Charles Bradley, músico norte-americano conhecido pelas canções soul, morreu este sábado com 68 anos vítima de um cancro que alastrou do estômago ao fígado, mas é sólido o legado que deixa nas páginas da música.

O sucesso chegou tarde mas chegou, como queremos sempre que aconteça aos melhores. Em 2002 Bradley assinou com a editora Daptone e lançou uma série de canções de entre as quais se destaca “Take It As It Comes”. O seu álbum de estreia chega em 2011: “No Time For Dreaming”. Ele sabia do que falava. Sonhos? Quais sonhos? Durante muito tempo viveu no pior bairro de Brooklyn, com buracos de balas nas paredes, mas isso já foi depois de não ter sítio algum para dormir e muito pouco para comer. Na pobreza, Bradley sustentou-se até aos 50 anos apenas com pequenos trabalhos de “faz-tudo” pelo seu bairro.

Durante esse tempo nunca largou o sonho e ia cantando em bandas de covers e de tributo aos grandes do jazz e da soul, como ele acabaria por se tornar. Fazia de conta que era Otis Redding, fazia de conta que era James Brown e em breve alguém irá querer ser Charles Bradley. O sucessor do seu álbum de estreia”Victim of Love”, foi lançado em 2013 e é nele que se escondem algumas das mais doridas músicas de Bradley.

As que nos ficam na memória são aquelas onde o seu grito primitivo e catárquico nos faz pensar que não está tudo bem mas que se procurarmos bem na selvajaria do nosso interior até podemos encontrar uma força qualquer que nos salve. É cru como a vida dele foi mas ao menos ele fez disso arte.

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Numa entrevista com a revista de música online Pitchfork, Bradley sublinhou a importância de fazer música honesta. “Eu canto a verdade, ponho coração e alma dentro das canções. Se queres cantar, canta a partir do coração e o mundo irá ouvir-te”, disse na altura.

Em março de 2016, Bradley lançou “Changes”, considerado por muitos críticos como o seu melhor álbum, aquele em que mais se nota o poder que foi adquirindo sobre a sua voz, mesmo — ou principalmente — quando não a usa para gritar das profundezas. Músicas como “Things We Do For Love” é um bom exemplo de como pode ser reconfortante, desde que haja bastante doo-wop, ouvir falar de desamor.