos de 30 anos o sistema político entrou em colapso.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Há um divórcio entre o pensamento dos representantes políticos, dos partidos e o da sociedade. Vivemos uma intensa crise económica, ética, de representação e de liderança política que perdura desde 2013. O sistema político precisa de uma reforma”, disse.

Já Gustavo Cruz, economista da XP Investimentos, uma das maiores consultorias financeiras do Brasil, avaliou em declarações à Lusa que “um índice de 50% de Presidentes eleitos que terminaram o mandato mostra que as instituições ainda são muito fracas no país”.

Depois de escapar de uma acusação de corrupção em julho, o próprio Presidente Michel Temer expressou publicamente sua disposição em promover mudanças, adotando na prática uma versão do regime parlamentarista ou até mesmo um semipresidencialismo inspirado nos modelos da França e de Portugal. Apesar da crise manter-se em foco no Brasil, Gustavo Cruz destacou que a destituição de Dilma Rousseff trouxe mudanças positivas ao país no campo económico.

Entre janeiro e março de 2016, últimos meses da gestão de Dilma Rousseff, havia muita incerteza e divergências entre o que dizia o ministro das Finanças [Nelson Barbosa] e os outros membros do poder executivo sobre reformas e temas importantes para a economia. O mercado chegou a discutir a insolvência da dívida pública”, explicou.

“Assim que Michel Temer assumiu interinamente ele começou a tratar das reformas e o discurso ficou mais coeso. Já começamos a ver uma lenta recuperação e os agentes finalmente sabem o que esperar da política económica do Governo”, finalizou.