“Um repositório de moda, prazer e conhecimento” — foi assim que a Harper’s Bazar (no início, era esta a grafia) se apresentou na sua primeira edição, a 2 de novembro de 1867. O conceito era pioneiro na América e resultado do espírito curioso de Fletcher Harper, o mais novo dos três irmãos detentores da Harper & Brothers. A editora nova-iorquina tinha-se especializado nos livros, mas também já se tinha aventurado com títulos periódicos. Mas nada a ver com o tipo de publicação que Fletcher via na Europa. A inspiração mais direta veio do Der Bazar, um título alemão que, entre temas de lazer e lifestyle, incluía ainda artigos de moda ilustrados a rigor.

Fletcher soube aproveitar o momento, marcado pelo surgimento de uma nova classe para a qual tudo o que chegava das grandes capitais europeias era simplesmente imperdível. No seu projeto final, o empresário idealizou uma revista que fosse uma espécie de guia de como bem viver, dirigido a mulheres influentes. Convenceu os dois irmãos e criou a Harper’s Bazar.

Cena do filme A Janela Indiscreta, de Alfred Hitchcock, em que Grace Kelly aparece a ler a edição de outubro de 1953 da Harper’s Bazaar.

“Um vasto repositório para todas as coisas raras e luxuosas do mundo — sedas, veludos, caxemiras, especiarias, perfumes e gemas cintilantes; numa palavra, tudo o que conforta o coração e agrada aos olhos”, podia ler-se no editorial do primeiro número. Como editora estava Mary Louise Booth, escritora, jornalista, tradutora e voz ativa nos movimentos abolicionista e sufragista, causa que acabou por levar para as páginas da revista, na altura semanal. Apesar do tom, a Harper’s Bazar mostrou depressa que queria ir além de vestidos e sapatos. Podiam ler-se pequenas peças literárias, poemas e textos sobre a vida em sociedade. Charles Dickens, George Eliot e Henry James assinaram textos para a revista, que tinha a sua própria correspondente em Paris, Emmeline Raymond, fundadora da influente La Mode Illustrée.

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Das reflexões sobre o papel da mulher na política, os conteúdos da Harper’s Bazar passaram a contemplar outros cenários, como o lar, por exemplo. Em 1871, a revista chegou mesmo a publicar um artigo em que a dedicação das mulheres aos maridos, aos filhos e às tarefas domésticas era considerada uma “escravidão absoluta”. Ao mesmo tempo, chegavam de Paris os relatos das primeiras apresentações de haute couture, com descrições detalhadas do ambiente dentro dos ateliers mais concorridos da época.

Em 1901, a revista passou a ser mensal. Doze anos depois foi comprada pela Hearst por 10.000 dólares, empresa que continua a deter o título. Só em 1929 é que a grafia foi alterada para como a conhecemos hoje, ano em que a revista atravessa o Atlântico e ganha uma versão britânica. Depois de Mary Louise Booth, outros nomes fortes passaram pelo leme da Harper’s Bazaar, à medida que crescia o apetite da revista e das suas leitoras por moda. Carmel Snow, Diana Vreeland e, já nos anos 70, Anthony Mazzola levaram, à vez, diferentes vagas para dentro da revista, da sensibilidade aos movimentos artísticos emergentes, passando pela plena libertação feminina.

Artisticamente, a revista também fez história. Durante mais de duas décadas (1915-36), as ilustrações de Erté puseram a Arte Nova na primeira página. Richard Avedon acompanhou a era dourada de Hollywood e foi o autor da famosa capa de 1956, protagonizada por Audrey Hepburn. A fotografia misturada com elementos gráficos ganhou força pela mão do designer Alexey Brodovitch. Com o final do século XX e o início do XXI a deixarem à vista grandes nomes como Peter Lindbergh, Patrick Demarchelier, Mark Seliger e Terry Richardson.

Como todas as revistas de moda, a Harper’s Bazaar tem as suas musas. Kate Moss (que teve na Bazaar a sua primeira capa numa revista americana), Sarah Jessica Parker e Kate Hudson são alguns dos nomes mais frequentes na história recente da revista. Em abril deste ano e para assinalar os 150 anos, dezenas de capas foram recuperadas e projetadas na fachada do Empire State Building, em Nova Iorque.

Na fotogaleria, reunimos 60 capas organizadas por ordem cronológica. Do primeiro número às edições comemorativas que chegaram às bancas já este ano, a viagem da Harper’s Bazaar atravessa modas, movimentos e a morte e nascimento de muitas estrelas. Afinal, começou há 150 anos.