Sporting e Barcelona sempre foram conhecidos pela capacidade de formarem jovens talentos mas, entre a década de 90 e o início do século, tiveram relações privilegiadas que levaram a três grandes negócios que todos se lembram de cabeça. E todos da mesma posição, todos internacionais, todos com uma história: Figo, Simão e Quaresma.

Luís Figo chegou à Catalunha em 1995 num processo complicado, meses depois de ter assinado ao mesmo tempo pela Juventus e pelo Parma (assim se fecharam as portas da Serie A nessa altura) e quando havia ainda uma ténue esperança dos leões em que renovasse contrato. Não ficou e o clube recebeu o equivalente a dois milhões de euros porque, na altura, mesmo os jogadores em fim de contrato tinham de ressarcir a anterior equipa.

Seguiu-se Simão, visto como o novo Figo por alguns, que foi para o Barça em 1999 a troco de 15 milhões de euros naquela que foi a primeira grande transferência da recente SAD verde e branca. E Quaresma, em 2003, por seis milhões mais a cedência de Rochemback numa altura em que Fernando Santos pensava que ficaria com… Ronaldo.

Ainda assim, estes não foram os únicos extremos internacionais a trocarem os leões pelos catalães. Emmanuel Amunike, ainda se lembra? Aquele ala nigeriano canhoto que esteve no Mundial de 1994 e marcou o golo decisivo para se sagrar campeão olímpico em 1996? Entre Figo e Simão, o africano foi vendido ao Barcelona por três milhões.

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As coisas não correram bem porque, passado um ano, sofreu uma gravíssima lesão no joelho que o condenou a longos tempos de afastamentos dos relvados. Ganhou dois Campeonatos, duas Taças de Espanha e uma Taça das Taças ao lado de grandes estrelas. Ainda esteve no Albacete, passou pela Coreia do Sul (Busan l’Cons) e acabou a carreira na Jordânia (Al-Wahdat), antes de ser olheiro do Manchester United e passar a treinador com sucesso sobretudo na seleção Sub-17 da Nigéria, onde se sagrou campeão mundial. Mas o que ninguém esquece ainda foi a forma como se deu a sua contratação quando veio para a Europa, já com a época de 1994/95 a decorrer.

O interesse no jogador já existia, mas tudo teve de ser feito numa verdadeira operação relâmpago que encontrou o primeiro obstáculo ainda em Lisboa: quando veio a luz verde do Zamalek para negociar o jogador, o Sporting apressou-se a rumar para o Egito, onde Amunike jogava, mas a embaixada estava prestes a fechar e, sem vistos, nada feito. Após longas diligências, o problema foi superado e a delegação leonina liderada pelo presidente da altura, Sousa Cintra, pôs-se em marcha para o Cairo ainda com uma escala.

Quando chegaram a solo egípcio, tinham à espera no hotel Abdel Ghany, antigo jogador que passou por Portugal, ao serviço do Beira-Mar (e que foi entrevistado há duas semanas pelo Observador), e que iria servir de intermediário nas negociações com os dirigentes do Zamalek. Que eram muitos, quase 20. E que colocaram os responsáveis verde e brancos numa situação pitoresca: como metade da direção tinha acertado a transferência com o Sporting e a outra metade tinha sido aliciada pelos alemães do Duisburgo, que também queria o extremo, gerou-se uma discussão tal que meteu ameaças com facas logo ali na mesa de negociações. Sousa Cintra teve sangue frio e, enquanto andava ali tudo a discutir, assinou contrato com o presidente e conseguiu sair de fininho da sala.

Amunike destacou-se no Mundial de 1994 nos Estados Unidos e foi campeão olímpicos dois anos depois, em Atlanta

Como os jornais desportivos já tinham entretanto chegado ao Cairo, lá vieram as habituais fotografias do jogador com a camisola dos leões. Mas a aventura não tinha terminado: como o dono da casa onde o nigeriano vivia se queixava de meses de atraso na renda que devia ser tratada pelo Zamalek, não deixavam Amunike sair. Mais uma confusão, mais conversas, mais uma questão solucionada. Que não seria a última.

Chegados ao aeroporto, o Duisburgo ainda tinha preparada uma última investida para segurar o jogador. Neste caso, literalmente: na zona de embarques, e sem que ninguém pudesse imaginar tamanha situação, a delegação do clube germânico começou a agarrar o nigeriano por um braço enquanto os dirigentes leoninos puxavam pelo outro. Foi mais uma confusão, que chamou a atenção de todos os que estavam no local. Até que Amunike se soltou mesmo e rumou à zona de embarques, aterrando em Lisboa como uma estrela… que mais não fosse pela forma como chegou ao Sporting. Só se estrearia umas semanas depois, após o indeferimento de uma queixa do Duisburgo, e acabaria por contribuir para a conquista da Taça dessa época. Mas é a novela da contratação que ainda hoje se recorda.